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Pesquisa é necessária?

Atribui-se ao chanceler alemão Otto von Bismarck a frase: “se as pessoas soubessem como são feitas de fato as guerras e as salsichas não dormiriam tranquilas”.

Nosso governo parece buscar constantemente fazer guerras com sua retórica agressiva e desligada da realidade; todos são inimigos: o meio ambiente, os índios, a imprensa, a “esquerda”, os pesquisadores, os professores, os intelectuais. Brigar contra tudo e todos é sempre mais simples do que governar um país que tem problemas concretos e sérios.

Mas alguns ministérios vão além e estabelecem as suas próprias salsicharias. Recentemente nos sobressaltamos com um decreto do ministério da Educação, em que se salientava uma “suspenção” descabida tanto em termos ortográficos quanto intencionais; o signatário declarou depois ter assinado sem ler o “cartapácio” de oito(!) páginas. Entende-se que não é atribuição de um ministro de Estado revisar textos, e supõe-se que tenha mais o que fazer com o seu tempo, mas é escandaloso que em um ministério que já contou em seus quadros até com Carlos Drummond de Andrade não haja um único assessor capaz de fazê-lo. O critério de competência para a função deve ter sido substituído pela habilidade de recitar sem engasgos o ideário olavista, seja lá o que isso for.

A mais recente proposta ministerial envolve abocanhar o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, atualmente no Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações – MCTIC, e trazê-lo para o MEC, para uni-lo à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES.

A CAPES, fundação vinculada ao MEC, atua na “expansão e consolidação da pós-graduação stricto sensu” em todo o país.  O CNPq é uma agência e “tem como principais atribuições fomentar a pesquisa científica e tecnológica e incentivar a formação de pesquisadores brasileiros”; seu foco é a “formulação e condução das políticas de ciência, tecnologia e inovação”.

A ideia de juntá-las parece ser uma contrafação da antiga estratégia do Império Romano – dividir para reinar – no caso, unir para enfraquecer. São duas instituições importantes, indispensáveis para o estudo e a pesquisa no país, e têm pertinências diferentes embora complementares. Sob o comando de uma única entidade poderiam perder muito de sua competência e criatividade, e talvez – esperamos que seja apenas talvez – seja exatamente isso o que se deseja. A pesquisa é fator de independência de uma nação, antes até de suas inegáveis contribuições nos campos da ciência e tecnologia; mas pode ser perigosa, quem sabe algum estudioso demonstra cabalmente que a Terra é redonda, algo estabelecido desde Ptolomeu há dois milênios, e novidade para alguns. 

Professores e pesquisadores sentem-se revoltados, e independente de qual tenha sido o voto meses atrás, pressentem o desmonte de uma atividade essencial ao desenvolvimento brasileiro.

É preciso lembrar, entre os muitos outros resultados de pesquisas nacionais, que a Embraer entregou recentemente à Força Aérea Brasileira o primeiro avião de transporte KC-390, provavelmente a mais avançada aeronave média de transporte militar do mundo; nos causa orgulho saber que seu desenvolvimento e construção são brasileiros, ainda que neste setor o uso de componentes de vários países seja a regra, a Embraer não é uma “montadora” de aviões. O projeto envolveu uma grande e competente equipe, a maioria de egressos do Instituto Tecnológico da Aeronáutica, o ITA, um dos centros de excelência da educação superior do país. 

Num mundo em acelerado processo de globalização, não contar com instituições desta qualidade obrigará a comprar tecnologia e aceitar o que os demais queiram vender, e nas suas condições.

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.      

wcmc@mps.com.br

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