Qual o caminho da política comercial brasileira?

Cintia Rubim*

O recente aumento das taxas de importação sobre o leite em pó integral e desnatado oriundo da União Europeia foi comemorado pelo setor produtor. No dia 06 de fevereiro, com o fim da tarifa antidumping anunciado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, que protegia o setor desde 2001, esse setor ficou exposto à concorrência externa desleal de países que tradicionalmente subsidiam fortemente a produção de leite em seus países, como Nova Zelândia e grande parte da Europa. A tarifa antidumping previa uma taxação de 14,8% sobre o leite em pó advindo da União Europeia e de 3,9% do proveniente da Nova Zelândia, taxas essas que eram cobradas como forma de equilibrar o mercado interno. As medidas antidumping são pedidas por empresas ou entidades contra exportadores de países quando há evidências de que eles estão vendendo seus produtos para o Brasil a preços mais baixos do que os cobrados em seus mercados internos. A defesa da atual equipe da pasta de Economia era a de que nem sempre se podia comprovar a prática abusiva dos países exportadores.

A medida da Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia gerou desconforto e insatisfação para o setor produtor de leite, que contempla cerca de 1,17 milhão de estabelecimentos, sendo grande parte composta por pequenos agricultores familiares. A notícia contrariou a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) e foi criticada por ruralistas. Produtores do leite passaram a pressionar a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, cobrando um novo tributo ao produto importado.

Na tentativa de desfazer esse mal-estar do governo com o setor e considerando que parte deste inclusive apoiou a eleição do presidente Jair Bolsonaro, o ministério da Agricultura anunciou, dia 12 de fevereiro, um aumento na tarifa de importação que contemplaria os 14,8% extintos mais os 28% da alíquota de importação do leite que se aplica hoje, referente à Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul. O presidente Bolsonaro mostrou-se satisfeito com tal desfecho, publicando em sua página no Twitter: “Comunico aos produtores de leite que o governo, tendo à frente a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, manteve o nível de competitividade do produto com outros países. Todos ganharam, em especial os consumidores do Brasil”.

Parece ter havido uma discordância dentro do Governo entre as pastas da Economia e da Agricultura, uma tendo se mostrado favorável à liberalização comercial e a outra se colocando a favor do setor produtor brasileiro. Ora, sabemos que abrir determinados setores à exposição da concorrência internacional pode ser desastroso para aqueles que concorrem com práticas de proteção que tornam o preço no mercado internacional impossível de ser alcançado, por ser abaixo do custo de produção.

A orientação do Ministério da Economia, claramente, é no sentido da abertura comercial, uma vez que, de acordo com dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), estão em revisão 37 medidas antidumping e outras 39 vencem ao longo de 2019 e terão que ser analisadas novamente, além da intenção já apresentada da realização de novos acordos bilaterais internacionais.

Entretanto, há de se pensar que os efeitos esperados quanto ao aumento da produtividade e do choque tecnológico positivo capaz de promover o crescimento econômico certamente não serão os mesmos para todos os setores – e as pastas do governo devem estar alinhadas quanto ao equilíbrio entre abertura comercial e defesa dos setores sensíveis, de modo a passar credibilidade e segurança aos segmentos produtivos, com regras claras e definidas, capazes de sustentar o crescimento econômico, porém, sem prejuízos a setores nacionais.

*Cintia Rubim é doutora em Desenvolvimento Econômico e coordenadora do curso de Economia da Universidade Positivo.

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