Kim Jong-un e Donald Trump: aurora de novos tempos na península coreana?

João Alfredo Lopes Nyegray*

“A guerra dá a paz sua segurança”. É pelo espectro da batalha, graças aos sofrimentos e perdas dos embates, que se valoriza e espera pelos tempos pacíficos. A frase de Tucídides sobreviveu ao passar dos anos e pode aplicar-se aos nossos dias, mesmo vinda da antiguidade. Uma possível razão pela qual o pensamento do grego nunca perdeu sua aplicabilidade é a constância das hostilidades e conflitos no decorrer da história humana. O último século, por exemplo, viu não apenas um, mas vários genocídios – nos quais a humanidade foi desafiada pelas mais diversas barbáries e regimes totalitários.

Esse é, sem dúvidas, um dos motivos pelos quais a reunião entre Donald Trump e Kim Jong-Un chamou tanto a atenção do mundo. Estados Unidos e Coreia do Norte nunca tiveram boas relações e, desde 2017, uma afiada troca de farpas entre os líderes de ambas as nações tornava ainda mais nebuloso o futuro. Era longínqua a possibilidade do encontro dos dois líderes. Mas, ainda assim, aconteceu.

De um lado, Kim Jong-un, terceiro líder supremo da Coreia do Norte. Um jovem ditador de idade incerta, estimada entre 34 e 36 anos. Do outro, Donald John Trump, 45º presidente dos Estados Unidos, com ampla carreira midiática e empresarial. Aos 72 anos, Trump é uma personalidade controversa. Envolto em escândalos das mais diversas ordens, proferidor de afirmações bastante questionáveis – seja a respeito das mulheres, seja sobre imigrantes, seja em relação a outros países aos quais já se referiu como “shithole countries” (países de merda) – o presidente estadunidense está longe de ser uma unanimidade. Há aqueles que o elogiam pelas promessas de campanha e modus operandi, há aqueles que o critiquem pelo conjunto da obra.

Seja como for, é inegável que a reunião de 12 de junho foi histórica. Após horas juntos, Trump e Jong-un assinaram um acordo composto por quatro pontos principais: comprometimento de relações pacíficas entre os países, manutenção de esforços conjuntos para a paz na península coreana, desnuclearização das Coreia do Norte e a recuperação dos restos mortais dos prisioneiros de guerra. O que se percebeu foram muitos sorrisos, longos apertos de mão e trocas de elogios ao ocorrido. O que resta saber é se o acordo será cumprido.

Não é muito difícil manter-se cético à desnuclearização. Em outros momentos da história, a Coreia do Norte também buscou aproximar-se do vizinho do Sul e do resto do mundo, voltando atrás logo em seguida. No entanto, dessa vez há algumas diferenças que merecem destaque. A primeira delas é bastante simbólica: a participação de ambas as Coreias juntas nas Olimpíadas de Inverno. A segunda ocorreu em abril deste ano, quando o secretário de estado dos Estados Unidos, Mike Pompeo, encontrou-se pessoalmente com Kim Jong-un em Pyongyang para discutir o encontro com Trump, as relações com a Coreia do Sul e os testes nucleares. A terceira, também em abril, foi o encontro entre o líder norte-coreano com o presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in.

Seguramente, há razões para ter esperança. Críticos do encontro afirmam que Trump pode ter “homologado” um dos regimes mais sanguinários da atualidade. Outros, mantém-se receosos pela falta de metas, datas e prazos. De certa forma, pode-se compartilhar um pouco das últimas apreensões. Por outro lado, no entanto, é inegável que a reunião foi capaz de diminuir um pouco da tensão naquela região do mundo, o que já é por si só um feito louvável.

Por fim, como todos sabemos, falta de tudo na Coreia do Norte. De alimentos a medicamentos, de tecnologias a itens básicos do ocidente. Mesmo assim, as restrições e sanções comerciais permanecem. Trump afirmou que as sanções serão removidas “quando tivermos certeza de que as armas nucleares não são mais um fator [de risco]”. Esse processo pode levar tempo. E certamente levará. Mesmo assim, o jovem ditador pode entrar para a história como o líder que exterminou não apenas seus opositores, mas também a fome e a miséria de seu povo. Nos resta esperar.

 

*João Alfredo Lopes Nyegray, doutorando em Estratégia, é mestre em Internacionalização, advogado e formado em Relações Internacionais. É professor dos cursos de Relações Internacionais, Comércio Exterior, Administração e Economia da Universidade Positivo (UP).

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