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O adiamento do Enem e a luta de todos para todos

Angela Biscouto e Vanessa Zanoncini*

O Enem é elaborado pelo Ministério da Educação desde 1998. Nesses 22 anos, o exame mostra um caráter democrático e inclusivo. Uma ferramenta do Estado para levar um mínimo de equidade às oportunidades dos estudantes brasileiros, independentemente se oriundos de escolas públicas ou privadas.

O Enem é o segundo maior exame do mundo em número de participantes. Apenas em 2020, em meio a todas as dificuldades geradas pela pandemia do novo coronavírus, foram mais de 5,5 milhões de inscrições realizadas, segundo o MEC. Logo, com um objetivo de existência tão honroso, utilizá-lo em um momento de crise como reforço de diferenças e desigualdade seria manchar a história de um exame que se desenvolve a cada ano e é exemplo internacional de boas medidas educacionais.

Após muita pressão, o governo toma a decisão correta ao adiar a prova. Não podemos dizer que as aulas continuam normalmente durante o isolamento social, quando mais de 30% da população não tem acesso à internet. Grande parte dos brasileiros não têm sequer acesso ao saneamento básico, quem dirá aparelhos eletrônicos para acessar conteúdos e manter os estudos em dia. E aqui nem entramos na esfera das dificuldades que surgem ao longo da pandemia, como o aumento do abuso doméstico, a fome, a necessidade de auxiliar em casa e, cada vez mais frequente, o luto de um ente querido perdido para a doença.

Mais de 16 países com Exames Nacionais adiaram as datas de realização, reconhecendo que as propostas de atividades não presenciais deixam de alcançar parcela significativa dos alunos, aumentando as desigualdades de oportunidade àqueles que têm pouco ou quase nenhum acesso às tecnologias digitais. A decisão, aprovada pelo Inep, também denota reconhecimento e preocupação com o quadro de precariedade e desigualdade presente em nosso país. Sabe-se que este adiamento não é a solução dos problemas educacionais brasileiros, entretanto,  auxilia na luta pela equidade de acesso aos serviços educacionais e oportunidades de ingresso ao Ensino Superior.

Agora, inúmeras são as ações que ainda precisam ser tomadas e as políticas públicas definidas e executadas para que os alunos da Educação Básica possam contar verdadeiramente com o direito à Educação. O Inep promove, em junho, uma enquete direcionada aos inscritos do Enem 2020, para definição da nova data do exame. A enquete é on-line, apenas com os inscritos, e, segundo o ministro Abraham Weintraub, sem a interferência de órgãos de classe. Porém, com tamanha limitação, quem assegura que as vozes dos menos favorecidos serão ouvidas? Além de um prazo, ainda incalculável, para a realização segura das provas, é necessário também pensar na situação dos já universitários que terão seu ano letivo atrasado, gerando consequências no calendário dos ingressantes do próximo ano.

Alunos, educadores e demais envolvidos recebem o anúncio do adiamento como um sopro de força e esperança na eterna e importante luta de equidade ao acesso à Educação de qualidade, mas essa luta ainda não acabou e precisamos estar próximos e atentos às próximas medidas que envolvam todos, não só alguns.

 

*Angela Biscouto, consultora pedagógica do Sistema de Ensino Aprende Brasil, e Vanessa Zanoncini, supervisora pedagógica do Sistema de Ensino Aprende Brasil.

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