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Maternidade: universos distintos na literatura

Narrativas sensíveis envolvem temas do cotidiano nem sempre abordados
Narrativas sensíveis envolvem temas do cotidiano nem sempre abordados
Maio é considerado o mês das mães e a Editora Maralto – que pertence ao grupo Arco Educação – selecionou três obras em catálogo que tratam, de algum modo, sobre este tema. “As histórias são sobre situações comuns, mas com abordagens distintas, que ajudam o leitor a lançar um olhar mais complexo e por isso empático, sobre as relações familiares e a própria maternidade”, explica a publisher Cristiane Mateus.

Confira as sugestões abaixo:

A rede florida, de Graziela Bozano Hetzel, com ilustrações de Anna Cunha (Editora Maralto, 64 págs., R$ 39,90)

Mais que uma condição, a de ser mãe, com todas as marcas históricas, econômicas, sociais e culturais que a constituem, a maternidade é, antes de tudo, um sentimento coletivo, muitas vezes idealizado e, para muitas mulheres, assustador.

O amor que as mulheres sentem por seus filhos, quase sempre demonstrado em forma de cuidado, existe no imaginário social como algo dado e instantâneo, que pressupõe a anulação das mulheres, de seus sentimentos, angústias e desejos, em favor dos filhos, como se isso fosse uma exigência incontornável. Para além das complexas questões que essa breve reflexão suscita, incluindo a condição feminina em seus aspectos estruturantes em nossa sociedade, é preciso pensar nas muitas formas de ser mãe, considerando as condições existentes para o exercício da maternidade. Ainda que haja um modelo que, entendem alguns, deva ser seguido, é somente em suas existências concretas, dia após dia, que mães e filhos se fazem nessa relação.

O livro ganhou o Prêmio FNLIJ de Ilustração em 2020, e traz a narrativa de maternidades amorosas, que extrapolam o senso comum e acolhem os caminhos de nossa humanidade.

A personagem Maria Rosa é uma adorável menininha que vive uma vida tranquila com seus pais. Como toda criança, frequenta a escola, gosta de brincar, de ler e de ouvir histórias. Mas a data de seu aniversário chega trazendo, junto com a festa, algumas surpresas: recebe da mãe e do pai uma dolorosa notícia, que aos poucos se acomoda em seu coração e se transforma em mais um espaço de afeto.

Como a irmãzinha de sua colega Natália, Maria Rosa descobre que é filha adotiva de seus pais e que essa condição não quer dizer menos amor. A presença da mãe biológica, que se afastou quando a menina ainda era bem pequena, cria novos laços para Maria Rosa e para sua família, sem rupturas ou julgamentos para ninguém.

O delicado texto de Graziela Bozano Hetzel encontra a força poética das ilustrações de Anna Cunha e juntos contam uma história comum na vida de muitas famílias, fazendo dela um convite para pensar sobre maternidade e relações familiares, celebrando os sentimentos que as constituem, para além de discursos obsoletos que cristalizam uma imagem anacrônica das mulheres e atendem a demandas de mercado.

A obra recebeu o selo Altamente Recomendável 2018 da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil, selo Distinção da Cátedra Unesco de Leitura 2018 e está na lista dos 30 Melhores Livros Infantis do Ano 2019 da Revista Crescer.

Graziela Bozano Hetzel recebeu prêmios respeitados como o Jabuti, na categoria Melhor Livro Infantil, e o da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ), na categoria Melhor Livro para Criança. Ganhou o prêmio Alejandro José Cabassa na categoria Infantil e seu nome está na Lista de Honra do International Board on Books for Young People (IBBY).

Anna Cunha ilustrou dezenas de livros publicados no Brasil e no mundo, com títulos selecionados para o Catálogo de Bolonha e premiados pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ). Foi finalista do Prêmio Jabuti, na categoria Ilustração, e recebeu menção honrosa no Prêmio João-de-Barro, na categoria Livro Ilustrado.

Como posso te amar?, de Celso Sisto, com ilustrações de Simone Matias (Editora Maralto, 24 págs., R$ 25,90)

As famílias já não são as mesmas. Essa afirmação, que pode ganhar ares de lamento, não traduz uma reclamação ou algum tipo de saudosismo, mas é a constatação de que há muito tempo a compreensão de que família é formada por um pai, uma mãe e seus filhos não corresponde à realidade. Mas se é recente o reconhecimento da diversidade de composição das famílias, não é novidade que muitas delas não contam com a presença do pai, por motivos diversos.

É bastante comum que as mães – e também as avós, as tias, as irmãs mais velhas – assumam integralmente o cuidado dos filhos e tentem prover suas crianças, material e afetivamente. Mas algumas faltas não podem ser negadas, embora possam ser tratadas com coragem e amor. É uma história como essa que conta o livro Como posso te amar?.

Em uma redação escolar, o menino Caio declara seu amor à mãe e à irmã mais velha, que cuidam dele com muito carinho. Mas a orientação da professora era de que as crianças escrevessem sobre os pais… A partir do texto do menino e de uma conversa com a professora, a mãe passa a perceber, em pequenos gestos cotidianos, a falta que o pequeno sente do pai. Sabendo que não pode preencher essa lacuna, mas certa de que pode fazer com o filho coisas que seriam esperadas do pai, ela se aproxima ainda mais do menino, esforçando-se para que essa ausência não se torne ainda maior e mais sofrida para ele.

Como Caio, são muitas as crianças que não convivem com o pai e que lidam com essa dor, muitas vezes ampliada pela incompreensão dos motivos que a causam. Não sabemos o que aconteceu com o pai de Caio – morte, separação, abandono? –, mas é certo que o livro é um convite aos leitores de todas as idades para refletir sobre as relações familiares e suas muitas possibilidades de afeto, sem a tentação de julgamentos imediatos e superficiais.

Na história contada pelo sensível texto de Celso Sisto e pelas ilustrações de Simone Matias, assistimos aos movimentos amorosos da mãe – ouvir a professora, observar o menino, pensar no assunto, tomar uma decisão – para acolher o filho. E isso já é muito.

Celso Sisto tem mais de 30 livros publicados para crianças e jovens e recebeu o prêmio de Autor e Ilustrador Revelação pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ).

Simone Matias tem dezenas de livros publicados e recebeu o selo Distinção Cátedra 10 Unesco de Leitura PUC-Rio.

O mergulho no espelho, de Ninfa Parreiras, com ilustrações de Marcelo Ribeiro (Editora Maralto, 24 págs., R$ 25,90):

Sempre que pensamos ou falamos em mães, algumas palavras nos vêm imediatamente à cabeça, como amor e proteção. Ambas se fundem na relação com os filhos e se desdobram em uma única: cuidado.

É cuidando e recebendo cuidados, os mais diversos – físicos, afetivos, formativos – que mulheres e crianças constroem sua condição de mães e filhos no cotidiano, em um exercício que se prolonga por toda a vida. Mas são mais recorrentes do que podemos imaginar as situações em que quem deveria cuidar pede cuidados. Porque, distinta da idealização construída em torno das mães por muitos discursos e imagens, a vida comum, essa de todos nós, é feita de pessoas que amam, sonham, se angustiam, adoecem e sofrem.

É essa experiência, de mães que escapam aos padrões previamente estabelecidos não se sabe por quem e demandam a atenção mais habitualmente dedicada aos filhos, que encontramos neste livro.

Uma menina vive com duas irmãs, dois irmãos, o pai e, tempos sim, tempos não, a mãe. Ela não sabe direito o que acontece quando os homens de branco levam a mãe para um lugar que ela também desconhece. Entre silêncios, ausências e pequenas e dolorosas pistas, entremeados pelo aprendizado das letras na escola, a personagem tenta compreender a ausência da mãe, tanto a de quando ela é levada de casa, quanto a que pode ser sentida durante os muitos dias da mulher na cama, sem voz, sem palavras. O mergulho no espelho é uma narrativa sensível sobre questões temidas e muitas vezes tratadas como tabu.

Como é próprio das boas narrativas, o texto deixa lacunas – as mesmas vividas pela protagonista do livro – que podem ser acolhidas pelos leitores, na medida de seu desejo e de suas demandas.

As ilustrações criam cenas que amplificam os sentimentos e sensações construídos na escrita, com elementos que juntam paisagens e situações da vida da personagem com imagens que se desenham em seu coração e em sua imaginação. O mergulho no espelho é um livro bonito e necessário, que nos convida a considerar muitas maneiras de existir, incluindo a maternidade.

Ninfa Parreiras é professora de literatura e de criação de textos. Escreve em versos e prosa para leitores de todas as idades e tem diversos títulos publicados.

Marcelo Ribeiro tem obras consideradas Altamente Recomendadas pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) e selecionadas pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD).

O catálogo da Editora Maralto pode ser conferido no Instagram e Facebook @maraltoedicoes

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