O custo da greve também é o custo da ética

*Por Felipe Bezerra da Silva

O único ponto convergente sobre a greve dos caminhoneiros parece ser o de que a sociedade como um todo, já abatida, pagará a conta. Mas isso não é uma novidade. Ela vem sendo paga desde o descobrimento, fruto de uma política eminentemente exploratória e uma cultura de privilégios (ou privilegiados, como queiram).

A utópica Constituição de 1988, a chamada “Constituição Cidadã”, que mescla pitadas de socialismo e liberalismo, nasceu fadada ao fracasso, destinada a amparar discursos mentirosos e populistas de nossos governantes. O povo jamais teve acesso ao sem número de direitos e garantias, fundamentais ou não, por ela elencados.

A sociedade brasileira, acostumada a depender do Estado para tudo quanto almeja, pouco dele obtém. Apesar de uma carga tributária assombrosa, o cidadão pagar por educação, saúde, segurança, transporte, pela sua dignidade.

Ao invés de lutar por um projeto de nação, o povo se divide entre partidos, esquerda e direita, pobres e ricos, recheados de radicalismo e intolerância. O interesse em privilégios e regalias é uma praga nacional. Governantes e cidadãos egoístas, buscam salvar o que é seu, enquanto o próximo perde ou morre. O erro não é só de quem cria as regras, mas também de quem as perpetua, de quem as aceita. O problema da sociedade brasileira, em grande parte, tem a ver com seus princípios.

Confunde-se ética com moral e, por isso, é imprescindível bem conceituar esses termos, intimamente relacionados mas distintos. Ética vem do grego ethos, que significa morada, lugar certo. É a parte da filosofia que se preocupa com a reflexão sobre noções e princípios que fundamentam a vida moral. Moral vem do latim mos, moris, que significa o modo de proceder regulado pelo uso ou costume. Moral é o conjunto de normas livres e conscientemente adotadas que visam a organizar as relações das pessoas na sociedade, tendo em vista o certo e o errado.

Pode-se dizer que Ética é a teoria e Moral é a prática. A ética se relaciona com os princípios mais abrangentes e universais, enquanto a moral se refere à conduta humana. A primeira aparece como um horizonte que inspira, atrai e define o ser humano, e a segunda como o caminho que nos possibilita agir com ética.

Os princípios éticos definem o comportamento humano. Mais abrangentes que as leis, os regulamentos e mesmo os costumes, eles valem para toda a sociedade e devem ser respeitados por todos. A noção de certo e errado é transmitida por meio das gerações e se transforma em padrão ético.

Desta forma, independentemente da origem dos “direitos”, “garantias”, “privilégios”, “regalias” ou interesses individuais, se têm ou não base legal, todos sabem o que é ou não é ético. Todos sabem distinguir o certo do errado. Todos têm a opção de agir ou não de forma ética. Eis a raiz do problema do Brasil e do brasileiro.

É ético (ou correto) receber pensão vitalícia até a segunda geração? Receber auxílio moradia sem dele necessitar? Enriquecer praticando crimes contra toda a sociedade? Defender interesses individuais que afrontam e destoam dos interesses coletivos?

O comportamento ético individual tem o poder de mudar o meio em que vivemos. Por mais corrompido e difícil que seja o ambiente externo, cada um possui a capacidade da alterá-lo por meio de sua postura.

Com base na teoria do desenvolvimento moral de Piaget, Lawrence Kohlberg estabeleceu três níveis de desenvolvimento moral, incluindo a moral pré-convencional, a moral convencional e moral pós-convencional. O povo brasileiro, em sua grande maioria, demonstra estar no nível pré-moral, orientando-se pela obediência e punição ou ainda por sentimentos egoístas. Há um longo caminho para atingirmos o nível pós-convencional em que todos nos orientemos por princípios universalizantes (princípios éticos) e impere na sociedade a busca pelo bem comum, pelo que é certo, independentemente do que diga a Constituição, e do que se ganhe com isso ou aquilo.

A pergunta do futuro para o brasileiro é: qual nosso projeto de nação, ele é coerente com a realidade da sociedade e se reverte em benefício de todos?

A conta que está chegando, decorrente da paralisação dos “caminhoneiros” – em muitos pontos defensável não só para a categoria, mas para todos os brasileiros –, é também  resultado da incapacidade de muitos em reconhecer a revolução ética que a sociedade brasileira necessita.

*Felipe Bezerra da Silva é sócio da Eticca Compliance e advogado especialista em direito empresarial e Compliance

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