Mais mulheres congelaram seus óvulos por causa da pandemia. E os motivos vão desde o adiamento da gestação com as incertezas do futuro, até a mudança de prioridades: em vez das viagens frequentes, é hora de preservar a fertilidade
Esse crescimento mundial demonstra que as mulheres estão congelando os óvulos por causa da pandemia. Não são só os casais que estão decidindo, juntos, o congelamento de óvulos. Muitas mulheres solteiras sentem-se como se estivessem ‘atrasadas’ em seus planos de vida. “Em um mundo ideal, as pacientes congelariam seus óvulos aos 35 anos, já que a fertilidade diminui significativamente depois disso. Mas hoje, para solteiras na casa dos 30 anos que desejam ter filhos, um ano passado no isolamento da pandemia pode fazer o relógio biológico parecer mais alto. A idade está aumentando e não há socialização, então elas não estão encontrando quem querem conhecer para formar uma família. Portanto, elas provavelmente estão pensando em como preservar sua fertilidade”, afirma o Dr. Rodrigo. De acordo com o especialista, a procura pela gestação independente geralmente ocorre por dois motivos: avanço da idade ou quando a futura mãe passou por relacionamentos que não acabaram tão bem e, por isso, decidem passar por uma gestação sozinha.
Um levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que o adiamento da gestação é uma realidade. Entre 2009 e 2019, houve um crescimento de 63,6% entre o número de mães na faixa etária de 35 a 39 anos; entra aquelas com idade entre 40 e 44 anos, a alta foi de 57% no mesmo período; e aumento em 27,2% até mesmo o número de mães de 45 a 49 anos. “Por outro lado, os partos entre jovens com até 19 anos caíram 23%, enquanto entre 20 e 29 anos reduziram 8,4%”, afirma o médico.
No Brasil e no mundo, o congelamento de óvulos tem se tornado, ano a ano, mais popular, mas nunca experimentou um aumento tão expressivo. Para muitas pessoas que se mantiveram estáveis financeiramente, a pandemia foi um modo de acumular algum dinheiro a mais na conta (na falta de viagens e dificuldades na realização de procedimentos estéticos), de forma que grande parte usou disto para reorganizar as prioridades, apostando na preservação da fertilidade. “Muitas mulheres já estavam congelando seus óvulos por motivos médicos, seja porque estavam passando por um procedimento médico como a quimioterapia, que pode reduzir a fertilidade, ou um problema de saúde como a endometriose, que pode afetar negativamente a capacidade de engravidar. Mas, de uns anos para cá, muitas mulheres passaram a congelar seus óvulos simplesmente porque ainda não se sentem prontas para ter um filho ou querem dedicar mais tempo à vida profissional”, diz o especialista. Nos Estados Unidos, em 2009, apenas 475 mulheres congelaram seus óvulos, de acordo com a Society for Assisted Reproductive Technology, ao passo que, em 2018, o número saltou para 13.275 mulheres que passaram pelo procedimento, um aumento de 2.695%. “Mas a pandemia e a possibilidade de home office causou um ‘boom’ na procura pelo procedimento, que requer idas recorrentes ao consultório”, afirma o Dr. Rodrigo Rosa.
Mas afinal, como funciona a técnica? Segundo o médico, a criopreservação é uma técnica de congelamento que pode ser feita em óvulos, tecido ovariano, espermatozoides e embriões. “Na temperatura de -196ºC, esses organismos mantêm seu metabolismo completamente inativado, mas preservando um desenvolvimento potencial e viabilidade. Muitos casais precisam preservar os gametas por se depararem com a impossibilidade imediata de maternidade ou paternidade, seja por escolha ou por circunstâncias adversas”, diz o médico.
Além de condições de saúde, genética e de idade, muitos hábitos estão relacionados com um problema que afeta, atualmente, 48 milhões de casais no mundo: a infertilidade. “Nas mulheres, além da idade, as causas da infertilidade estão relacionadas a alterações nas tubas (fator tubário): infecções pélvicas que podem causar obstrução das tubas, endometriose e aderências cirúrgicas; disfunções ovulatórias (fator ovulatório), como síndrome dos ovários policístico, alterações hormonais relacionadas à idade, alterações aos hormônios da tireoide e altos níveis de prolactina, também interferem na fertilidade; e o fator uterino, no caso de útero septado, miomas e pólipos uterinos”, explica a Dra. Eloisa Pinho. “Nos homens, a infertilidade está relacionada principalmente a condições como varicocele, que é a dilatação das veias dos testículos, infecções urogenitais e hipogonadismo, ou seja, quando os testículos não produzem quantidades adequadas de testosterona, principal hormônio sexual masculino. No homem, por exemplo, o estresse favorece o surgimento de proteínas inflamatórias que prejudicam a qualidade do sêmen”, afirma o Dr. Rodrigo Rosa. É exatamente por esse motivo que muitos casais optam por procurar especialistas para ter um bebê por meio de técnicas de reprodução assistida.
Com os dados, ainda não está claro se a pandemia resultará em baby boom ou em colapso e queda da taxa de natalidade. “Mas esse aumento do congelamento de óvulos é uma indicação clara de que a preservação da fertilidade definitivamente assegurou a importância devida na cabeça das pessoas”, finaliza o médico Dr. Rodrigo Rosa. E, para muitas mulheres, essa técnica é a esperança em se sentir segura para adiar um sonho e formar uma família quando as coisas estiverem “menos de ponta cabeça”.
FONTES:
*DR. RODRIGO ROSA: Ginecologista obstetra especialista em Reprodução Humana e sócio-fundador e diretor clínico da clínica Mater Prime, em São Paulo. Membro da Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida (SBRA) e da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana (SBRH), o médico é graduado pela Escola Paulista de Medicina – Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP/EPM). Especialista em reprodução humana, o médico é colaborador do livro “Atlas de Reprodução Humana” da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana.
*DRA. ELOISA PINHO: Ginecologista e obstetra, Pós-graduada em ultrassonografia ginecológica e obstétrica pela CETRUS. Parte do corpo clínico da clínica GRU Saúde, a médica é formada pela Universidade de Ribeirão Preto, realiza atendimentos ambulatoriais e procedimentos nos hospitais Cruz Azul e São Cristovão, além de também fazer parte do corpo clínico dos hospitais São Luiz, Pró Matre, Santa Joana e Santa Maria.