Ainda que represente um avanço nos direitos das mulheres, o projeto não atende as reais necessidades das famílias de bebês prematuros
No dia 27/03, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei que prorroga o início da licença-maternidade quando, após o parto, a mãe ou a criança permanecer internada por mais de três dias. O projeto será enviado ao Senado. Caso seja aprovado, a contagem do tempo do benefício só terá início após a alta hospitalar de um dos dois. De acordo com a proposta, a licença poderá ser suspensa, a pedido exclusivo da mãe, caso o recém-nascido permaneça internado após transcorridos, pelo menos, 15 dias de seu gozo. O pagamento do salário-maternidade, de acordo com o projeto, acompanhará a suspensão da licença e será retomado quando a criança sair do hospital, e a licença voltar a ser gozada. Caso o Senado aprove a proposta, a matéria vai para sanção do presidente da República, Jair Bolsonaro, e o direito à licença ficará assegurado.
De acordo Denise Suguitani, fundadora e diretora executiva da ONG Prematuridade.com, “é um direito das famílias de prematuros que a licença-maternidade comece a contar no momento da alta do bebê e não a partir do nascimento, e todos saem ganhando com isso: os bebês, as famílias, o setor da Saúde, da Economia, da Educação. Mas se a mãe precisa voltar ao trabalho enquanto o filho está internado, de que maneira ela conseguirá estar presente ao lado do filho no hospital, fazendo o vínculo afetivo, participando dos cuidados e tendo a chance de amamentar?”, explica Denise.
É consenso que, após o nascimento prematuro, a presença constante dos pais na UTI neonatal é imprescindível para a recuperação do bebê. O vínculo materno, a participação nos cuidados diários e o aleitamento ficam prejudicados caso a mãe não possa estar fisicamente por algumas horas perto do seu bebê. Pelo texto do PL 8702, caso decida interromper o período de gozo da licença, a mãe terá que voltar ao trabalho, inviabilizando sua presença ao lado do filho internado.
O ideal, no caso de nascimento prematuro e necessidade de internação na UTI Neonatal, é que a mãe possa estar ao lado do bebê o tempo todo, independentemente do tempo de internação dele, e sem precisar voltar ao trabalho. A licença-maternidade remunerada de 120 (ou 180) dias começaria a contar somente depois que o bebê tivesse alta hospitalar.
Para a Dra. Lilian Sadeck, presidente do Departamento de Neonatologia da Sociedade de Pediatria de São Paulo, a criação do vínculo entre mãe e filho é essencial: “Não é importante só diminuir a mortalidade dessas crianças prematuras, mas sim melhorar a qualidade de vida delas. E para nós melhorarmos a qualidade de vida dessas crianças, nós precisamos que elas tenham um vínculo adequado com a família, pois assim elas terão uma evolução muito melhor. Esses cuidados e esta presença dos pais dentro da UTI neonatal e depois no momento do método canguru, quando poderão ter contato pele a pele com seu bebê, ajudarão muito o trabalho dos profissionais de saúde e a evolução dos seus filhos”.
Até agora, mães de bebês prematuros entravam na Justiça para ter o direito de acompanhar a criança durante a permanência em Unidades de Terapia Intensiva e passar a contar os dias da licença-maternidade no momento da alta. Para tanto, o juiz do caso deve encontrar, dentro da lei, brechas que beneficiem mãe e recém-nascido. Em um dos casos a decisão considerou que os dias que a mãe passou ao lado do filho na UTI neonatal não poderiam ser contados como licença-maternidade, mas, sim, como licença por motivo de doença em pessoa da família.
É o caso de Miqueline De Faveri, mãe de Cristian, hoje com um ano e meio. Ao final da gravidez, o trabalho dela garantiria os quatro meses de licença-maternidade e ela planejou as férias para conseguir mais um mês, totalizando cinco meses considerados suficientes junto a um recém-nascido a termo, ou seja, com 39 semanas.
Mas o Cristian veio ao mundo na trigésima semana de gestação e precisou ficar 91 dias na UTI Neonatal. Ela entrou em contato com uma advogada que viu comentando sobre o assunto na televisão e decidiu recorrer à Justiça. Conseguiu a prorrogação da licença-maternidade por três meses, tempo que o bebê ficou internado.
Segundo Miqueline, a prorrogação conseguida na Justiça “foi fundamental para a sobrevivência do meu filho e pra mim também. Pela necessidade óbvia de amamentação eu ia todos os dias para o hospital pela manhã e só retornava para casa à noite. Enquanto está na UTI, parece que o bebê pertence ao hospital. Por mais humano que seja o tratamento, ele não cria identificação com apenas uma pessoa, com a mãe, como deve ser. Após a alta de um bebê prematuro os cuidados são redobrados, principalmente por conta do risco de infecções.
Para a mãe também é um trauma, ela também precisa se recuperar. “Não dá pra voltar a trabalhar normalmente tendo passado por tudo isso e sabendo que, na verdade o bebê ainda está em formação. Não há nada mais justo que contar os dias da licença só depois que mãe e filho saiam da UTI. Deveria ser automático, sem precisar recorrer à Justiça”, comenta Miqueline.
Para a Associação Brasileira de Pais, Familiares, Amigos e Cuidadores de Bebês Prematuros – ONG Prematuridade.com, o texto original da PEC 181/15 “Extensão de Licença Maternidade em Caso de Nascimento Prematuro”, que tramita em Comissão Especial na Câmara dos Deputados, acolhe de maneira integral as necessidades das famílias de prematuros.