Por Miguel Milano*
O Dia de Proteรงรฃo ร s Florestas, comemorado em 17 de julho, nos provoca ร reflexรฃo e nem tanto ร celebraรงรฃo. A superfรญcie emersa do nosso planeta, o รบnico que temos para habitar, รฉ de aproximadamente 15 bilhรตes de hectares, dos quais a metade (cerca de 7,5 bilhรตes de hectares) jรก foi floresta, total que hoje estรก reduzido a cerca de 5,5 bilhรตes de hectares.
Resultado do contรญnuo e por muito tempo explosivo crescimento da populaรงรฃo humana, suas migraรงรตes e colonizaรงรตes com conquistas interminรกveis de territรณrios, essa perda de estimados 2 bilhรตes de hectares de florestas corresponde a mais que a soma de todos os paรญses das Amรฉricas do Sul e Central. Ou quase a Amรฉrica do Norte inteira, com Canadรก, Estados Unidos e Mรฉxico, lembrando que os dois primeiros estรฃo entre os cinco maiores paรญses do mundo.ย
Dos estimados 5,5 bilhรตes de hectares remanescentes, pelo menos 1,5 bilhรฃo estรฃo bastante degradados em sua estrutura e composiรงรฃo, nรฃo cumprindo muito das suas funรงรตes ecolรณgicas essenciais ร saรบde do planeta. Esta situaรงรฃo, que por si sรณ jรก nรฃo รฉ boa, torna-se pior quando vemos que a destruiรงรฃo segue desenfreada, e nosso paรญs รฉ um ponto de atenรงรฃo mundial nesse triste e altamente preocupante assunto.
Temos, obviamente, muitos componentes associados ao problema do desmatamento e da degradaรงรฃo das florestas aqui no Brasil e no mundo todo onde elas existem. Trata-se, portanto, de problemas complexos, para os quais nรฃo existem soluรงรตes simples.
Todavia, posso destacar que entre nossos mais urgentes e difรญceis desafios estรฃo a falta de qualidade da nossa educaรงรฃo e as graves imperfeiรงรตes do nosso sistema polรญtico, com sua falha representatividade quanto aos interesses nacionais, no qual impera a super representatividade corporativa setorial.
No fundo, seguimos como uma colรดnia com capitanias hereditรกrias hoje substituรญdas por outros interesses, mas que ainda buscam a conquista do territรณrio a qualquer custo, o que inclui a destruiรงรฃo ambiental, o genocรญdio indรญgena e a manutenรงรฃo do trabalho escravo ou equivalente, num cรญrculo vicioso que sistematicamente agrava a questรฃo. Nรฃo hรก dรบvidas de que, alรฉm de complexos, sรฃo gigantescos os desafios a vencer!
ร inacreditรกvel seguirmos agindo hoje em dia, com as informaรงรตes cientรญficas disponรญveis, como se estivรฉssemos na primeira metade do sรฉculo passado. Mas รฉ isso o que acontece por aqui em termos ambientais e florestais. Mas nรฃo sรณ. Lembre o que temos presenciado de negacionismo explรญcito durante a trรกgica pandemia que enfrentamos. Se nem com vida humana as lideranรงas polรญticas estรฃo preocupadas, o que esperar delas para plantas e bichos?ย
A esperanรงa repousa, portanto, nas novas geraรงรตes. Precisamos superar o negacionismo, nos apoiar na ciรชncia โ na boa ciรชncia e nos bons cientistas, porque hรก os charlatรตes. Mas deve-se ressaltar tambรฉm que, apesar do impressionante volume de informaรงรตes de qualidade atualmente disponรญvel, renovado e aprofundado diariamente, a deficiente formaรงรฃo educacional combinada com a mentalidade arcaica dominante entre as lideranรงas dos poderes da repรบblica โ notadamente nos diferentes nรญveis do Executivo e do Legislativo, mas tambรฉm no Judiciรกrio โ nรฃo permitem o seu devido e adequado uso no enfrentamento dos problemas nacionais.
A sociedade, grosso modo, jรก estรก mais sensรญvel ao problema que a classe polรญtica que a representa. Assim, enquanto essa situaรงรฃo nรฃo muda, necessitamos unir forรงas entre os conscientes do problema para conscientizar mais e mais pessoas de diferentes classes e setores para o desafio de salvar as florestas que ainda restam e com elas restaurar muito do que perdemos. Afinal, a floresta รฉ vida e sem floresta nรฃo hรก espaรงo para as sociedades humanas florescerem.
*Miguel Milano รฉ doutor em Ciรชncias Florestais e membro da Rede de Especialistas em Conservaรงรฃo da Natureza (RECN) luciano.fontes@tamer.com.br