Sérgio Rocha é presidente da ABRAIDI
A Associação Brasileira de Importadores e Distribuidores de Produtos para Saúde – ABRAIDI – concluiu um estudo setorial, no ano passado, mensurando três importantes distorções que comprometem o fluxo de caixa e a saúde financeira das empresas fornecedoras de equipamentos e material para a saúde. Os problemas somados representam 50% do custo de operação das companhias, sendo que R$ 484,1 milhões são faturamentos postergados por hospitais e operadoras que, em média, ultrapassam 120 dias para quitar débitos; outros R$ 160,6 milhões são glosas praticadas de forma injustificada para procedimentos previamente autorizados; e, por fim, R$ 789 milhões são os valores de inadimplência, ou seja, não recebidos há mais de 180 dias após o faturamento. As perdas financeiras totalizam R$ 1,379 bilhão.
A retenção de faturamento é uma prática realizada por parte de operadoras, planos de saúde e hospitais e acontece quando, após a realização do procedimento cirúrgico previamente autorizado e a consequente utilização de produtos, não permitem a emissão da nota fiscal e respectivo boleto para recebimento. Em muitos relatos de associados, a retenção é acompanhada de uma ameaça de retaliação, caso não seja aceita. O pagamento dos materiais fica postergado, sem qualquer possibilidade de atuação.
O valor retido ou bloqueado foi de R$ 484,1 milhões, segundo a pesquisa, sendo R$ 204 milhões retidos por convênios, planos de saúde e seguradoras, R$ 237,7 milhões bloqueados por hospitais privados e outros R$ 42,4 milhões por instituições públicas. Foi possível observar, nos últimos três anos, a reversão de uma tendência, em alguns locais do país, das operadoras de saúde negociarem de forma direta, junto aos fornecedores, a compra de produtos para saúde, repassando essa responsabilidade aos hospitais. A operadora de saúde agora negocia com o prestador de serviço um valor fixo (pacote) para cada procedimento, deixando a cargo do hospital todo o processo de compra dos produtos para a realização da cirurgia. Com essa mudança de comportamento empresarial, a retenção de faturamento por parte dos hospitais aumentou em 110% desde a primeira pesquisa realizada pela ABRAIDI, em 2017.
A retenção de faturamento ocorre, em média, com 36 dias, quando somente operadoras de saúde e hospitais permitem a emissão da nota fiscal, após o procedimento cirúrgico realizado. Depois do faturamento, operadoras e planos de saúde ainda demoram 65 dias para efetivar o pagamento, hospitais privados postergam em 82 dias e instituições públicas em 107 dias. O prazo total médio, entre o fornecimento do material até o efetivo pagamento, constatado na pesquisa foi de quatro meses e um dia (121 dias).
As glosas não justificadas, motivadas por explicações infundadas de ordem administrativa ou burocrática das operadoras, têm se mostrado uma distorção que cada vez mais prejudica os fornecedores. Em 2019, 86% dos associados relataram sofrer com as glosas, chegando a um total estimado de R$ 160,6 milhões, um aumento de mais de 59%, em relação à pesquisa anterior. As glosas acontecem quando a operadora ou o plano de saúde se nega a pagar alguns produtos, materiais ou equipamentos utilizados em cirurgia previamente autorizada por eles mesmos, ou seja, claramente para postergar o pagamento. Pelo estudo, em 49% dos casos, a glosa corresponde a procedimentos eletivos previamente autorizados pela operadora de saúde.
Outra distorção que afeta todo o sistema de saúde é a inadimplência, que tem sido recorrente nas pesquisas anteriores, mas que aumentou 42,2% de 2018 para 2019, chegando à cifra de R$ 789 milhões. Segundo o levantamento da ABRAIDI, 96% dos associados registraram perdas com inadimplência ou calote por parte de hospitais, operadoras ou órgãos públicos. Em 2018, esse índice era de 81%. A falta de pagamento é contabilizada quando o fornecedor não é remunerado após 180 dias, a partir do faturamento. Os fornecedores de produtos para saúde, especialmente importadores e distribuidores, têm ‘funcionado’ como financiadores de hospitais e operadoras de saúde. É um problema tão sério que fizemos denúncias sobre o assunto na Comissão de Valores Mobiliários – CVM e na Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS para que sejam analisadas.