(*) Douglas Henrique Antunes Lopes
É comum que, quando as pessoas identificam um enxame de abelhas, logo querem atear fogo ou chamar a defesa civil para que eliminem o aparente inimigo. No entanto, boa parte das nossas abelhas não possuem ferrão. Isso mesmo, saiba que boa parte das espécies de abelhas brasileiras tiveram seus ferrões atrofiados ao longo dos processos evolutivos.
No entanto, o imaginário popular tende sempre a lembrar de uma espécie exótica, a apis melífera, mas ela foi trazida de fora do país. Os primeiros a trazê-las foram nossos colonizadores portugueses para que pudessem suprir a demanda de cera, então elas ficaram conhecidas como “abelhas europeias”. E no século XX tivemos a inserção das abelhas africanas que se adaptaram bem à flora do nosso país e são altamente produtivas.
Nesse dia 22 de setembro ingressamos na primavera e, apesar das alterações climáticas, esse é o período em que a natureza se mostra mais exuberante. Um maior número de plantas se esforça para soltar suas floradas e, dessa maneira, poder gerar frutos para que possam reproduzir-se. No entanto, a grande maioria delas não consegue gerar frutos sozinhas e precisa que algum polinizador recolha o seu pólen e o leve a outras flores para o processo de fecundação ter êxito. É aí que entram as abelhas.
Em todo o mundo há cerca de 20 mil espécies de abelhas catalogadas. O Brasil possui a maior diversidade de espécies sem ferrão, contando com mais de 300 delas! As mais conhecidas são as jataís que podem ser encontradas em todo o território nacional. Além delas, temos as mandaçaias, as tubunas, as bugias e assim por diante. Cada espécie possui coloração, morfologia, entradas e estruturas do ninho próprias. Essas incansáveis operárias são responsáveis pela polinização das nossas plantas nativas e, também, das plantas exóticas que se adaptaram bem por aqui.
Como se não bastasse que as abelhas nos prestem o serviço essencial da garantia de alimentos, seu papel também se revela na economia. De acordo com o Relatório Temático Sobre Polinização, Polinizadores e Produção de Alimentos no Brasil, calcula-se que a polinização relacionada ao mercado agrícola está estimada em US$ 12 bilhões por ano. Porém, um dos grandes problemas da conservação das nossas polinizadoras é o desmatamento.
Boa parte das abelhas nativas do Brasil fazem seus ninhos em ocos de árvores. E o processo para que uma árvore fique grande e envelheça a ponto de ter um oco (feito por cupins, roedores ou outros fatores) pode demorar décadas. Paradoxalmente, aqueles que deveriam ser os maiores aliados dos polinizadores têm sido, na verdade, seus maiores inimigos. Os agricultores não têm pudor em desmatar ou usar agrotóxicos. Somente em janeiro de 2019, o estado de Santa Catarina estima ter perdido cerca de 50 milhões de abelhas envenenadas por agrotóxicos.
Para aqueles que defendem que não é possível produzir sem o uso de “defensivos agrícolas”, há pesquisas indicando que as produções com enxames podem ter um grande ganho na qualidade de grãos e frutos, além de poderem aumentar consideravelmente o volume da produção. No caso da soja pode aumentar até 58,6%, e pode chegar a 81% a mais no peso das vagens, segundo matéria da Associação Brasileira de Estudos das Abelhas.
Se você não é um grande agricultor, ainda sim você pode contribuir com a preservação das abelhas. Além de defender os enxames da região em que você mora, é possível criar espécies nativas sem ferrão no quintal da sua casa. O nome dessa atividade é meliponicultora e ela está em expansão e com muita demanda, afinal você pode exercê-la sem preocupar-se com equipamentos caros ou ferroadas. Além disso, terá horta e jardim com frutos em abundância, o próprio mel e ainda poderá criar uma fonte complementar de renda bastante interessante. Mas antes de iniciar é recomendável consultar meliponicultores e os órgãos reguladores do seu estado. As abelhas não são um risco, o risco é ficar sem as abelhas.
(*) Douglas Henrique Antunes Lopes é meliponicultor e professor do curso de Filosofia do Centro Universitário Internacional UNINTER