Luís Fernando Lopes (*)
A fala recente do ministro da Educação – “universidade deveria ser para poucos” parece fazer coro com nosso histórico de negação do acesso à educação aos menos favorecidos. Sob o disfarce de uma pseudoneutralidade não ideológica, a fala do ministro revela uma visão muito reducionista da educação e do ensino superior em particular, além de uma concepção de sociedade na qual cada um é obrigado a se conformar com sua situação de classe.
Em um país no qual a ideia de que Universidade possui um histórico educacional de sabotagens e sucessivas reformas, cujos efeitos nem sempre são os esperados e anunciados para justificar essas alterações contínuas, precisa ser privilégio de alguns para ser útil, não obstante ao enorme preconceito que traz embutida, não soa como uma novidade.
Tentar responsabilizar aqueles que, com muito esforço conseguiram concluir o ensino superior, e que hoje podem estar desempregados pela incompetência de gestores políticos que atuam na contramão do desenvolvimento do país, é lançar mão de uma ideologia maldosa de inversão de responsabilidades. Do mesmo modo, pensar o ensino superior apenas como formação para conseguir um emprego desconsiderando a formação humana integral e sua contribuição para o desenvolvimento do país é uma perspectiva demasiadamente reducionista.
Da chegada e expulsão dos Jesuítas até as mais recentes mudanças na legislação educacional brasileira temos acumulado retrocessos que prejudicam demasiadamente os poucos avanços conquistados. Sob a égide da modernização e atualização o que se faz muitas vezes é criar mecanismos sutis para dificultar o acesso da população menos favorecida a determinados cursos e conteúdos. Basta mencionar, por exemplo, o histórico de retiradas e inserções nos currículos escolares de disciplinas como Filosofia e Sociologia e a portaria 328 de 5 de abril de 2018, que suspendeu por cinco anos a autorização para abertura de novos cursos de Medicina, apesar de convivermos com a falta de médicos.
A demora em erradicar o analfabetismo, a universidade que tardiamente foi criada no país, a situação precária de muitas escolas públicas atualmente, os cortes e desvios de verbas públicas, inclusive da merenda escolar, o descaso com as universidades públicas, a nomeação de reitores por razões ideológicas são alguns dos elementos que podem auxiliar na compreensão de nossa situação educacional e seu histórico de negação e sabotagens.
Outro elemento desse negacionismo revestido de preconceitos aparece também no histórico de nossa legislação educacional. A lei de 15 de outubro de 1827, por exemplo, que representa um grande avanço, pois mandava criar escolas de primeiras letras em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos do Império, no seu artigo 12, proibia que as mestras estudassem noções de geometria e limitava para elas a instrução da aritmética apenas às quatro operações.
Não obstante os vários exemplos de países que alcançaram seu desenvolvimento econômico e social por meio da ampliação generalizada do acesso à educação em todos os níveis, no Brasil a manutenção de privilégios de classe passa pela negação e sabotagem do sistema educacional. Como ocorre também em outros setores, na educação as políticas não são de Estado, mas de governos que preferem ser subservientes aos interesses daqueles que os financiam, independentemente dos prejuízos causados ao país.
(*) Luís Fernando Lopes é Mestre e Doutor em Educação e Professor da Área de Humanidades do Centro Universitário Internacional UNINTER