Cientistas buscam formas de tornar essa terapia oncológica mais eficiente e evitar a recidiva do câncer; modelo alimentar com pouco carboidrato demonstrou bons resultados em camundongos
Por Gabriela Cupani, da Agência Einstein
Alterações na dieta podem ser benéficas a pacientes oncológicos que passam por tratamento com células CAR-T, sugere um estudo inédito da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos. O trabalho foi destaque no 66º Encontro Anual da Sociedade Americana de Hematologia (ASH, na sigla em inglês), que aconteceu entre os últimos dias 7 e 10 de dezembro em San Diego, nos Estados Unidos.
A terapia celular CAR-T é um dos principais avanços em imunoterapia – aquela que utiliza células do próprio paciente para estimular o combate a um câncer. No caso, são usados linfócitos T, um tipo de célula de defesa que, em laboratório, recebe informações genéticas de um receptor localizado na superfície dos tumores. Isso promove uma “reprogramação” celular que gera células chamadas de CAR-T. Ao serem “recolocadas” na pessoa, conseguem reconhecer o câncer com mais facilidade e destruí-lo.
No entanto, muitos pacientes param de responder ao tratamento e o câncer pode voltar. Por isso, cientistas buscam formas de torná-la mais eficaz. No trabalho dos pesquisadores da Universidade da Pensilvânia, eles compararam a resposta ao tratamento em camundongos com linfoma que receberam diversos tipos de alimentação.
A conclusão foi de que aqueles que receberam uma dieta cetogênica (pobre em carboidratos e rica em gordura) tiveram melhor resposta e maior sobrevida em relação aos ratinhos alimentados com outros modelos alimentares: mais carboidrato, mais proteína ou mais colesterol, por exemplo.
Ao induzir cetose – processo em que o organismo utiliza gordura, e não glicose, como fonte de energia –, esse tipo de dieta gera como metabólito o beta-hidroxibutirato (BHB), que é uma fonte energética e mantém o metabolismo das células.
Em comunicado da Faculdade de Medicina da Universidade da Pensilvânia, o coautor Puneeth Guruprasad conta que a equipe trabalhou com a hipótese de que as células CAR-T preferem usar o BHB como combustível em vez da glicose. Com isso, ao aumentar a quantidade da substância no organismo, as CAR-T atuariam com mais energia contra o tumor.
Para testar essa ideia na prática, os cientistas administraram um suplemento de BHB em camundongos com tumores e que receberam as CAR-T. Na maioria desses animais houve uma melhor performance das CAR-T contra as células malignas, levando à completa destruição dos tumores.
Numa última análise, os estudiosos avaliaram exames de sangue de pessoas que estavam recebendo esse tratamento oncológico e constataram que aquelas com níveis mais altos de BHB também tinham uma expansão das CAR-T, sugerindo uma melhora funcional e quantitativa dessas células no enfrentamento ao câncer.
Especialistas da área veem com animação esses achados. “[O BHB] É um metabólito que pode servir de fonte de energia mais eficiente que a glicose, melhorando a atividade antitumoral e a proliferação das CAR-T”, analisa a hematologista Lucila Kerbauy, coordenadora médica de terapia celular avançada do Hospital Israelita Albert Einstein. “Mas somente os estudos clínicos poderão mostrar se isso vai resultar em melhor atividade antitumoral e melhores taxas de resposta nos pacientes.”
Para o hematologista Nelson Hamerschlak, coordenador do Programa de Hematologia e Transplantes de Medula Óssea do Einstein, que lidera pesquisas com CAR-T, esse é um estudo promissor. “Pode apontar uma forma muito simples e barata de tornar a terapia mais efetiva, seja modificando a dieta, seja usando [o BHB] como suplemento alimentar”, observa Hamerschlak, que esteve no encontro da ASH em San Diego. “No entanto, ainda falta avaliar se a melhora na resposta poderá causar mais efeitos colaterais também.”
A equipe dos EUA já começou um estudo clínico de fase 1 para estabelecer a segurança e, posteriormente, a eficácia da suplementação com BHB em pessoas com câncer.
Fonte: Agência Einstein