Artigo: As eleições e o orçamento público. É possível investir no social?

Artigo: As eleições e o orçamento público. É possível investir no social?

 

Por Marcello Seemann – presidente do CRCSC

Nas últimas semanas os brasileiros estiveram envolvidos nas campanhas eleitorais para presidente, governador, senador, deputados federais e estaduais. Esse envolvimento passou a ser ainda maior em âmbito nacional, com a disputa do segundo turno, assim como acontecerá em Santa Catarina e muitos outros estados do País.

E é nesse momento que o debate precisa ser aprofundado, especialmente no que diz respeito a aplicação dos recursos oriundos dos impostos pagos pela sociedade. Dentro disso, um ponto importante a ser discutido e compreendido pelos cidadãos é o orçamento público, que está diretamente ligado ao nosso dia a dia. E a pergunta que todo cidadão precisa fazer é: o orçamento público possibilita maior investimento nas áreas sociais, como saúde, educação e segurança?

Assim como na maioria dos países democráticos, o processo orçamentário envolve todos os poderes e estabelece as ações prioritárias para o atendimento das demandas da sociedade. Ele é feito no âmbito do Poder Executivo, pelo presidente, governadores e prefeitos, no entanto, é o legislativo que debate e aprova ou não, podendo sugerir novos pontos. Ou seja, no município, os vereadores irão votar a proposta do prefeito, bem como os deputados estaduais a proposta do governador e o Congresso Nacional (deputados e senadores) a proposta orçamentária feita pelo presidente.

Para se ter uma ideia, o Governo do Estado de Santa Catarina, em 2017, arrecadou R$ 30,7 bilhões, enquanto sua despesa total alcançou casa dos R$ 30,9 bilhões. Desse total, 19,3%, ou seja, R$ 5,96 bilhões foram destinados ao pagamento de aposentados e pensionistas do Governo de SC. Outros R$ 7,01 bilhões foram repassados aos Municípios, a título de participação nos impostos estaduais (parcelas do ICMS e IPVA). Ainda foram destinados R$ 1,47 bilhão para o pagamento da Dívida Pública (amortização e juros) e mais R$ 8,19 bilhões para o pagamento dos servidores Ativos.

 

Despesa do Governo do Estado de Santa Catarina – ano 2017
Valor Total R$ 30,9 bilhões
Folha de Pagamento – Servidores Ativos R$ 8,19 bilhões
Folha de Pagamento – Inativos e Pensionistas R$ 5,96 bilhões
Repasses aos Municípios (parcela de tributos e FUNDEB) R$ 7,01 bilhões
Custeio/Manutenção R$ 6,34 bilhões
Dívida Pública (Amortização e Juros) R$ 1,47 bilhão
Investimentos R$ 1,97 bilhão

Fonte: CRCSC – Contabilizando para o Cidadão (http://www.crcsc.org.br/contabilizandocidadao/infograficos)

 

Além disso, se analisarmos os valores destinados a folha de pagamento (ativos e inativos) chegamos ao valor de R$ 14 bilhões, ou seja, 46% da arrecadação total. Soma-se a esse valor os repasses aos municípios (R$ 7 bilhões) e chegamos a 68% da receita estadual, ou seja, mais de 2/3 do total já comprometidos, restando cerca de R$ 1,97 bilhão para investimentos públicos (obras e equipamentos), o que significa menos de 6,4% dos R$ 30,9 bilhões realizados. Ressaltando ainda que grande parte foi realizado com recursos de Operações de Crédito, pois a capacidade de investimento do Estado, sem esses recursos, é quase nula.

 

Saúde e Educação – A Constituição de 1988, determina gastos mínimos para duas áreas consideradas prioritárias no país: a saúde e a educação. Ou seja, independente do governo, há a destinação mínima no orçamento público Estadual de 25% da arrecadação com impostos para a educação. Já para a saúde, o percentual é de 12% da Receita Líquida de Impostos – RLI. Se pegarmos novamente o exemplo do ano de 2017, verificamos no Balanço Geral do Estado de Santa Catarina que tivemos destinados recursos na ordem de R$ 2,4 bilhões para a Saúde (13,07% da RLI) e R$ 4,9 bilhões para a Educação (26,94% da RLI).

Outra questão importante é que para outras áreas, como segurança, não há um mínimo estabelecido pela constituição. No entanto, a Lei de Responsabilidade Fiscal estipula que o gasto com pessoal não pode atingir 60% da receita. Porém, isso vem sendo motivo de muita discussão no âmbito político, já que os gastos com funcionalismo são crescentes e cada vez mais governos municipais e estaduais utilizam de artifícios não previstos para se adequar a esse limite. Como a Lei não define de forma clara o que deve ser considerado não se tem ao certo se devem ser incluídos o pagamento dos inativos, funcionários terceirizados, entre outras obrigações.

 

Brasil – No âmbito federal a situação não é muito diferente. Para se ter uma ideia, o projeto de Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2018, aprovada em dezembro de 2017, ficou na casa dos R$ 3,57 trilhões. Desse total, quase 1/3, ou seja, R$ 1,16 trilhão foram destinados ao refinanciamento da dívida pública (endividamento do governo federal, estados e municípios), que em 2018 já passa dos R$ 5 trilhões.

Como o governo gasta mais do que arrecada, a dívida segue aumentando e a tendência é que sobre menos dinheiro para investimentos públicos. Além disso, foram destinados R$ 316 bilhões para o pagamento de juros da dívida pública. Outros R$ 585 bilhões foram para a Previdência Social e mais R$ 322 bilhões para o pagamento do funcionalismo público, restando cerca de R$ 112,9 bilhões para investimentos públicos, o que significa menos de 5% dos R$ 3,57 trilhões previstos.

 

Brasil – Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2018 (Aprovada em 2017)
Valor Total R$ 3,57 trilhões
Refinanciamento da dívida pública R$ 1,16 trilhões
Juros da dívida pública R$ 316 bilhões
Previdência Social R$ 585 bilhões
Funcionalismo Público R$ 322 bilhões
Investimentos Públicos R$ 112,9 bilhões
Saúde R$ 130 bilhões
Educação R$ 109 bilhões

 

Ciclo Orçamentário – Para responder a pergunta que propusemos – se há possibilidade de maior investimento no social – é importante observarmos e entendermos o ciclo orçamentário, já que no próximo ano, tanto o presidente eleito, como governadores, apresentarão o chamado Plano Plurianual (PPA), que é feito exatamente a cada quatro anos, e serve como base do planejamento orçamentário a longo prazo.

O PPA estabelece qualitativamente e quantitativamente quais serão os investimentos da administração pública em cada área em que atua (Saúde, Educação, Transporte, Indústria, Assistência Social, entre outros). O plano define as estratégias, diretrizes e metas da administração para um período de quatro anos. Assim, o PPA é revisado, monitorado e aperfeiçoado anualmente para ser readequado à situação esperada no próximo ano.

É justamente através do PPA que temos o início de um novo ciclo orçamentário. Ao longo desse tempo, elabora-se anualmente uma LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e uma LOA (Lei Orçamentária Anual) para operacionalizar, no curto prazo, a estratégia do PPA. São essas três leis (PPA, LDO e LOA) que regem o ciclo orçamentário, formando um sistema integrado de planejamento e orçamento, reconhecido na Constituição Federal, que deve ser adotado pelos municípios, pelos estados e pela União.

Como já dissemos, a elaboração dos projetos de lei do PPA, da LDO e da LOA cabe exclusivamente ao Executivo, ou seja, prefeitos, governadores e presidente. O legislativo (vereadores, deputados estaduais, federais e senadores) pode encaminhar emendas para discussão e votação.

Já o Ministério Público não discute, não vota, nem aprova o orçamento público. Porém, é chamado para intervir legal e penalmente quando qualquer irregularidade é constatada pelos órgãos de controle interno, externo ou social.

Por isso é fundamental observarmos as propostas dos candidatos e analisar até que ponto elas são factíveis dentro do contexto econômico, já que o País ainda enfrenta uma crise e tem boa parte de sua arrecadação comprometida. Tão importante quanto falar em investimentos é colocar a casa em ordem, estancar os gastos públicos, diminuir a dívida pública para aí sim existir mais condições de destinar os recursos para as áreas mais importantes, como saúde, educação e segurança.

O momento do debate é agora, especialmente no que diz respeito à Reforma da Previdência, pois como já citado, foram R$ 5,96 bilhões destinados ao pagamento de aposentados e pensionistas aqui em Santa Catarina. Como a conta só cresce, enquanto as receitas ou diminuem ou se mantém, uma hora a conta não vai fechar, porém todos sabem quem no final vai pagá-la. E o pior, uma conta alta, deixando a saúde, educação e segurança mais uma vez em segundo plano, já que no primeiro está a irresponsabilidade com os recursos públicos e com a sociedade.

 

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