
O Observatório de Oncologia realizou o estudo "Atenção ao câncer do colo do útero no SUS", com a análise de dados abertos do Ministério da Saúde. O trabalho destaca a importância de estratégias integradas de prevenção, diagnóstico e tratamento para reduzir a incidência e mortalidade da doença no Brasil.
De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (INCA), excluindo os tumores de pele não melanoma, o câncer do colo do útero é o terceiro tipo de câncer mais incidente entre as mulheres no país, com mais de 17 mil novos casos estimados para 2025. É o segundo tumor feminino mais incidente nas regiões Norte e Nordeste.
Os números levantados pelo Observatório de Oncologia revelam um custo superior a R$ 800 milhões em 5 anos para o tratamento da doença no SUS. Isso representa uma média anual de quase R$ 164 milhões, para uma doença evitável a partir da vacinação contra o HPV.
Os achados mostram, ainda, que o câncer do colo de útero continua sendo um grave problema de saúde pública no Brasil, com mais de 33 mil óbitos entre 2019 e 2023 e uma taxa de mortalidade importante. Trata-se da principal causa de morte por câncer entre as mulheres na região Norte e, no Nordeste, ocupa a terceira posição entre as causas de óbito por neoplasias.
No período analisado por meio do Sistema de Informação de Mortalidade (SIM), foram registrados 33.955 óbitos. A distribuição racial dos óbitos indica que 49% das mulheres se autodeclararam pardas, enquanto 41,3% eram brancas e 8,6% pretas, refletindo uma desigualdade que pode estar associada a fatores como acesso ao diagnóstico precoce e tratamento adequado.
Problemas no acesso a diagnóstico e tratamento
Segundo o estudo, a maioria das pacientes enfrenta barreiras no acesso ao tratamento, com necessidade de deslocamento para outros municípios, sendo necessário avaliar a disponibilidade e distância de centros referenciados na regionalização da saúde. Além disso, é de extrema importância o aumento na cobertura da vacinação contra o HPV, com estratégias direcionadas a diminuir a transmissão do vírus causador deste tipo de tumor.
A vacinação contra o HPV (papilomavírus humano) é uma ferramenta fundamental na prevenção. Disponível na rede pública brasileira há 10 anos, a vacina é administrada em crianças e adolescentes de 9 a 14 anos. Em 2018, mais de cinco milhões de pessoas do público-alvo foram vacinadas; contudo, em 2021, esse número caiu para 3,8 milhões. Meninas que receberam a primeira dose da vacina corresponderam a 75,8%, enquanto apenas 58,2% completaram o esquema com a segunda dose. Para melhorar esses índices, o Ministério da Saúde anunciou em 2024 que a vacinação passaria a ser de dose única, visando aumentar a adesão e ampliar a cobertura vacinal.
“O câncer do colo do útero ainda reflete desigualdades no acesso à prevenção, diagnóstico e tratamento. Apesar da existência de políticas como a vacinação contra o HPV e o rastreamento por exames de Papanicolau, a implementação é falha, especialmente em regiões mais vulneráveis. A falta de investimentos estruturais no SUS, somada à desinformação e barreiras geográficas, perpetua altos índices da doença, que poderiam ser evitados. É urgente fortalecer a atenção primária, ampliar o acesso a tecnologias mais eficazes e garantir que todas as mulheres tenham direito a um diagnóstico precoce e tratamento adequado”, pontua Dra. Catherine Moura, Médica Sanitarista e líder do Observatório de Oncologia.
O estudo também avaliou os números de quimioterapia, radioterapia e internações, incluindo cirurgias, relacionadas à doença no SUS.
A análise da distribuição etária mostra que a maior parte das internações ocorreu em mulheres entre 30 e 49 anos, com as faixas de 30-39 anos representando 22,5% e a de 40-49 anos, 27,6%. Além disso, o perfil racial das pacientes internadas indica que 50,7% se autodeclaram pardas, enquanto 40,9% são brancas e 6,6, pretas, refletindo a distribuição demográfica da população brasileira.
Em radioterapia, por exemplo, os dados revelam que 64,4% das pacientes não residem no município onde realizam o tratamento, o que pode dificultar a continuidade e adesão às sessões. Além disso, a mediana para o início da radioterapia é de 117 dias, e 80,5% das pacientes começam o tratamento após 60 dias, diferente do que está prescrito na lei, um atraso que pode impactar negativamente os desfechos clínicos. Esse cenário é ainda mais preocupante considerando que 53,5% das mulheres são diagnosticadas em estádios avançados da doença (3 ou 4), quando a chance de cura é reduzida e o tratamento se torna mais complexo.
A realização periódica do exame preventivo Papanicolau é essencial para a detecção precoce e redução da mortalidade por este tipo de câncer.
“Estudos mostram que as mulheres diagnosticadas com câncer do colo do útero ou nunca fizeram o exame ou deixaram de realizá-lo há mais de 5 anos, no mínimo. Além disso, com o valor do tratamento, poderiam ser realizados exames de Papanicolau em mais de 300 mulheres. Precisamos discutir como abordar de forma eficaz este câncer evitável e altamente tratável quando diagnosticado precocemente”, afirma Nina Melo, coordenadora do Observatório de Oncologia.
O estudo completo está disponível em https://observatoriodeoncologia.com.br/estudos/outros/cancer-do-colo-do-utero/2025/atencao-ao-cancer-de-colo-de-utero-no-sus/