Testes genéticos não têm indicação para todos os casos de autismo

Atualmente, os conhecimentos científicos sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA) permitem afirmar que a origem do TEA tem forte ligação com a genética. Mas, é preciso lembrar que o autismo é um transtorno multifatorial, ou seja, seu desenvolvimento depende de diversos fatores, incluindo a genética.

Segundo a Profa. Dra. Maria Rita Passos Bueno, Coordenadora do Progene-USPserviço do Centro de Estudos do Genoma Humano e Células Tronco (IB-USP), voltado ao diagnóstico clínico e genético do autismo, existem hoje pelo menos 800 genes candidatos e 100 confirmados para o autismo.

“As mutações genéticas podem vir de um ou dos dois pais, ainda que sejam saudáveis ou que apresentem apenas sinais muito discretos de TEA. Em outros casos, surgem na formação do óvulo ou do espermatozoide e, portanto, estão apenas na criança e não nos seus pais. São mutações novas, chamadas de mutações “de novo”, e estas em geral têm maior chance de serem a causa do autismo”.

A professora explica que além da mutação poder ser nova ou herdada, ela pode estar relacionada a um padrão de herança monogênica (quando afeta apenas um gene), ou oligogênica (afeta mais de um gene).

“Na prática, isso quer dizer que os testes genéticos não têm indicação para todos os casos de autismo e nem sempre darão respostas definitivas para a família. Mas, os testes genéticos podem ser úteis para a confirmação do diagnóstico clínico, para identificar possíveis síndromes que podem ter impacto na saúde da criança, além do comportamento autista”, diz Dra. Maria Rita.

Os testes genéticos também servem para identificar outros membros da família que possam estar em risco de ter filhos com TEA, assim como oferecer o aconselhamento genético para que os casais possam embasar suas decisões a respeito do planejamento familiar.

Quando fazer um exame genético?
Para os meninos com TEA e com atraso no desenvolvimento, de acordo com a recomendação internacional, é preciso fazer o teste para diagnóstico da síndrome do X-frágil. Outro exame feito no Brasil é a análise cromossômica para o autismo.

“Olhamos as células no microscópio para visualizamos alterações nos cromossomos. Porém, a maioria das alterações não são visíveis microscopicamente e precisam de exames moleculares que tenham maior acurácia para encontrar as mutações genéticas causativas do autismo, como o teste ARRAY-CGH, que consegue enxergar alterações bem menores do que a análise citogenética”, explica a professora.

O ARRAY-CGH é realizado no Centro de Estudos do Genoma Humano e Células Tronco, onde também funciona o Progene. “O ARRAY-CGH é oprimeiro teste utilizado na prática clínica de rotina para autismo, bem como para atrasos no desenvolvimento. É um teste molecular capaz de detectar alterações cromossômicas microscópicas e submicroscópicas, ou seja, que não são visíveis em exames citogenéticos convencionais como o cariótipo (análise citogenética)”, explica Dra. Maria Rita.

Segundo a especialista, o ARRAY-CGH é capaz de detectar alterações genéticas em cerca de 10% dos pacientes avaliados. Em geral, este teste é indicado quando o exame para síndrome do X-Frágil for negativo.

Sequenciamento do DNA
Existem ainda os exames de sequenciamento de DNA, o exoma e genoma. “O exoma é a parte do DNA que abriga os genes, ou seja, que contém as informações para produzir as proteínas do organismo e representa apenas 2% de todo o material genético de uma pessoa. O sequenciamento completo do exoma (SCE) é recomendado em casos bem específicos.

A cada 100 pessoas com TEA que fazem o SCE, só é possível identificar alterações em 20. Normalmente, 15% serão de autismo associado a outras síndromes genéticas (autismo sindrômico) e 5% de autismo sem associação a síndromes genéticas conhecidas (autismo não sindrômico).

“É um teste complexo, de alto custo e que na maioria das vezes não leva a nenhuma conclusão se não for bem indicado. Além disso, se o ARRAY-CGH for positivo, pode não haver a necessidade de fazer o exoma para fins de diagnóstico”, comenta Dra. Maria Rita.

Por fim, existe o sequenciamento completo do genoma. “Entretanto, para os casos de TEA, esse teste não é recomendado atualmente. Ainda conhecemos pouco sobre o impacto das mutações nas regiões não codificantes sobre o autismo. Por isso, na maior parte das vezes, o sequenciamento completo do genoma não traz um resultado mais informativo do que o sequenciamento completo do exoma”, explica Dra. Maria Rita.

Hoje, o sequenciamento completo do genoma é voltado quase que exclusivamente para a pesquisa, com pouca utilidade ou nenhuma utilidade no dia a dia da prática clínica. Além disso, o custo é inviável para a maioria da população brasileira, cerca de três vezes o valor do exoma.

(leda@agenciahealth.com.br)