Estamos no Setembro Amarelo, mês mundial de prevenção e combate ao suicídio, que só no Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde, ceifou a vida de 55 mil pessoas entre 2011 e 2015. Entre os jovens de 15 a 29 anos, é a segunda principal causa de morte em todo o mundo, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS). Embora as estatísticas sejam assustadoras, é fundamental ressaltar que na maioria dos casos, o suicídio pode ser prevenido.
Como? Por meio da disseminação do tema e da conscientização sobre os fatores de risco envolvidos nas tentativas de tirar a própria vida. Em mais de 90% dos casos, o suicídio está ligado a algum transtorno mental não tratado ou não identificado. Os mais prevalentes são os transtornos do humor, como a depressão e a bipolaridade, que correspondem a cerca de 36% dos casos. A dependência de álcool e outras drogas está em segundo lugar, com 22%, segundo um estudo.
Anulação do sentido de existir
Um dos fatores de risco para o suicídio é a desesperança. Mas, antes de começar a falar da desesperança, é importante entender o que é a esperança. A origem da palavra vem do latim, spes, cujo significado é confiança em algo positivo. A esperança é o sentimento que expressamos quando temos confiança em realizar algo, em esperar, em ter expectativas.
“Quando perdemos essa capacidade de confiar, de acreditar e de ter expectativas sobre nossa vida, presente ou futura, podemos sentir a desesperança. Ela ocorre quando há uma ruptura, uma descontinuidade entre nossa própria existência, um conflito entre o ser e o estar. A desesperança é não enxergar o futuro, é pensar que não vale à pena viver”, comenta a neuropsicóloga Thaís Quaranta.
“A desesperança leva a pessoa a pensar que o amanhã simplesmente não vai acontecer e está intimamente ligada aos quadros de depressão, aos comportamentos autodestrutivos e à ideação suicida. Alguém com sentimentos de desesperança acredita que nunca terá sucesso, que nada de bom vai acontecer e que seus problemas nunca serão resolvidos”, explica Thaís.
Estudos de Beck
O psicólogo Aaron Beck, criador da Terapia Cognitivo Comportamental (TCC), fez um estudo observacional de pacientes deprimidos e identificou que os pensamentos sobre o suicídio eram recorrentes naqueles que pensavam que seus problemas eram impossíveis de serem solucionados, com sentimentos intensos de desesperança.
“As chamadas regras do quatro D (desesperança, desemparo, desespero e depressão) dizem respeito aos sentimentos que as pessoas com ideação suicida expressam. Todos são importantes, porém atualmente a desesperança e a depressão parecem estar mais em evidência e isso é preocupante, pois estudos posteriores a este de Beck mostraram que a desesperança é um fator preditor importante para o suicídio”, acrescenta Thaís.
“A desesperança anula o sentido de existir enquanto pessoa, de estar no mundo. Por isso, é um sinal que deve ser mais bem entendido e percebido pela população para uma possível intervenção”, explica a psicóloga.
Como identificar a desesperança no dia a dia?
“Caso você desconfie que uma pessoa esteja pensando em tirar a própria vida, faça algumas perguntas, como: ‘quais são seus planos para o futuro’? ‘Viver vale à pena’? Provavelmente, se há sentimentos de desesperança, a pessoa terá muito dificuldade em respondê-las”, sugere Thaís.
Segundo a neuropsicóloga, as respostas serão negativas e pessimistas. “Mas isso não basta. É preciso também prestar atenção aos outros comportamentos, às frases, como “este problema não tem solução’, nunca vou conseguir resolver isso’; ‘não vejo mais sentido em viver’.
“Isolamento social, mudança no padrão de sono, alimentação, cuidados pessoais e ameaças de suicídio também são importantes sinais de alerta. Lembrando que na maioria dos casos de suicídio, houve pelo menos uma forma de comunicação da intenção de tirar a própria vida. Portanto, uma ameaça sempre deve ser considerada”, ressalta Thaís.
O que fazer?
Cada situação irá exigir uma ação. Nos quadros iniciais de um transtorno psiquiátrico, como a depressão, é importante procurar um psiquiatra e um psicólogo para tratamento e acompanhamento. Nas ameaças, sem tentativas efetivas, também é importante procurar ajuda profissional de uma equipe de saúde mental.
“Entretanto, se a pessoa está na iminência de se machucar ou de tirar a própria vida, as medidas são outras. É preciso chamar o SAMU e não deixar a pessoa sozinha nem por um minuto. Também é preciso retirar possíveis objetos ou remédios que poderiam ser usados, assim como fechar janelas. Ou seja, deixar a pessoa em segurança até que a ajuda chegue”, orienta Thaís.
Falar sobre o suicídio é importante, conhecer seus fatores de risco também. Mas, acima de tudo, é preciso derrubar o tabu que envolve o tema. Muitas vezes, quem está pensando em tirar a própria vida tem vergonha de pedir ajuda, não demonstra seus sentimentos, portanto não pode ser ajudado.
“Não há vergonha, não há culpa. Sofrer faz parte da existência humana, ninguém está imune aos revezes da vida. O mais importante é saber que há esperança, que tudo pode ser resolvido e que a morte é uma solução definitiva para um problema temporário”, finaliza Thaís.
(carol