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Estamos presos ao ódio de nossas elites políticas

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Francis Augusto Goes Ricken*

 

Antes de adentrarmos ao debate da prisão do ex-presidente Lula, é importante deixar algo bem claro ao leitor: existem duas formas de observar os acontecimentos dos últimos dias – por meio da política ou por meio do Direito. Faço questão de ressaltar a diferenciação entre as duas visões. A visão política é muito mais permissiva, interessante, apaixonante e sem limites. E a jurídica, um tanto limitada, técnica, e com toda certeza, enfadonha.

A prisão do ex-presidente Lula é um fato, sua condenação tanto em primeira instância, como em segunda instância ocorreram. Infelizmente tivemos a condenação de um ex-presidente da república, algo que marca nossa história constitucional. Lamento profundamente por tal situação ter ocorrido com um ex-presidente, figura tão relevante para o processo de legitimação política na nossa democracia.

Podemos contestar atos praticados pelo juiz de primeira instância, podemos criticar as atuações do Ministério Público, podemos falar de imparcialidade, podemos falar da fragilidade das provas, entretanto, o Poder Judiciário, por meio dos elementos probatórios e da ampla defesa, condenou o ex-presidente. Fugir dos fatos e negar duas condenações na Justiça Federal é tentar fugir da realidade. Aliás, possíveis ilegalidades ocorridas no julgamento do ex-presidente devem e podem ser analisadas pelo Poder Judiciário, a única instituição capaz de sanar possíveis danos aos direitos individuais de um réu. Tenho total certeza que o ex-presidente está bem assistido por seus procuradores, que são exímios e experientes profissionais, sempre atentos e prontos para evitar prejuízos ao seu cliente, afinal esse é o nobre ofício um advogado.

Tenho convicção de que o entendimento do STF sobre a possibilidade de cumprimento de pena de prisão em segunda instância não é a solução para nossos problemas, mas é uma tese defensável e com grande possibilidade de fundamentação jurídica. Não teria a condição de dizer que o STF tomou uma decisão equivocada, afinal ela foi amplamente debatida e deliberada no plenário do Tribunal, entretanto, posso discordar da tese e acreditar em um posicionamento mais próximo ao texto constitucional de 1988. Discordar é valioso para a democracia, discordar é fundamental para o bom entendimento. Dessa forma, afirmo, discordo da tese decidida pela maioria dos ministros do STF, e tenho indícios para acreditar que essa visão, não pacífica, possa ser alterada em breve, com o julgamento das ADCs.

De todas as formas, não há o que se comemorar com a prisão do ex-presidente, mesmo por aqueles que desaprovam ou nutrem sentimentos não republicamos por Lula, comemorar a condenação e prisão diz muito sobre nosso apreço pelo processo democrático. Vibrar, festejar, ou mesmo se sentir contente pela prisão de adversários políticos é algo que causaria estranheza para qualquer indivíduo razoavelmente acostumado ao processo político. Adversários políticos devem ser derrotados nas urnas, na arena política, não por qualquer outro meio que não do enfrentamento democrático. Aliás, a política foi feita para isso, disputar por meio de fundamentos de igualdade e liberdade o apoio de parcela majoritária da população.

Comemorar a prisão de uma importante peça política na disputa eleitoral de 2018, próximo ao processo eleitoral, é como se comemorar a contusão grave de um craque do time adversário próximo a uma final de campeonato. Não existe relação com a disputa, não é uma vitória razoável, não é algo para se alegrar.

Sou categórico em afirmar que é terrível para a democracia termos um ex-presidente preso, já que é algo que marca nossa história constitucional. Entretanto, ainda acredito nas instituições democráticas e tenho convicção que o Poder Judiciário é o poder protetor das minorias, instituição capaz de evitar abusos e proteger o cidadão de agressões aos seus direitos individuais. Não poderia ser de forma diferente, pois deslegitimar o processo e as decisões do Poder Judiciário neste dado momento, custaria muito caro para nossa democracia.

Não culpo o ex-presidente por fazer uso de sua prisão com fins políticos, afinal ele é político, age dessa forma, tentará de todas as maneiras maximizar seus ganhos eleitorais para si ou para seu partido. Assim como acho razoável que seus adversários façam uso de sua prisão com fins eleitorais, afinal, também são políticos. A grave ameaça de todo esse quadro é o tensionamento da discussão, é a dificuldade do consenso, é a aceitação da discussão política. Estou preocupado com o rumo de nossos conflitos políticos, estamos fugindo do razoável, negando as liberdades alheias, “patrulhando” nossos amigos e familiares, deixando que os conflitos de nossas elites políticas entrem em nosso cotidiano e virem nossos conflitos pessoais, estamos bebendo do ódio de nossos políticos e achando o gosto bom.

Com toda a certeza, os acontecimentos dos últimos dias serão fundamentais para a disputa eleitoral de 2018. O uso político da prisão do ex-presidente Lula, talvez seja o assunto mais comentado no processo eleitoral de 2018, o que por si só enfraquece todo o debate político e pauta a disputa eleitoral no superficial. A eleição 2018, a única solução para nossas dificuldades políticas e, lamentavelmente, será pautada pelo o que há de mais raso na natureza humana, o ódio.

 

*Francis Augusto Goes Ricken, é mestre em Ciência Política, advogado e professor do curso de Direito da Universidade Positivo (UP).

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