Solidariedade e voluntariado: um paradoxo brasileiro

Solidariedade e voluntariado. Duas palavras que miram para um mesmo sentido (ou seja, da fraternidade, da compaixão), mas que, na prática, revelam-se de forma bastante paradoxal na sociedade brasileira. Temos muitos solidários para poucos voluntários em nossa Nação. Essa é a realidade que se impõe e exprime a enorme diferença que há entre ‘ser solidário’ e ‘ser voluntário’ – ao menos por aqui, no Brasil. 

Temos a fama, e muito boa por sinal, de ser um povo caridoso, sempre a postos para intervir em momentos de tragédias ou catástrofes. Casos como o de Brumadinho/MG e outros mais recentes, como as chuvas que devastaram cidades do Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco são provas repetidas do imenso espírito altruísta que mobiliza os brasileiros. Em todas essas ocasiões vimos exemplos maravilhosos de generosidade, desprendimento e empatia. 

Algo, aliás, que não é novidade. Podemos enumerar aqui centenas de outras situações semelhantes nas últimas décadas. É indiscutível, somos solidários! 

Por outro lado, quando se trata de voluntariado, pode-se dizer que ocorre uma situação surpreendentemente inversa. O engajamento é muito pequeno no país, o que nos leva questionar a razão de tamanha dicotomia.

O dado oficial mais recente (Pnad Contínua 2019) aponta que só 4% da população brasileira se dedica a atividades do gênero – número baixo em comparação a outros países. Nos Estados Unidos, por exemplo, esse contingente supera a marca de 30%.

Das razões, arrisco apontar aqui, uma das principais é a falta de envolvimento por parte das grandes corporações em projetos de voluntariado. Levantamento realizado pelo IDIS (Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social) e Instituto Datafolha mostra que apenas 15% das atividades voluntárias são organizadas por empresas. Um número também surpreendentemente baixo e que, sem dúvida, contribui para este cenário.

Acredito fortemente que essa realidade pode mudar com a força do mundo empresarial, que tem pessoas, organização, comunicação e investimento em ações sociais. 

O trabalho voluntário demanda enorme compreensão de gestão para que seja contínuo, precisa ser desenvolvido de forma racional, ter resultados mensuráveis, ser constantemente avaliado e respaldado por indicadores – exatamente como fazem as empresas. 

Nesse contexto, o voluntariado corporativo tem o poder de agregar em um só ambiente pessoas, causas e a necessidade de transformação, além da cultura organizacional. A solidariedade, por sua vez, surge como primeiro passo (aliás, importantíssimo) para trilhar esse caminho. Quanto mais gente estiver nele, melhor.

A propósito, como bem define uma música de Milton Nascimento e Fernando Brant, “um solidário não quer solidão”. De fato: o espírito de união é o combustível que mantém viva a disposição em dedicar-se ao próximo. Por isso o ambiente corporativo tem potencial imensamente aglutinador e, não tenho dúvida, é capaz de despertar a transformação de muitos ‘solidários’ em ‘voluntários’. A experiência nos mostra isso. Temos bons exemplos a seguir. Por aqui, desde 2014 a MRV&CO decidiu fomentar o voluntariado corporativo entre seus colaboradores com o Instituto MRV e o incentivo já soma mais de 4,2 mil participações.

A crescente preocupação com a agenda ESG, tendo o voluntariado um aliado bastante estratégico com ações relacionadas ao “S”, é fator importante nessa conjuntura e deve servir para acelerar esse processo – assim esperamos e torcemos. 

Até lá, cabe parabenizar e enaltecer sempre essa minoria de abnegados da pátria, nossos voluntários. Em homenagem a eles, no mês que se comemora o Dia Nacional do Voluntariado, encerro aqui repetindo uma fábula contada pelo sociólogo Herbert de Souza, o inesquecível Betinho, que narra o diálogo entre um beija-flor e um leão, durante um incêndio em uma floresta. 

O beija-flor ia do rio para o incêndio levando uma gotinha de água no bico. O leão, intrigado, perguntou: ¨Ô beija flor, você acha que vai conseguir apagar o incêndio sozinho? E o beija flor respondeu:¨Não sei se vou conseguir, mas estou fazendo a minha parte”.

*Sobre Blenda Alves

Formada em Serviço Social e Gestão das Organizações do Terceiro Setor, com MBA em Gestão de Negócios e Inovação e pós-graduações em Gestão em Responsabilidade Social e em Gerenciamento de Projetos de Ciências Sociais Aplicadas, Blenda Alves é coordenadora do Instituto MRV.

Sobre o Instituto MRV

O Instituto MRV acredita que os primeiros passos para trilhar um futuro com mais oportunidades estão diretamente ligados ao poder transformador da educação. Por isso, desde 2014, o braço social da MRV&CO desenvolve e apoia importantes programas e projetos, que têm como essência oferecer possibilidades ainda maiores na área da educação. Com 1% do lucro líquido da companhia destinado para essas ações, já foi possível proporcionar oportunidades de um futuro melhor para mais de 1,1 milhão de pessoas em sete anos. Saiba mais em institutomrv.com.br