Creio que a maioria dos paranaenses se recorda de que, na última gestão estadual, vinha sendo discutida de forma bastante impositiva a construção de um complexo industrial portuário que seria viabilizado com recursos públicos em Pontal do Paraná, no Litoral do estado. Na ocasião, escrevi que, sim, um novo porto até poderia trazer algum desenvolvimento, mas a um preço altíssimo e irreversível para a qualidade de vida dos moradores do Litoral do Paraná e ao meio ambiente.
Precisamos retomar esse debate tão importante. Relembrando a questão que nos levou a uma grande indignação, vale reforçar que o Litoral do estado nos oferece saídas diversas para o desenvolvimento econômico, por exemplo, por meio do estímulo ao turismo. Após meu primeiro artigo, tantos foram os questionamentos feitos, no sentido do “falar é fácil”, que me sinto na obrigação de mostrar que, havendo interesse, opções muito mais inteligentes e vantajosas provam-se mais viáveis e lucrativas quando há boa vontade do poder público.
Fui surpreendido, esses dias, pela notícia de um anteprojeto elaborado por entidades que integram a campanha #SalveAIlhaDoMel, que prevê diversas soluções pensadas para melhorar o fluxo de veículos e o trânsito de pessoas na região. A proposta foi desenvolvida por engenheiros e arquitetos especializados e custeada com recursos provenientes de uma campanha de financiamento coletivo apoiada pela sociedade. Representou a prova de que, com um pouco de disposição para o diálogo e busca por caminhos alternativos, conseguimos chegar a soluções que beneficiem a vida, a proteção e conservação da natureza, o respeito a comunidades indígenas e tradicionais e o estímulo expressivo ao desenvolvimento econômico limpo.
Entre 2017 e 2018, o Paraná ficou em quarto lugar no número de empregos em hospedagem no Brasil, segundo a Organização Mundial de Turismo. Enquanto o turismo cresce de 3% a 6%, o ecoturismo cresce cerca de 20% ao ano segundo a mesma entidade. Com esses dados em mãos – e a necessidade de desenvolver a região –, vem a pergunta: qual o melhor caminho para alterar a história do Litoral do Paraná, que tem hoje uma infraestrutura absolutamente ainda precária, principalmente quando falamos em transporte e condições de vida das pessoas?
O transporte, posso afirmar com certeza, é um fator de desenvolvimento econômico para uma região, que melhora a infraestrutura. O desenvolvimento econômico que chega na sequência é só questão de tempo. Com isso, o leitor deve questionar: mas, então, a gestão Beto Richa estava certa em apoiar uma proposta que rasgaria um dos últimos trechos de Mata Atlântica bem preservada do Brasil e do mundo para facilitar a instalação de um novo porto na região?
A resposta é um categórico “não”! E afirmo isso porque o Litoral do Paraná é um local com um potencial gigantesco para o turismo. Um dos maiores do Brasil. E o turismo é capaz de gerar muito mais receita, riqueza e qualidade de vida para a comunidade em comparação com um projeto que ameaça diretamente todo esse potencial e compromete a qualidade de vida.
O projeto alternativo proposto à nova gestão estadual prevê, entre outras soluções, um anel viário de Praia de Leste para Canoas, e a municipalização do trecho atual da PR-412, passando pela criação da faixa reversível de Canoas a Shangri-Lá. Quem conhece a região e teve acesso ao projeto consegue, de pronto, entender que essas soluções, além de minimizarem o alto índice de acidentes na região, tornam o trânsito mais racional e, consequentemente, mais agradável e propício para receber turistas.
Se analisarmos a ideia com o mínimo de visão crítica, veremos que ela prevê algo além da melhoria do acesso a essa região. A questão envolve a possibilidade de proporcionar o estímulo a novos negócios e a geração de empregos com qualidade muito superior à proposta tão apoiada pela gestão anterior.
O transporte é fator indispensável para o desenvolvimento econômico de uma região. Isso já deveria ser um motivo para enxergarmos esse projeto com respeito. Mas ele vai além ao criar uma infraestrutura que favorece a exploração do turismo e altera o futuro de uma região por completo.
Por fim, registro aqui meus sinceros votos de que o poder público finalmente entenda que o turismo, para esse local em especial, trará muito mais desenvolvimento econômico e qualidade de vida que uma estrutura para atender uma área portuária que promete beneficiar poucos em detrimento de muitos, e condenar irreversivelmente o patrimônio humano, natural e cultural do Litoral do Paraná.
*Glavio Leal Paura, especialista em trânsito, logística de estrada e planejamento de cidades e professor de Engenharia da Universidade Positivo.