Por Wanda Camargo*
Costumamos falar em “ciências duras”, quando nos referimos à Matemática, Física, Biologia e outras cujas teorias são passíveis de prova, e parecem levar a resultados constantes sob as mesmas condições. Por outro lado, falamos em “ciências humanas”, ou de espírito, àquelas onde isso não é possível, como Filosofia e Sociologia, ou seja, onde idênticas condições iniciais podem levar a conclusões díspares ou imprevisíveis.
Uma preocupação constante de cientistas é conseguir abordar a realidade, em suas mais variadas manifestações, sem reduzir sua complexidade, mas conseguindo prever seus resultados, e diversas teorias recentes mais próximas das ciências exatas, tem sido utilizadas neste objetivo, pois alguns ramos do conhecimento, como por exemplo Economia ou Psicologia tem alguns de seus tópicos funcionando quase que como “fronteiras” entre um saber e outro.
Tais teorias parecem aproximar as ciências naturais e as ciências humanas, pois algumas de suas aplicações ao comportamento humano parecem viáveis.
O que chamamos complexidade, tradicionalmente utilizado no sentido quantitativo – quanto mais fatores interferem em um fenômeno mais o declaramos complexo – tem sido abordado de forma qualitativa, já que certas propriedades da realidade, em especial quando analisamos friamente os comportamentos de crianças, jovens ou mesmo adultos, podem ser caóticos, difusos, catastróficos, fractais; teorias atualmente extensamente estudadas, e que podem ser aplicadas ao estudo e maior compreensão do comportamento dos seres humanos.
Evidentemente os fenômenos naturais e humanos, desde que não criados artificialmente, não são simples como verdadeiro-ou-falso, sim-ou-não, e no entanto uma aproximação disso foi utilizada por Marx, que em seus escritos políticos sustentou a luta entre a burguesia e o proletariado, simplificação radical do sistema de classes, quando sabemos de análises sociológicas e históricas que as classes sociais são inúmeras e com distintos anseios e motivações.
Outro bom exemplo de conceitos matemáticos sendo utilizados nas humanidades são os conjuntos que não incluem contradição e exclusão de terceiros, ou seja, aqueles onde um elemento pode pertencer e não pertencer ao mesmo conjunto simultaneamente, as vezes porque os critérios de pertença não são tão claros ou falta conhecimento sobre eles; o que traz operações lógicas fora da estatística de probabilidade, e quando portanto se fala apenas em possibilidades, que são qualitativas e refletem potencialidades ou aptidões a serem demonstradas.
Estas são novas formas de refletir sobre aquilo que denominamos verdade, que podemos construir intelectualmente; o mundo dos conceitos, sejam eles vindos da natureza externa, como saúde ou adoecimento, ação ou passividade, não é perfeitamente delimitado, e conceitos-chave para a compreensão do mundo sensorial, convenções grupais, processos cognitivos, emoções e afetividades, também não têm fronteiras definitivas.
No entanto, isso não implica em abandono daquilo que chamamos lógica, nem desprezo pela ciência: entender que novas teorias surgem e nos auxiliam a compreender não significa que passamos a agir fora da racionalidade como tem ocorrido com frequência no Brasil hoje. Abrir o jornal, ligar a TV tem sido precipitar-se num torvelinho de versões e contraversões, de incoerências ou pura loucuras que nenhum discernimento mínimo dos fatos autorizaria.
O hábito de “fatiar” a realidade para entender melhor seus componentes, analisar partes distintas para chegar à compreensão do todo, seja em ciências humanas ou da natureza, não nos autoriza a criar narrativas fantasiosas ou apenas falsas para explicar, da forma como desejamos, fatos que escapam à nossa cognição. A Ciência tem metodologia, experiências comprovadas, exaustivos testes e trabalho coletivo, não nasce de opiniões e vontades de alguns poucos, e principalmente não de interesses escusos. Discernimento é parte importante do melhor que nossas escolas podem oferecer.
Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.