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O Relógio do Apocalipse

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Dinis Gomes Traghetta*

 

Quanto tempo falta para o apocalipse? Esse questionamento é feito anualmente ou algumas vezes ao ano, desde a segunda metade da década de 40 e, originalmente, estava relacionada a uma hecatombe nuclear, cuja consequência seria a aniquilação completa da humanidade ou, na melhor das hipóteses, da forma como a conhecíamos antes da tragédia global. Desde o início do ano, o periódico não científico norte americano Bulletin of the Atomic Scientists, informou há quanto tempo a humanidade se encontra do fim: 2 minutos. A divulgação é feita por meio de um relógio analógico estampado na capa da publicação, o qual possui dois ponteiros: o da hora, sempre fixo na marca das 12 horas, significando meia-noite, e outro, o dos minutos, móvel e ameaçador, levando-se em conta que apenas 15 minutos o separam da sobreposição ao ponteiro das horas.

A revista Bulletin foi fundada em 1945 com o intuito de informar e conscientizar a sociedade para as consequências da era atômica que despontava naquele momento, pós-efeitos dos bombardeios nucleares sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, levada a cabo pelos Estados Unidos. Em outras palavras, o viés editorial original, bem como o conteúdo da revista, surgiu como contraponto ao uso da tecnologia nuclear para fins bélicos. Todo ano, o ponteiro dos minutos é alterado ou mantido na mesma posição, simulando o nível de vulnerabilidade do mundo às consequências de três adventos: uma guerra nuclear em nível mundial, as mudanças climáticas e o surgimento de tecnologias disruptivas, as quais, de alguma forma, substituam ou aperfeiçoem radicalmente as já existentes, afetando negativamente a sociedade. A alteração ou manutenção do ponteiro dos minutos é feita após consulta ao Conselho de Ciência e Segurança da Bulletin, bem como ao Conselho de Patrocinadores, o qual inclui quase duas dezenas de vencedores do Prêmio Nobel.

Ao longo dos últimos 71 anos, a revista Bulletin estampa em sua capa a iminência, em minutos, para o apocalipse, baseada na contribuição de cada um dos três adventos, ou de todos simultaneamente. Segundo o Relógio do Apocalipse, já estivemos muito perto de uma destruição total, provocada fundamentalmente, por uma guerra nuclear em nível mundial, como também houve períodos de relativa tranquilidade. Desde 1991, o avanço no sentido horário do ponteiro dos minutos tem sido vertiginoso: o gráfico despenca até atingir, como em 1953, 2 minutos para a meia-noite.

Apesar das novas tecnologias inspirarem receio, em nível mundial, de que algumas delas possam ser utilizadas para prejudicar o ser humano e de que as mudanças climáticas avançam para a consolidação de tragédias humanitárias, o Relógio é muito sensível à instabilidade gerada pelo estoque de armas nucleares presentes em países como Estados Unidos, Rússia, Inglaterra, França, China, Israel, Índia, Paquistão, e Coréia do Norte (em ordem cronológica de produção). Seis desses países causam preocupação real sobre um confronto no qual as armas nucleares possam ser utilizadas. São eles: EUA, Rússia, China, Índia, Paquistão e Coréia do Norte.

No contexto da ameaça nuclear, somos apenas a plateia, assistindo passivamente uma peça macabra na qual os atores nuclearmente armados, interpretados por chefes de Estado e ditadores, decidem sobre o futuro da humanidade, de acordo com seus caprichos e estratégias de poder – e parece que pouco ou nada podemos fazer para alterar o roteiro. Não é à toa que, desde 1991, o ponteiro dos minutos tenha saído dos 17 minutos para meia-noite e seguido em sentido horário na seguinte sequência: 14; 9; 7; 6; 5; 3; 2,5 e, agora, 2 minutos.

 

*Dinis Gomes Traghetta é doutor em Física e professor de Física do curso de Engenharia Civil da Universidade Positivo (UP). É autor do livro “A Bomba Atômica Revelada”, finalista do Prêmio Jabuti em 2014.

 

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