Novo Ensino Médio: otimismo, mas sem ignorar os desafios

Por Jacir Venturi*

O Novo Ensino Médio – com implantação gradativa a partir de 2022 – representa um facho de luz sobre a maior mazela da educação brasileira. Há, sim, motivos para um elevado otimismo. Por mais de três décadas, por meio de artigos, em jornais e revistas, bem como em palestras, fui um crítico contundente do modelo vigente até 2021. Com 13 componentes curriculares, em geral desconectados do interesse da maioria dos estudantes, o Ensino Médio era uma jabuticaba muito nossa, que empurrávamos goela abaixo dos jovens estudantes.

Quer para o ingresso do discente em uma boa universidade, quer para uma preparação técnica e profissional, no Novo Ensino Médio serão ofertados conteúdos mais relevantes, motivadores e consentâneos com os tempos atuais. Ademais, haverá uma ampliação da carga horária de 800h para 1.000h em cada série, sendo Matemática e Português contemplados obrigatoriamente ao longo dos três anos, uma vez que desenvolvem no aluno raciocínio lógico, boa escrita e oralidade, habilidades em evidência em nossa aldeia global – daí também a justificativa da inclusão do Inglês como componente curricular compulsório, porém não necessariamente em todas as séries.  

As habilidades e competências socioemocionais (sendo o Projeto de Vida um importante representante) passarão a ser muito mais estimuladas, fazendo parte de uma matriz curricular com 60% do tempo (de um total de 3.000h) dedicados à Formação Geral Básica (FGB), comum a todos, e 40% dedicados a cinco Itinerários Formativos (IF), podendo o aluno optar entre Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Sociais ou Formação Técnica e Profissional.  

O IF de Formação Técnica e Profissional, em especial, tem a sedução do ingresso mais rápido no mercado de trabalho ou mesmo de melhorar a capacitação para uma função laboral já exercida. Necessitamos, sim, de colégios que mantenham um bom preparo para o ingresso em universidades mais concorridas, porém é absolutamente necessária a ênfase aos cursos técnicos, que ao privilegiarem uma aplicação prática atendem a um expressivo contingente de alunos. No Brasil, apenas 10% dos estudantes – dada a oferta limitada – estão matriculados nessa modalidade, enquanto o índice médio é de 40% nos países da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), na qual o Brasil negocia oficialmente o ingresso.  

Ademais, enfim temos uma BNCC (Base Nacional Comum Curricular) aprovada democraticamente após cerca de 8 anos de intensos debates e que no plano teórico mereceu encômios da maioria dos educadores e estudiosos do tema. Mas nós, brasileiros, somos bons em teorizar melhorias de qualidade na educação, porém medianos, quando não ruins, em implementar as medidas pragmáticas e de gestão, com as exceções de praxe. Onde estão os maiores desafios? São três: capacitação de professores, capacitação dos gestores escolares e estímulo de um maior comprometimento dos nossos estudantes. 

Nada é mais relevante para o Novo Ensino Médio que uma boa capacitação de nossos professores, sendo de pouca eficácia quando se restringe à denominada “semana pedagógica” no início de cada semestre ou ano. Ao contrário, deve ser contínua, como em todos os países com bom desempenho nos rankings internacionais. O professor tende a ser mais do que nunca exaltado, porém não mais como um expositor de conteúdos, mas sim transfigurado em mediador, mentor, motivador. Afinal, no século 21, com os avanços das tecnologias educacionais e a informação ao alcance das mãos, a escola deve melhor equilibrar as competências e habilidades cognitivas com as socioemocionais. A maioria dos docentes se sente despreparada para uma boa mediação tecnológica, porém muito apreciaria receber treinamentos na instituição de ensino, indica pesquisa. Essas transformações só se efetivarão se as escolas forem providas de boa conectividade, um dever de nossos governantes ou mantenedores.

Igualmente, deve-se aprimorar a capacitação dos gestores escolares. Além disso, é preciso rever os excessivos e deletérios controles e trâmites burocráticos, pragas do Estado brasileiro nos três entes federados, pois absorvem um precioso tempo dos gestores da escola no cumprimento de exigências legais.  São uma praga, sim, pois um bom diretor pode dedicar-se ao aprimoramento da rotina pedagógica e administrativa na sua instituição de ensino, mas é indefenso à cartorial e desproporcional burocracia.  

Ao fim e ao cabo, é preponderante que se afirme que, com o Novo Ensino Médio, há boas perspectivas de termos alunos mais motivados e com suas potencialidades mais bem desenvolvidas, contribuindo não só para o futuro do próprio egresso, mas também do nosso país. Conquanto tenhamos nas últimas décadas um Ensino Médio em patamar ignominioso (comprova-se pelos resultados do IDEB e mensurações internacionais como o Pisa), de quem foi a responsabilidade por essa quase tragédia nacional? Do governo, dos pais, dos professores? Em parte, sim. Mas também de uma parcela de nossos jovens e adolescentes, hedonista e acomodada, na qual a 1ª lei a ser revogada é a que impera: a do mínimo esforço. Em um mundo competitivo, não há como obter conquistas sem uma intensa disposição, comprometimento e disciplina para o trabalho e para os estudos.  

Jacir J. Venturi, professor e diretor de escolas públicas e privadas, vice-presidente do Conselho Estadual de Educação do Paraná, foi professor e/ou gestor da UFPR, PUCPR e Universidade Positivo. É autor do livro Da Sabedoria Clássica à Popular

 

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