O professor Francisco Zardo faz comentรกrios sobre a Lei 13869/2019, e acredita que o Estado e os agentes estatais devem dar o exemplo cumprindo os princรญpios legais aos quais estรฃo submetidos para que o cidadรฃo se sinta estimulado a fazer o mesmo
Com 45 artigos, a Lei de Abuso de Autoridade (Lei 13869/2019) estรก em vigor. Sancionada em setembro do ano passado, a nova legislaรงรฃo criminaliza excessos cometidos por servidores, membros do Ministรฉrio Pรบblico e Forรงas Armadas, especifica condutas que devem ser consideradas abuso de autoridade e prevรช puniรงรตes aos infratores.
Na expectativa do professor Francisco Zardo, diretor do IPDA โ Instituto Paranaense de Direito Administrativo, a lei deve fomentar por parte das autoridades o exercรญcio mais prudente, firme e rigoroso na aplicaรงรฃo da lei, mas sem jamais descumprir os direitos fundamentais consagrados na Constituiรงรฃo Brasileira.
โOs culpados devem ser condenados, mas seus direitos devem ser respeitados ao longo da investigaรงรฃo e do processo. O Estado e os agentes estatais devem dar o exemplo cumprindo os princรญpios legais aos quais estรฃo submetidos para que o cidadรฃo se sinta estimulado a fazer o mesmoโ, ressalta o advogado.
Em relaรงรฃo ร polรชmica de que a lei seria uma forma de intimidar autoridades e favorecer a impunidade, Zardo afirma que a lei estรก em vigor e deve ser aplicada. โAcredito que nรฃo servirรก como instrumento de intimidaรงรฃo, atรฉ porque sua aplicaรงรฃo caberรก ao Poder Judiciรกrio, em quem devemos confiarโ, completa.
Destaques
Para Zardo os dois parรกgrafos do artigo 1ยบ merecem destaque porque devem nortear a interpretaรงรฃo e a aplicaรงรฃo de toda a lei. O primeiro define crimes de abuso de autoridade como condutas praticadas com a finalidade especรญfica de prejudicar outrem ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, por mero capricho ou satisfaรงรฃo pessoal. โPortanto, a configuraรงรฃo do crime de abuso de autoridade depende do dolo especรญfico, isto รฉ, do compromisso da autoridade com o abuso do poder que lhe foi conferidoโ, analisa.
O segundo parรกgrafo dispรตe que a divergรชncia na interpretaรงรฃo de lei ou na avaliaรงรฃo de fatos e provas nรฃo configura abuso de autoridade. Zardo observa que as leis e os fatos comportam diversas intepretaรงรตes. O que o dispositivo veda รฉ a incriminaรงรฃo da autoridade apenas por interpretar a lei, os fatos ou as provas de sua prรณpria maneira. โObviamente, esta interpretaรงรฃo deve ser fundamentada, como exige o artigo 93 da Constituiรงรฃoโ, pontua.
Relevantes
Dos 26 tipos penais criados pela Lei 13869/2019, Zardo destaca trรชs como avanรงos. O artigo 9ยบ considera crime de abuso de autoridade โdecretar medida de privaรงรฃo da liberdade em manifesta desconformidade com as hipรณteses legaisโ, procurando evitar prisรตes indevidas.
O artigo 23 proรญbe โinovar artificiosamente, no curso de diligรชncia, de investigaรงรฃo ou de processo, o estado de lugar, de coisa ou de pessoa, com o fim de eximir-se de responsabilidade ou de responsabilizar criminalmente alguรฉm ou agravar-lhe a responsabilidadeโ. โEsse tipo busca evitar que provas sejam plantadas para incriminar alguรฉm ou para se eximir de responsabilidade, como, por exemplo, colocar um revรณlver nas mรฃos da vรญtima para dizer que ela reagiuโ, assinala.
Por fim, Zardo ressalta o artigo 38 que prevรช como crime โantecipar o responsรกvel pelas investigaรงรตes, por meio de comunicaรงรฃo, inclusive rede social, atribuiรงรฃo de culpa, antes de concluรญdas as apuraรงรตes e formalizada a acusaรงรฃoโ.
Prerrogativas
Ao concluir seus comentรกrios, Zardo qualifica como โuma inovaรงรฃo absolutamente saudรกvelโ a lei determinar como crime de abuso de autoridade a violaรงรฃo das seguintes prerrogativas dos advogados: a inviolabilidade do seu local de trabalho, o direito de se comunicar com seus clientes, ter a presenรงa de representante da OAB, quando preso em flagrante por motivo ligado ao exercรญcio da advocacia e, quando preso, ficar em sala de Estado Maior antes do trรขnsito em julgado.