O Museu Paranaense, com sua equipe, está se preparando para promover nesta semana um dos encontros mais significativos e também delicados que já aconteceram em seus 145 anos de fundação. O encontro, na verdade, são encontros. De um lado, o público fiel do MUPA, sempre receptivo a conhecer diferentes cosmovisões; do outro, os indígenas Beppre re Kayapó, Kokodjy Kayapó, Mrynho re Kayapó, Bekwynhtokti Kayapó, Mrodjanh Kayapó e Moxare Kayapó.
O grupo, da etnia Mebêngôkre-Kayapó, fará uma verdadeira travessia pelo Brasil, saindo (alguns pela primeira vez na vida e sem falar português) da aldeia Kubenkrãkenh, município de Ourilândia do Norte, localizada no Pará, para compartilhar habilidades e saberes ancestrais com o público do MUPA. Eles estarão acompanhados do início ao fim da grande viagem pelo antropólogo Daniel Tibério Luz, da Associação Floresta Protegida. Levarão cinco dias para chegar até aqui, com a jornada dividida entre trajeto a pé, de barco, caminhonete e, por fim, o trajeto aéreo.
Nos dias 14 e 15 de maio, sábado e domingo, respectivamente, o grupo de mulheres indígenas fará no museu a oficina “Jenipapo, pintura corporal e grafismos Mebêngôkre-Kayapó”, na qual pintarão com a pigmentação oriunda de dois elementos vegetais – o jenipapo e o carvão vegetal – partes do corpo dos visitantes interessados em conhecer mais sua cultura tradicional. As pinturas corporais são consideradas roupas que versam sobre as fases da vida: luto, nascimentos e cerimônias.
Além da oficina de pintura corporal, o grupo traz ao museu uma gama variada de artesanatos feitos em sua aldeia. No sábado, a partir das 14h, será possível acompanhar uma breve apresentação de Daniel Tibério Luz sobre os trabalhos desenvolvidos com os Mebêngôkre-Kayapó, contextualização do histórico da região de Tucumã-PA e aldeia Kubenkrãkenh. As oficinas acontecem sábado e domingo, das 14h às 18h, e não há necessidade de inscrição prévia. O público será atendido por ordem de chegada.
AS PINTURAS E SEUS SIGNIFICADOS – Os mais elaborados desenhos de traços são pintados pelas mulheres, que exercem o importante papel de preservação e de perpetuação desse conhecimento. Desde a infância, as menires, como são chamadas nas aldeias, aprendem as pinturas características de seu povo e as disseminam por gerações, fortalecendo durante esse processo, principalmente, as relações entre os Mebêngôkre-Kayapós e suas aldeias.
Além de exibir a identidade Mebêngôkre, esse tipo de arte corporal também é usado em rituais, encontros, adornos e festejos. Uma mulher pode se pintar de preto com extrato de jenipapo, por razão do filho ter completado um ano de idade, marcando com isso a possibilidade dela voltar a participar das atividades cotidianas da aldeia, depois desse um ano de uma série de prescrições.
SOBRE A ETNIA – O termo kayapó é herança do início do século XIX. Eles próprios não se designam por esse termo, alcunhado por grupos vizinhos para nomeá-los e que significa “aqueles que se assemelham aos macacos”. Os Kayapó se referem a si como mebêngôkre, “os homens do buraco/lugar d’água”. Mas, como popularmente disseminou-se o termo kayapó, é comum nos dias de hoje que
sejam referidos pela junção entre as duas designações: “Mebêngôkre-Kayapó”.
Os Mebengokre-Kayapó são nacional e internacionalmente conhecidos por sua presença e atuação contundente em pautas políticas e ambientais, como é o caso do cacique Raoni Metuktire, reconhecido pela luta em prol da preservação da Amazônia e da vida dos povos indígenas.
MEBÊNGÔRE-KAYAPÓS E O ACERVO DO MUPA – Além do encontro com o público para a oficina de pintura corporal, o grupo vêm até Curitiba para ficar frente a frente, pela primeira vez, com um acervo etnográfico e imagético que registra seu povo. Os Mebêngôkre-Kayapó estão representados no museu por meio da Coleção Vladimir Kozák e da Coleção João Américo Peret.
A primeira coleção é composta substancialmente por acervo imagético (fotografias, cromos, filmes e iconografia), e a segunda é caracterizada por acervos tridimensionais, que são objetos como ornamentos plumários, bordunas e outros armamentos de guerra ou rituais, inúmeros ornamentos de dentes, sementes ou miçangas, em sua maioria itens que versam sobre a perpétua necessidade Mebêngôkre-Kayapó de transformação dos corpos.
São mais de 100 objetos tridimensionais, as fotografias ultrapassam 300 registros, a iconografia composta de desenhos e pinturas juntamente com os registros por escrito a respeito do grupo somam mais de 80 itens. Ou seja, são no mínimo 480 objetos de origem direta Kayapó e de registros secundários feitos por pesquisadores.
O encontro desses indígenas que vivem no norte do Brasil com um importante acervo sobre seu povo, resguardado por uma instituição museológica do sul do país, faz parte de uma política de reparação histórica iniciada pela atual gestão do MUPA.
“Para o MUPA, o encontro com os kayapós traz uma energia única, especial; proporcionar a vinda do grupo com o museu e aproximá-los não só com o público, mas também com o nosso acervo, está entre as nossas prioridades”, pontua a diretora do museu, Gabriela Bettega.
SERVIÇO – Oficina de pintura corporal “Jenipapo, pintura corporal e grafismos Mebêngôkre-Kayapó”. Dias 14 e 15 de maio no Museu Paranaense. Atividade gratuita, a pintura individual será feita por ordem de chegada.
Dia 14, das 14h às 18h (neste primeiro dia haverá uma breve apresentação do antropólogo da Associação Floresta Protegida, Daniel Tibério Luz, sobre os trabalhos desenvolvidos com os Mebêngôkre-Kayapó, contextualização do histórico da região de Tucumã-PA e aldeia Kubenkrãkenh).
Dia 15, das 10h às 13h30.
Fernanda Maldonado