sábado, 22 fevereiro 2025
21.3 C
Curitiba

Fome e educação

Por Wanda Camargo*

As pessoas que pedem ajuda nos cruzamentos de trânsito adotaram ultimamente uma nova forma de transpor a muralha de indiferença dos vidros de carro fechados; a “dura poesia concreta” de nossas esquinas se garatuja em pedaços de papelão improvisados:

_estou desempregado;

_tenho três filhos;

_preciso de auxílio;

E, terrível na clareza:

_Fome.

Em algum momento passamos a fechar nossos carros, nossas casas, nossas vidas, a qualquer contato de estranhos. É verdade que isso é justificável em um país que não provê subsistência digna a grande parte de sua população gerando criminalidade, e no qual a violência virou regra, mas é lamentável que tenha precisado se tornar hábito. Em tempos melhores os vendedores de bugigangas, de água, de flores, e os simples pedintes, tinham acesso a nossos ouvidos, podiam “vender seu peixe” restando-nos o direito de compra-lo ou não. Agora, circulamos em aquários com ar refrigerado e não ouvimos nada do que está fora deles, nem pedidos de socorro de pessoas que não tem nem o que comer.

Sob qualquer ponto de vista, a sociedade brasileira atual mostra-se bipolar: ao lado de uma economia que bem ou mal sobrevive, e em alguns setores até prospera apesar da pandemia, existem milhões de pessoas excluídas de qualquer benefício, assim como dos serviços devidos pelo governo aos seus cidadãos.

Com a miséria e a exclusão cresce o ressentimento, pessoas que não tem nada, nem como alimentar seus filhos, não entendem com facilidade conceitos como “meritocracia” pela qual a cada um será dado de acordo com seus méritos. Há uma questão basilar de condição de partida a ser considerada, quem nasceu em berço paupérrimo, sem acesso a saúde, alimentação minimamente nutritiva, respeito próprio, e até convívio social e familiar que geraria a chamada base cultural mínima, perceptível principalmente no momento de pleitear um trabalho, não está mesmo em posição de desenvolver grande “mérito” na vida profissional.

Acesso à cultura acumulada pelo seu próprio povo, conhecimento da trajetória de seus conterrâneos, suas lutas, reivindicações, formas de lazer, músicas e formas de expressão inclui a educação.

Como consequência do processo de exclusão, pelo qual pessoas que antes eram incluídas foram expulsas e marginalizadas, não apenas pela crise da pandemia mas também por processos de mudança social, econômica ou política que precipitaram a falta de acesso a emprego, renda e benefícios do desenvolvimento econômico, a boa educação ficou, cada vez mais, restrita a determinados segmentos da sociedade, o que pode redundar em implicações políticas e sociais catastróficas. É difícil acreditar num processo de democratização social, de desenvolvimento cultural e financeiro numa sociedade exposta aos efeitos da ausência de um bom processo educativo, pois ela estará mais sujeita à violência, às revoltas, às competições desenfreadas.

Empresas não tem como prosperar sem bons colaboradores em todos os níveis, preparados pelas escolas para um bom desempenho não apenas técnico, mas também de inter-relacionamentos.

Um bom sistema educacional complementa as orientações familiares, ensinando convivência e normas de civilidade no mundo do trabalho, prepara para a inovação e o empreendedorismo, para a competição saudável e discernimento sobre igualdade de oportunidades.

Infelizmente, grande parte do nosso poder público se ausenta de questões tão simples e básicas como a miséria de grande parte dos cidadãos; auxílios de emergência, bolsas diversas, até mesmo cotas, trazem apenas um ligeiro alívio na catástrofe social. Talvez seja o momento de abrir os vidros, com tudo o que representa de risco, o perigo de não fazer isso pode ser muito maior.

 

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.

Destaque da Semana

“Histórias: Show do Século” anuncia data em Curitiba com grandes nomes do sertanejo

Festival acontece no dia 1º de novembro na Ligga...

Beer & Beef, edição St. Patrick´s Day, acontece de 20 a 23 de março no Catuaí

Evento reúne o melhor da gastronomia local, com chope...

Com impacto emocional, alopecia areata ganha novas opções de tratamento

Sociedade Brasileira de Dermatologia divulgou recomendações atualizadas para aprimorar...

Artigos Relacionados

Destaque do Editor

Popular Categories

Mais artigos do autor