Grupo Baquetá arrebata cinco prêmios no Festival de Teatro da Amazônia

Trabalho de afirmação étnico-racial do grupo focado nas crianças teve repercussão calorosa de público e crítica e reflete a necessidade de colocar em pauta os assuntos de seu repertório

O Grupo Baquetá, de Curitiba, foi premiado… e muito premiado! Em sua participação no 17º Festival de Teatro da Amazônia, encerrado no dia 15 de outubro, recebeu cinco prêmios, de suas sete indicações, pelo musical “Itan e Tal”. Os troféus são melhor espetáculo infantil, melhor diretor (Marcel Malê), melhor atriz (Kamylla dos Santos – Nati), melhor iluminação – Nathan Gabriel e melhor trilha sonora/sonoplastia – Nelson Sebastião.

Grupo Baquetá, de Curitiba, em “Itan e Tal”, peça que trabalha a afirmação etnico-racial é a grande vencedora do Festival de Teatro da Amazônia

Kamylla dos Santos conta que sonhou com a passagem do Grupo Baquetá na Amazônia. O prenúncio transformou-se em ação e a trupe arregaçou as mangas para viabilizar a viagem, o que não foi fácil. “A Amazônia passa por uma seca absurda, a fumaça tomou conta de Manaus, queimadas. Muito lixo na rua, na beirada seca do rio. Choque de realidade. Preocupante como falta cuidado de nossas florestas e águas. Mas, arte é respiro! A história de Nati reverberou no Teatro Amazonas. Preenchemos aquele espaço colônia com nossa potência. Em respeito a quem ergueu aquela estrutura, pessoas pretas e indígenas”, diz ela.

Kamylla dos Santos: melhor atriz na pele de Nati, uma garotinha de 9 anos que busca suas origens

“Itan e Tal” é o espetáculo mais novo do Baquetá, e conta a história de Nati, uma menina negra, que junto com seu pai cria um jogo, o “Mundo Invertido das Palavras” e descobre seu nome ao contrário, que tem um significado no idioma de suas origens afro-indígenas. A palavra Itan serve, então, como um disparador de uma profunda jornada em busca de sua história e ancestralidade.

Para o Grupo, a base do espetáculo “Itan e tal” é imaginar possíveis futuros por meio de uma lente cultural negra, afirmando valores e princípios apagados pela colonialidade. Para chegar a essa proposta, a montagem é inspirada no cosmograma do povo bakongo, que é uma representação simbólica dos ciclos do sol, da vida, do universo e do tempo, que explica a criação do mundo, a vida humana e os processos sociais como metáfora do ciclo vital. “Itan e Tal” também usa como referência as afrografias, oralituras e o tempo espiralar proposto pela professora e dramaturga Leda Maria Martins, para apresentar elementos da orixalidade e do afro-futurismo.

Itan e Tal: referências africanas e indígenas fazem crianças se identificarem com personagens

“As pessoas têm se reconhecido nesse trabalho, Itan e Tal é um espetáculo muito importante para o estado do Paraná, e a gente sente uma falta de reconhecimento da trajetória do grupo que já tem 14 anos de história se dedicando as essas narrativas. Esse espetáculo surgiu em um processo de edital, e através disso podemos alcançar 22 mil crianças e a gente não teve um reconhecimento desse trabalho. Então quando a gente vai para a região norte, pra Amazônia, e vê que sim, que é importante, e a gente volta mais fortalecido com o nosso compromisso. E além de voltarmos com a bagagem cheia de prêmios, voltamos cheios de experiências” relembrou a atriz premiada Kamylla dos Santos, que também é a fundadora do Grupo.

O Baquetá é um grupo de teatro afro-referenciado, sediado em Curitiba, que mescla música, teatro, dança, contação de histórias e teatro de formas animadas. Com uma trajetória de 14 anos, o Grupo Baquetá, que já circulou por capitais e interior do país representando narrativas de povos afro-indígenas paranaenses, ainda é pouco conhecido em sua cidade natal. Com 24% dos habitantes autodeclarados negros, de acordo com o último censo do IBGE, Curitiba é considerada a capital mais negra do sul do país. Entretanto, tais narrativas ainda sofrem com o apagamento gerado pela valorização da ideia de uma cidade de origem europeia.

“O reconhecimento do esforço e do cuidado que temos em produzir espetáculos sobre nossas narrativas afro-indígenas há tempo. Enquanto no Sul a gente segue num contínuo apagamento, estamos construindo nossa história em outros espaços, que entendem a importância do trabalho”, diz Marcel Malê, diretor da peça.

Ao longo de nove dias de programação, 15 espetáculos participaram da mostra competitiva, sendo cinco do sul do país. Para chegar lá, os empreendedores participaram de uma seletiva que contou com 216 obras, em várias linguagens, incluindo a infantil – especialidade do Baquetá. Ao todo, estavam em disputa (saudável) 16 premiações, sendo oito direcionadas aos espetáculos para crianças.

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Sobre o “Itan e Tal”

O projeto Itan e Tal reúne uma equipe afro-referenciada de artistas pesquisadores: Marcel Malê assina a direção cênica, Nelson Sebastião está à frente da direção musical, Kunta Leonardo da Cruz assina a direção de movimento. A cenografia é assinada pela artista visual Ayala Prazeres, os figurinos foram elaborados por Carla Torres, Preto Martins é o dj e sonoplasta e Nathan Gabriel é o responsável pelo desenho de luz. O Grupo Baquetá é formado por André Daniel, Maycon Souza e Kamylla dos Santos, que também assina a direção de produção.

 

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