Sequelas de ordem cognitiva foram observadas até mesmo em pessoas assintomáticas; além de alterações na memória, também podem ocorrer lentidão de raciocínio e dificuldade de atenção
Um levantamento realizado no começo deste ano pelo Instituto do Coração (InCor) apontou que 80% dos pacientes recuperados de COVID-19 apresentaram sequelas de ordem cognitiva, como perda de memória, lentidão de raciocínio e dificuldade de atenção e de concentração.
“A dificuldade ocorre mais comumente para memórias recentes. Como o que a pessoa vai buscar, o que vai falar, o que vai fazer”, exemplifica a Dra. Renata Ramina, neurologista do Pilar Hospital. “Ocorrem efeitos cognitivos na memória, atenção e funções executivas que podem levar a dificuldades no gerenciamento de medicamentos, administração de finanças, compreensão de materiais escritos e até mesmo conversas com amigos e familiares”, comenta.
A médica aponta que existem pelo menos quatro mecanismos patogênicos possíveis que podem ser responsáveis pelo efeito prejudicial de COVID-19 no Sistema Nervoso Central: encefalite viral direta (processo inflamatório agudo do cérebro), inflamação sistêmica, disfunção de órgão periférico como o fígado, rim ou pulmão e alterações cerebrovasculares.
Com a infecção por COVID-19 pode haver comprometimento persistente na atenção sustentada como a habilidade de prestar atenção a informações importantes. “Em pacientes que apresentaram doença grave com internamento em UTI, é altamente provável que ocorram danos cerebrais como confusão mental e até mesmo aumentar risco para doenças neurodegenerativas, como a doença de Alzheimer. Também existe o risco dos efeitos psicológicos de longo prazo comumente observados na permanência na UTI como ansiedade, depressão e TEPT, o transtorno de estresse pós-traumático”, relata.
Em relação à idade e gênero, a doença tem se mostrado mais grave em homens quando comparados a mulheres. Quanto à idade, Dra. Renata alerta sobre AVCs causados por COVID. “Devemos ficar alerta para esses eventos, felizmente são raros”, alerta.
A perda de memória foi constatada também em pacientes assintomáticos. “Existe um estudo que demonstrou que pode haver alteração na memória episódica (experiência pessoais), atenção e dificuldades na concentração que não foram associadas à fadiga, depressão, hospitalização, tratamento, viremia (presença de vírus no sangue) ou inflamação aguda. Esses dados iniciais indicam que mudanças cognitivas podem ocorrer mesmo após infecções mais leves”, alerta a médica.
Mesmo após a manifestação de sequelas pós-COVID de ordem cognitiva, pode-se retomar as atividades do dia a dia sem dificuldade, mesmo que ocorram alguns déficits de atenção. “Há várias pessoas que podem ter dificuldades mesmo mais tarde. Será necessário um trabalho futuro para rastrear os mecanismos e prevalência do ‘COVID cognitivo’ de longo prazo”, explica. No Pilar Hospital é possível realizar um acompanhamento ambulatorial no serviço de neurologia.