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A dor da perda e a perda da dor

Solange do Carmo Bowoniuk Wiegand*

Vida e morte: uma não existe sem a outra e todos nós passaremos por elas. Essa é a única certeza que temos.

O luto acontece quando passamos por uma perda significativa e temos que nos adaptar a essa nova realidade. Quando perdemos alguém querido, nos enlutamos e sofremos por essa perda. Porém, podemos ser acometidos por outras perdas, além da mais conhecida que é a morte: acidentes, desastres naturais, desemprego, doenças, também podem acontecer.

Trazendo para o nosso presente, muito se fala sobre o número de mortes e o grande impacto ambiental causados pelo rompimento da barragem de Brumadinho (MG). Porém, como fica a falta de esclarecimento sobre o desaparecimento de familiares e amigos que ainda não foram encontrados? Os desaparecidos fisicamente continuam psicologicamente presentes na vida dos seus familiares. Nessa situação, o processo de elaboração do luto é impedido devido à falta da constatação clara da sua perda. O ritual de despedida não é realizado, há a ausência do corpo do seu ente querido. Muitos têm dificuldade em continuarem suas vidas pois, além da perda emocional de seus pais, irmãos, amigos, muitos perderam seus provedores financeiros também.

A maior parte dos comentários sobre o acontecimento fala dos bilhões que a Vale S.A. perdeu. Mas o que paga a vida das mais de 200 pessoas já encontradas e outras que ainda faltam ser localizadas? Como continuar vivendo em um local onde pessoas podem ser evacuadas de suas casas a qualquer momento? Como repensar a economia local com tantas perdas? Nossas redes sociais continuam comentando sobre tragédias e, por mais que elas apareçam nos noticiários, sempre acabamos sendo pegos de surpresa. A mais recente, na escola Raul Brasil, em Suzano (SP), com um plano arquitetado pelos atiradores baseado em tragédias já ocorridas em outros países. É comum vermos isso acontecer em outros países, não no nosso. Porém, elas acontecem aqui também.

E por que acontecem aqui também? Onde está a nossa falha? E, mais uma vez, familiares é que sofrem com as suas perdas, causadas por outras pessoas. Situações como as descritas acima levaram o nosso país a um luto coletivo, nos últimos meses – seja pela morte das pessoas, pela destruição ambiental de uma cidade ou pela perda de confiança nos postos de comando que administram tanto a mineradora de Brumadinho quanto da escola Raul Brasil. Não nos interessa o destaque na lista de tragédias e sim que elas não aconteçam em nenhum setor brasileiro.

Passar pela experiência da perda de alguém especial para nós é única, por isso, não existe um tempo certo de enlutamento – depende da experiência de vida de cada um, podendo chegar até a dois anos para o caso de enlutamento considerado normal. Assim como não há uma receita pronta de como passar por esse momento difícil, a grande maioria das pessoas passa pelo luto de forma mais tranquila –  quando tem um tempo para se preparar para a perda – outras já se encontram mais vulneráveis e necessitam de ajuda especializada – principalmente aquelas que sofreram perdas prematuras, repentinas, violentas e inesperadas, com acompanhamento da mídia e da sociedade, podendo-se levar a um luto complicado, do qual não se consegue elaborar a perda sozinho.

Em se tratando de perdas causadas pela ação do homem, o desejo de vingança tende a aparecer, originado pela raiva do acontecido, mas com o tempo ele tende a desaparecer. Embora perdas significativas aconteçam em nossas vidas, é importante conversar sobre elas, pois a vida continua, apesar das nossas perdas. E a palavra que fica é a resiliência – reaprender com a vida, dando continuidade na sua própria, se reorganizando e encontrando um lugar confortável para aquele que se foi, seja por meio de uma rede de apoio externa ou de amigos e familiares.

*Solange do Carmo Bowoniuk Wiegand, psicóloga e mestranda em Bioética. Coautora de cinco livros ligados à psicologia, morte e luto. Professora no curso de extensão “Falando sobre Perdas e Lutos”, da Universidade Positivo.

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