LGBTfobia: Decisões da Justiça do Trabalho tentam combater a discriminação no ambiente profissional

O Relatório de Violência LGBTfóbica no Brasil, elaborado a partir de denúncias feitas à Ouvidoria do Ministério dos Direitos Humanos pelo Disque 100,  apontou que 5,4% das vítimas que se identificaram como gays sofreram a violência no local de trabalho. Entre lésbicas, este índice foi de 4,7% e entre transexuais de 2,9%. O relatório, publicado este ano, foi preparado com base em queixas registradas em 2016.

O mesmo relatório demonstrou que as agressões contra a população de lésbicas, gays, bissexuais e transexuais (LGBT) se apresentaram, em sua maioria, na forma de violência psicológica ou de tratamento discriminatório.

A expressão LGBTfobia pode ser usada para descrever sentimentos como desconforto, receio, ira ou desprezo em relação a pessoas de orientação sexual diferente da heterossexual ou que não se  identificam com a dialética binária de gênero (homem/mulher). Estes sentimentos podem se traduzir em comportamentos preconceituosos, discriminatórios e violentos.

A Justiça do Trabalho do Paraná tem proferido decisões que tentam coibir a LGBTfobia no ambiente profissional. Além de estabelecer condenações envolvendo o pagamento de indenizações, elas podem prever obrigações de fazer, requerendo das empresas ações de caráter pedagógico.

Recentemente, uma sentença proferida pela juíza Ziula Cristina da Silveira Sbroglio, titular da 4ª Vara do Trabalho de Londrina, determinou que uma empresa administradora de salas de cinema confeccionasse e distribuísse entre seus clientes 2 mil folhetos com mensagens relacionadas à diversidade sexual.

A obrigação de fazer foi uma das condenações estabelecidas em ação trabalhista, na qual uma mulher transgênero pedia reparação por ter sido discriminada em diversas situações no período em que trabalhou na empresa. De acordo com os depoimentos colhidos pela magistrada, a funcionária era impedida de usar o nome social e o banheiro feminino, além de ser obrigada a usar roupas masculinas durante o trabalho.

Para a magistrada, ao apresentar sua pretensão em juízo, a vítima espera que o ilícito não mais seja cometido e, por isso, é importante que a sentença observe tanto as condutas lesivas passadas, quanto aquelas que possam vir a ocorrer.

“A obrigação de fazer trouxe a completude no âmbito da condenação, atendendo aos anseios da vítima e fomentando alteração de condutas que desafiam o adequado desenvolvimento laboral”, declarou a juíza, salientando que a empregadora deve respeitar os direitos conferidos aos trabalhadores pelo ordenamento jurídico. “Se assim não o faz, deve a ofensora ser alvo de medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias para concretização de tais deveres”, complementou, entendendo que os aspectos educativos e sancionadores da obrigação de fazer influenciam na mudança de conduta da empresa, por atingirem tanto seus recursos pessoais quanto patrimoniais.

Um outro caso de discriminação, desta vez relacionada à orientação sexual da trabalhadora, foi julgado pela 2ª Turma do TRT do Paraná.  A decisão considerou uma operadora de telefonia culpada por discriminar uma funcionária homossexual e condenou a empregadora ao pagamento de indenização no valor de R$ 10 mil. Durante o período em que trabalhou na empresa, a empregada foi alvo de comentários de cunho sexual e era tratada por termos pejorativos como “sapatão” e “mulher-macho”. O superior da trabalhadora também criticava o desempenho profissional da empregada, relacionando os resultados apresentados à orientação sexual da funcionária. Ao condenar a empresa, os desembargadores aumentaram o valor da indenização fixado anteriormente pela sentença de primeiro grau, considerando a importância do efeito pedagógico-preventivo da medida.

A desembargadora vice-presidente do TRT do Paraná, Nair Maria Lunardelli Ramos, ressaltou que a livre orientação sexual é direito fundamental, com base na dignidade da pessoa humana, protegido pelo inciso III do artigo 1º da Constituição Federal, e que a Justiça trabalha constantemente para reprimir condutas discriminatórias.

A magistrada observou que, apesar de delitos relacionados à liberdade sexual não deixarem vestígios na maioria dos casos, dificultando a comprovação dos ilícitos, no Direito Penal a palavra da vítima tem valor diferenciado.

“Na Justiça Trabalhista, além do depoimento do empregado, são colhidas informações de testemunhas e analisados diversos elementos dos autos. Comprovada a ocorrência de discriminação ou de atos humilhatórios em razão da orientação sexual, o empregador poderá ser responsabilizado”, explicou a magistrada.

A desembargadora esclareceu também que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) assegura que empresas com mais de duzentos empregados elejam uma comissão que trabalhe para impedir qualquer forma de discriminação por motivo de sexo, idade, religião, opinião política ou atuação sindical (artigo 510-B, inciso V).

“É dever do empregador garantir um meio ambiente saudável no trabalho, prevenindo ou coibindo qualquer tipo de humilhação. A inércia frente a situações de discriminação configura omissão culposa, ensejando a responsabilidade objetiva pelo ato ilícito, como prevê os artigos 186 e 927 do Código Civil”, concluiu a vice-presidente do Regional paranaense.

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