Saber é poder

Antonio Djalma Braga Junior*

Com a expressão a “Força do Saber” no samba enredo, a Águia de Ouro foi a grande campeã do Carnaval 2020 de São Paulo e trouxe para o sambódromo uma série de referências históricas e filosóficas sobre o conhecimento humano, digna de análise por parte de toda a população brasileira.

A frase “Saber é Poder” foi atribuída inicialmente a Francis Bacon, um dos maiores pensadores e influenciadores da Revolução Científica Moderna. Ele queria demonstrar que se nós tivermos conhecimento sobre o mundo, teremos poder sobre ele. Essa ideia é fruto daquilo que ficou conhecido como Razão Iluminista e demonstra que o conhecimento adquirido por meio da ciência é uma forma de controlar a natureza e os homens, fazendo-os reagir a condições artificiais criadas pelos sujeitos do conhecimento (os laboratórios são os exemplos mais paradigmáticos para ilustrar isso).

Ao conhecermos o modo de funcionamento de uma bactéria, criaremos mecanismos para diminuir o impacto negativo delas no indivíduo; se conhecermos como funciona nossos órgãos, conseguiremos criar tecnologias para suprir possíveis falhas neles; se soubermos como as sociedades se comportam, poderemos agir sobre elas e criar condições de vida diferentes. E essa lógica de pensamento (saber é poder) pode ser aplicada a qualquer dimensão da vida humana e social (na economia, na política, na medicina, na educação, etc).

Em suma, essa era a crença dos pensadores modernos que assistiam às inúmeras transformações promovidas pelo conhecimento (sobretudo o científico) na Idade Moderna e que influenciou uma série de transformações e revoluções nos séculos seguintes e que continuam influenciando o nosso tempo atual.

O fato é que o saber possui uma força incrível e que pode ser orientada para fins diversos, alguns com características inclusivas e humanas, outras ignorando esse aspecto. A escola de samba Águia de Ouro não ignorou esse viés humano e inclusivo e conseguiu retratar isso de maneira bela e artística, fazendo duras críticas ao processo evolutivo do conhecimento, da idade da pedra aos robôs, sem deixar de ressaltar o lado otimista que esse pode e deve representar para a humanidade, o que lhe rendeu o título de 2020 de maneira merecida.

Com muita perspicácia e criatividade, a “Força do Saber” ganhou vida no voo que a Águia fez sobre a história, demonstrando de maneira brilhante como o Saber traz um grande Poder, capaz de recriar vida e brincar de Deus, e/ou até mesmo de destruir cidades (Hiroshima e Nagasaki), gerar dor, e produzir uma série de exclusões sociais.

Assim, ficou claro que todo e qualquer conhecimento produzido pelo ser humano não pode prescindir de sua característica fundamental: a de que ele existe pelo e para o humano. Se conseguirmos educar as nossas sociedades sem perder isso de vista, certamente veremos a força do saber transformando positivamente a vida de todos os seres vivos (inclusive os não humanos), como deixou claro o exemplo emblemático da figura de Paulo Freire em um dos carros alegóricos da campeã, que defende sempre uma busca pelo conhecimento (educação) com amor e, assim, ser capaz de ousar tornar os seres humanos cada vez mais eles mesmos: sujeitos dotados do poder do saber.

*Antonio Djalma Braga Junior, filósofo e historiador. Doutor pela UFPR. Professor, palestrante, escritor, consultor e coordenador do curso de licenciatura em História e do curso de pós-graduação Lato Sensu “Leadership and Self-knowledge Program” da Universidade Positivo.

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