Desde outubro de 2020, um projeto de pesquisa multicêntrico coordenado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) tem realizado exames em animais de estimação de tutores que testaram positivo para o novo coronavírus. O estudo, que abrange seis capitais brasileiras, testou até agora 111 animais. Desses, 15 apresentaram resultado positivo para a presença do vírus SARS-CoV-2, o que representa 13,5%.
O balanço parcial, feito no início de março de 2021, aponta que Curitiba testou 31 animais. A presença do vírus causador da pandemia foi detectada em quatro cães e em um gato. Na cidade de São Paulo, foram coletadas amostras de 22 animais, das quais dez estavam contaminadas: nove de cães e uma de gato.
Cuiabá testou 13 cães e quatro gatos. Desses, apenas um gato testou positivo para o vírus. Em Campo Grande, foram feitos testes em 16 pets. Entre eles, foram detectados três cães e dois gatos infectados. Em Belo Horizonte, dos nove cães testados, dois tiveram resultado positivo e em Recife, das oito amostras coletadas, duas de felinos estão contaminadas. No relatório ainda consta outras cinco amostras armazenadas para envio e três coletas agendadas na capital pernambucana.
O objetivo do estudo é avaliar, ao todo, cerca de mil animais domésticos para identificar a suscetibilidade e o papel de cães e gatos como reservatórios do vírus. Os pesquisadores destacam que, até o momento, não há indícios de que os pets transmitam o vírus para humanos. Os casos conhecidos revelam o contrário: foram os tutores infectados que contaminaram seus animais. Também não há confirmação de que cães possam desenvolver a doença causada pelo coronavírus, a Covid-19. Entretanto, gatos são mais vulneráveis à enfermidade.
Casos recentes
No final de março, circulou a notícia de que uma gata de Caxias do Sul infectada com o coronavírus não resistiu a complicações relacionadas à doença e faleceu. Sobre esse caso específico, o consultor científico internacional do projeto da UFPR e diretor do Hospital Veterinário da Universidade do Estado do Oregon, professor Helio Silva Autran de Morais, explica que não há como ter certeza se o óbito aconteceu em decorrência da doença, pois não foi realizada a necropsia do animal.
“É sabido que gatos podem, em episódios raros, desenvolver sinais clínicos respiratórios e gastrointestinais. Porém, é muito difícil saber se os sinais clínicos compatíveis com a Covid-19 de um felino positivo para o vírus são mesmo em decorrência da doença ou são devido a outras causas. A probabilidade maior é que isso ocorra por outros motivos e não pela Covid-19”, afirma Morais.
Um estudo preliminar realizado por pesquisadores britânicos tem relacionado a miocardite, inflamação grave no coração, a cães com testes positivos para a presença da variante B.1.1.7 do novo coronavírus. A respeito desse tema, o veterinário comenta que são necessários mais dados, porém a possibilidade de que essa variante desenvolva miocardite em alguns animais deve ser considerada.
“É interessante que seis, de 11 animais com miocardite estudados, tinham evidência direta (PCR) ou indireta (sorologia) de SARS-CoV-2. Mesmo com todas as limitações ainda existentes, devemos incluir o vírus na lista de diferenciais para miocardite até que saibamos mais a respeito”, adverte. Sobre a variante britânica ser mais infecciosa para cães e gatos, como acontece com os humanos, ainda não há resultados comprobatórios.
Outros animais
Além de cães e gatos, outros animais podem ser contaminados com o novo coronavírus. A Organização Mundial da Saúde Animal (OIE) já identificou infecções em furões, gorilas, tigres, leões, leopardos, pumas e visons e considera que todas essas espécies, além das duas primeiras, são sensíveis e podem desenvolver sinais clínicos da doença (Covid-19). Para Morais, há a necessidade de mais dados sobre o assunto para poder confirmar essa afirmação sobre cães. “Com certeza existem cães infectados com o vírus que apresentam sinais. Ainda assim, pode ser só coincidência, já que animais com sinais clínicos têm mais chance de serem testados”.
Já a alta suscetibilidade ao desenvolvimento da doença em furões, visons, grandes felinos, gatos e gorilas está consolidada. Contudo, apenas no caso dos visons infectados é que houve confirmação da transmissão do vírus de animal para pessoa, em episódios ocorridos na Holanda e na Dinamarca.
“Vale lembrar que esses dados são relativos às variantes originais. Ninguém sabe se as novas cepas têm maior poder de infectar ou de serem mais patogênicas em qualquer dessas espécies animais. Parece que a B.1.1.7 é capaz de infectar, experimentalmente, camundongos. Isso seria interessante porque eles eram resistentes à variante original”, revela o professor.
Recomendações
Os especialistas reafirmam que não há evidências de que cães e gatos transmitam o vírus para humanos mesmo por meio do pelo ou da pele. Por isso, não há a necessidade de medidas adicionais de prevenção com esses animais, além de lavar as mãos após cada interação. “A carga viral expelida pela maioria dos bichos de estimação é baixa, o que diminui o risco de infecção. Assim, cães e gatos não têm papel na epidemiologia da doença em pessoas”, informa o médico veterinário.
Porém, alguns pets podem sim serem infectados com o SARS-CoV-2 e isso normalmente acontece quando o tutor está doente e transmite o vírus ao animal. “Pessoas com Covid-19 devem evitar beijar, dormir, deixar-se lamber ou qualquer outra forma de contato próxima com os cães e gatos durante o período da doença”, orienta Morais. O ideal é que outro morador da residência assuma os cuidados com os animais ou, caso não seja possível, que o doente utilize máscara e lave as mãos sempre antes e depois de interagir com os bichos.
Para diminuir o risco de contágio, o veterinário ainda aconselha a tratar cães e gatos como outros membros da família. “É importante manter o distanciamento social e limitar a interação deles com pessoas de fora da residência. Gatos não devem sair para a rua e cães só podem sair na coleira, mantendo a distância de dois metros das pessoas”, conclui.
Fonte: UFPR