Em maio de 2017 um importante julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal marcou um novo momento para o direito sucessório no Brasil. O Supremo julgou inconstitucional o artigo 1790 do Código Civil trazendo à realidade brasileira a equiparação entre cônjuges e companheiros em matéria sucessória. Tal declaração de inconstitucionalidade ocorreu com o julgamento do Recurso Especial nº 878.694/MG (tema 809) em que funcionou o Ministro Luiz Roberto Barroso como Relator e a Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS) e o Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) atuaram como amicus curiae.
A advogada Adriana Letícia Blasius, do escritório Küster Machado Advogados Associados, explica que anteriormente ao julgamento, com a vigência do artigo 1790 do Código Civil, os companheiros sobreviventes tinham direito a um quinhão menor sobre bens adquiridos onerosamente durante a constância da união estável, passando o restante dos bens aos descendentes, ascendentes ou colaterais. “Declarado inconstitucional tal artigo, cônjuges e companheiros sobreviventes passaram a herdar o mesmo quinhão, uma vez que, a partir de tal decisão, a proteção aos direitos do companheiro passou a ser ditada também pelo artigo 1829 do Código Civil, que dispõe sobre a sucessão do cônjuge”, destaca.
A especialista diz que mesmo promulgado posteriormente à Constituição Federal de 88, a distinção anteriormente vigente no Código Civil de 2002, não acompanhou a proteção constitucional trazida às diversas espécies de famílias, pelo artigo 226 da CF. “Inclusive, concretizou o retrocesso legal ao revogar as leis nº 8.971/94 e 9.278/96, as quais protegiam as relações familiares advindas da União Estável equiparando-as as entidades familiares advindas do casamento civil”, lembra.
Com a nova decisão, o Supremo adequou a disparidade infraconstitucional novamente instalada em 2002 de modo que a codificação civil passou a caminhar em paralelo com a Constituição em matéria sucessória, respeitando os ditames constitucionais da Dignidade da Pessoa Humana e da Isonomia e excluindo do ordenamento civil a distinção entre as diversas formas de composição familiar no regime sucessório. “Inclusive é de grande valia acrescentar que ao julgar a inconstitucionalidade trazida em relação aos cônjuges e companheiros pelo artigo 1790 do CC, foi acrescido ao julgamento o Recurso Especial que tratava da sucessão entre companheiros homoafetivos, tendo seu julgamento concluído e decidido no sentido de ter a Constituição amparado de forma ampla a união estável, independente de tratar-se de união convencional ou homoafetiva”, avalia.
Adriana Blasius destaca ainda que em relação ao alcance da inconstitucionalidade do artigo 1.790 do CC, visando preservar a segurança jurídica, foi claramente destacado pelo STF que a equiparação entre cônjuges e companheiros somente poderia ser aplicada em inventários judiciais cuja sentença ainda não transitou em julgado; e na modalidade extrajudicial, será aplicada aos casos em que ainda não tenha sido lavrada a Escritura Pública. “Há que se levar em conta ainda, que a forma de divisão patrimonial irá considerar o regime de bens adotado, havendo concorrência com ascendentes, descentes, bem como, só poderá ser aplicada aos inventários judiciais e extrajudiciais iniciados a partir de 11 de janeiro de 2003”, diz.
A advogada destaca que o julgado do STF direcionou a equiparação entre cônjuges e companheiros apenas à aplicação igualitária do artigo 1.829 do Código Civil em nenhum momento faz menção à inclusão do companheiro no rol de herdeiros necessários do artigo 1.845 do Código, porém, utilizando de uma interpretação sistêmica às demais normas pertinentes a sucessão devem ser aplicadas ao companheiro, tais como o direito real de habitação (artigo 1.831 do CC), quota mínima hereditária (1.832 do CC), concorrência com ascendentes (artigos 1.836 e 1.837 do CC), preferência sobre herdeiros colaterais (1.838 e 1.839 do CC). Finalizando, a especialista diz que em relação ao Recurso Especial foram opostos Embargos de Declaração, os quais estão pendentes de julgamento.
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