Em Lábrea, cidade do sul do Amazonas que é a quarta no ranking de cidades brasileiras que mais emitem gases de efeito estufa, a Terra Indígena Caititu, território do povo Apurinã, é uma oásis verde que estoca e absorve carbono da atmosfera. Próxima ao centro do município, e cercada pelo desmatamento, a área de 308 mil hectares é conservada por meio de iniciativas protagonizadas pelos povos indígenas, como a implementação de Sistemas Agroflorestais (SAFs) e o manejo sustentável de castanha-do-Brasil. As atividades são apoiadas pelo projeto Raízes do Purus, realizado pela Operação Amazônia Nativa (OPAN), com patrocínio do Programa Petrobras Socioambiental.
O sul do Amazonas, região de fronteira com os estados de Rondônia e Mato Grosso, tem os maiores índices de desmatamento do estado. Os efeitos do avanço da fronteira agrícola na região foram identificados na segunda edição do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG) Municípios, produzido pelo Observatório do Clima, onde Lábrea e Apuí figuram entre as dez cidades que mais emitem gases causadores do efeito estufa no país.
Cercado e pressionado pela intensa degradação ambiental, o povo Apurinã tem conseguido garantir que, ao menos dentro de seu território, a floresta continue fornecendo os serviços ecossistêmicos fundamentais para o equilíbrio do clima do planeta.
Produção de alimentos saudáveis com floresta em pé
Os Apurinã estão reflorestando uma área equivalente a 13 campos de futebol por meio da implementação de SAFs, modalidade de plantio agroecológico, que produz alimentos sem desmatar ou usar agrotóxicos. Até o final do projeto Raízes do Purus, em 2024, prevê-se que os Apurinã estarão manejando 18 hectares de SAFs, contribuindo para a remoção de 4.366 toneladas de carbono e outros gases de efeito estufa anualmente.
Nos SAFs, diferentes espécies são combinadas para produzir um sistema ecológico saudável. Assim, áreas antes degradadas, que não tinham mais capacidade de absorver e estocar carbono, tornam-se altamente produtivas, e voltam a prestar esses e outros serviços ecossistêmicos, como a contribuição para o conforto térmico, e para o regime de chuvas.
E não são apenas as espécies vegetais que ajudam a impedir a emissão de gases de efeito estufa. “Os SAFs são estratégicos na mitigação das mudanças climáticas, porque eles potencializam muito a capacidade do solo, através da vida microbiana, de reter esses gases, evitando que subam para a atmosfera” explica Sebastião Pinheiro, referência nacional da Agroecologia, que assessorou a implementação dos primeiros SAFs na TI Caititu, em 2014.
Hoje, os Apurinã cultivam 22 unidades de SAFs, em 20 aldeias. “A diferença de temperatura dentro dos SAFs e em área aberta é de pelo menos 10°C. As frutas atraem também animais, pássaros, formigas, insetos, que são importantes para a conservação do ecossistema”, explica Antonio de Miranda Neto, indigenista da OPAN.
Os SAFs fornecem alimentos saudáveis e orgânicos para os Apurinã, e o excedente é comercializado em Lábrea, gerando uma renda sustentável para os indígenas. O urucum, por exemplo, é usado pela família do cacique Marcelino Apurinã para produzir um colorau que é referência de qualidade na região.
Cuidando das anciãs da floresta
Ameaçada de extinção, a castanheira (Bertholletia excelsa) é uma espécie grandiosa em muitos sentidos. São árvores que atravessam séculos, e podem chegar a mais de 1000 anos de idade. Imponentes, as castanheiras adultas alcançam de 30 a 50 metros de altura, e podem ter troncos de mais de 2 metros de diâmetro.
Essa espécie precisa da biodiversidade conservada para se reproduzir, pois suas flores são polinizadas por alguns tipos de insetos, que são atraídos por orquídeas encontradas perto das árvores de castanha. Sem estas orquídeas, e insetos, as castanheiras não dão frutos.
O povo Apurinã maneja e conserva 116 mil hectares de castanhais na Terra Indígena Caititu, onde estão estocadas 61.651.509 toneladas de carbono. Em 2021, os castanhais removeram 183.661 toneladas de carbono da atmosfera.
Além de manejar os castanhais, os Apurinã protegem todo o território para impedir o desmatamento, que ameaça diretamente a reprodução das castanheiras. Na temporada de coleta da castanha, os manejadores circulam por grandes extensões territoriais, e visitam pontos remotos da TI, inibindo a ação de invasores.
“Os indígenas conservam a natureza. E isso não é valorizado pela maioria, como deveria ser. Estamos conservando a nossa terra com nossos conhecimentos, nossa força, e nossa luta”, opina Maria dos Anjos, liderança da aldeia Novo Paraíso.
Sobre o Raízes do Purus
O projeto Raízes do Purus é uma iniciativa da OPAN, com patrocínio da Petrobras por meio do Programa Petrobras Socioambiental, que visa a contribuir para a conservação da biodiversidade no sudoeste e sul do Amazonas, fortalecendo iniciativas de gestão e o uso sustentável dos recursos naturais das terras indígenas Jarawara/Jamamadi/Kanamanti, Caititu, Paumari do Lago Manissuã, Paumari do Lago Paricá, Paumari do Cuniuá e Banawa, na bacia
do rio Purus, e Deni e Kanamari, no rio Juruá. www.raizesdopurus.com.br.
Sobre a OPAN
A OPAN foi a primeira organização indigenista fundada no Brasil, em 1969. Nos últimos anos, suas equipes vêm trabalhando em parceria com povos indígenas no Amazonas e em Mato Grosso, desenvolvendo ações voltadas para a garantia dos direitos dos povos, gestão territorial e busca de alternativas de geração de renda baseadas na conservação ambiental e no fortalecimento das culturas indígenas.