Desde 1º de agosto, legislação permite punir quem descumpre regras de gerenciamento de informações pessoais
Dos 27 tribunais de justiça do país, 48% ainda não conseguiram se adequar às regras previstas na Lei Geral de Proteção de Dados – a LGPD. A conclusão é resultado de uma pesquisa acadêmica do mestrado em Direito da Universidade Positivo (UP). O estudo mapeou as ações adotadas por parcela importante do Poder Judiciário, no cumprimento das regras que são conhecidas desde 2018. Se por um lado há avanços relevantes, por outro, as pendências ainda são muitas.
Em janeiro deste ano, o CNJ editou uma resolução com o objetivo de uniformizar as ações de aplicação da LGPD no Poder Judiciário de todo o país. Dos 27 tribunais de justiça de competência estadual (26 estados e DF), apenas 14 criaram um comitê especial gestor para implementar as novas regras, como determina o órgão.
Apesar da baixa aderência, o coordenador da pesquisa e pesquisador do mestrado em Direito da UP, Gabriel Schulman, afirma que os números revelam um processo natural de adequação às leis no país. “Alguns tribunais estão mais atrasados, mas, de maneira geral, depois que os primeiros se adequarem, fica mais fácil para os seguintes seguirem estratégias, pois não é um processo simples”.
A ex-conselheira do CNJ e co-coordenadora da pesquisa, Maria Tereza Uille Gomes, concorda com a análise. “Estamos em um período de adaptação, e sempre que é publicada uma lei nova, esse processo é esperado. Quando se fala em Poder Judiciário, são 92 tribunais no país e cada um tem o seu tempo de resposta a uma nova lei, considerando a própria realidade”, avalia.
Em 1º de agosto entraram em vigor as últimas disposições da LGPD. Todas são voltadas à possibilidade de aplicar sanções a entidades do poder público, ou ao setor privado, flagrados em desrespeito às regras de gerenciamento de informações pessoais de terceiros. Para Schulman, o ritmo dos tribunais na implementação das novas regras acompanha a dinâmica observada nas empresas. “A velocidade é semelhante. Mas observamos um desafio a mais para os tribunais, pois eles têm uma normativa própria e o desafio de harmonizar proteção de dados com a publicidade dos atos públicos”, considera.
Um estudo divulgado em agosto pela Fundação Dom Cabral (FDC) dá suporte a esse entendimento ao revelar que 40% das empresas não estão prontas para cumprir com as exigências que constam na LGPD. A Lei Geral de Proteção de Dados estabelece a forma de tratamento de informações pessoais por empresas e entidades do Poder Público. A legislação é baseada no respeito a princípios democráticos como a privacidade, a liberdade de expressão, de opinião e de informação. A norma veda o uso dos dados particulares sem o consentimento expresso do cidadão, sob pena da aplicação de sanções.
Mais números
O relatório da Universidade Positivo aponta, ainda, que 52% dos tribunais de justiça do país ainda não designaram um encarregado para o tratamento de dados pessoais, exigência legal reforçada na normativa do CNJ. Para Schulman, além de uma exigência da LGPD, o cargo é de fundamental importância. “É o profissional que tem a função de receber as reclamações do público, responder às solicitações da Autoridade Nacional de Proteção de Dados e, muitas vezes, termina por coordenar as atividades relacionadas à LGPD”.
Na metade dos tribunais em que houve a designação do encarregado para o tratamento de dados pessoais, um desembargador foi escolhido para realizar a tarefa. Para Maria Tereza, por se tratar de um cargo de gestão, “é positivo que o trabalho seja realizado por um desembargador, que conhece as rotinas do Poder Judiciário e tem maior capacidade de interlocução com servidores das áreas jurídicas e de TI”, complementa.
Transparência
Outro dado revelado pela pesquisa é que em 77% dos tribunais estaduais foi disponibilizado um canal de ouvidoria para que o titular dos dados pessoais possa reclamar pela sua exclusão. Para Maria Tereza, “esse dado revela um Poder Judiciário receptivo à população e transparente na condução de suas atividades”.
A pesquisa
Nesta fase da pesquisa, realizada entre os meses de abril e maio, os pesquisadores acessaram os sites dos 27 tribunais estaduais do país para a coleta e compilação dos dados. Os resultados foram transformados em gráficos analíticos, que permitem a análise de um panorama geral da implementação da LGPD nos tribunais estaduais.
Segundo Schulman, a pesquisa adere aos objetivos do Programa de Pós-Graduação da Universidade, que tem preferência por métodos de pesquisa jurídica empíricos, com ênfase na inovação tecnológica. A pesquisa prossegue para compreender as estratégias adotadas pelos Tribunais e compreender as dificuldades.
O estudo integra o Plano de Desenvolvimento Institucional da UP, construído a partir do conceito de Educação para o Desenvolvimento Sustentável (EDS), cujo objetivo é de “promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, além de proporcionar o acesso à Justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis”, aponta o documento. CentralPress