Da Corrupção

Daniel Medeiros*

 

Sempre foi um problema para os gregos antigos a degradação das coisas por todo canto. Nada perdura. O corpo, a árvore, até a rocha se desfaz diante da inevitável ação do tempo. Só os deuses eram eternos e essa diferença explicava sua superioridade. Corromper é estragar, perder sua forma e sentido originais. Uma maçã esquecida na gaveta corrompe-se. Um arquivo de computador que não consegue abrir e mostrar seu conteúdo, corrompeu-se. Nossa vida é um remar contra a maré da efemeridade de tudo, iludindo-nos com a ideia sempre presente de que podemos chegar a algum lugar onde tudo é sempre o mesmo, sem fins e sem novidades.

A degradação das coisas está nas coisas mesmas. Hoje há uma palavra para designar quando isso ocorre nos objetos: é a obsolescência. Tudo têm um código interno com a data de seu fim, entendendo-se fim como a impossibilidade de continuar a exercer a função esperada. Proteger contra a ação externa serve apenas como uma forma de evitar acelerar esse processo, mas ainda não foi possível modifica-lo a ponto de inverte-lo ou, ao menos, desliga-lo. Ou seja, tudo caduca e depois estraga-se, deixando de funcionar. Para alguns casos, chamamos a esse processo, “morrer”.

Na Política, a corrupção é o desvio da finalidade que esperamos dos órgãos e/ou dos seus representantes. Quando se espera que o dinheiro dos impostos seja usado, por exemplo, para a construção de escolas, mas descobrimos que parte desse dinheiro foi usado na campanha eleitoral do governante e, graças a isso, ele recebeu mais um mandato, há aqui um duplo estrago: o do fim não alcançado e o do erro quanto à pessoa renovado. Se descobrimos coisas assim, sentimo-nos traídos, enganados. Não que não saibamos que tudo estraga, mas nunca é fácil verificar que o momento é chegado. 

Por isso queremos governos que não sejam corruptos. É preciso que, por um tempo, eles funcionem. Imaginar que não vão se estragar é uma dessas ilusões que só a falta de escola explica. Ou a falta de governos que usem o dinheiro dos nossos impostos na construção delas. Como tudo, tudo estraga. Inclusive os governos. Daí precisarmos refunda-los de tempos em tempos. Maquiavel, no século XVI, já afirmava que “a virtù encontra seus limites lá onde a corrupção alcançou um tal nível que seus efeitos se tornaram incontroláveis”. E o que precisa ser feito, sempre, é “evitar que a corrupção se instale a tal ponto que toda ação se torne inútil”. 

Muitas vezes comparamos nossa esperança na escolha, com a realidade que o tempo impõe. Não temos um preparo – a escola, de novo – para identificar nas diversas atitudes dos governantes e dos agentes públicos em geral aquelas que aceleram a sua corrupção. É fato que muitas vezes, aqueles que são capazes de perceber o andar da carruagem não são aqueles que são capazes de deter os cavalos. Mas, mesmo assim, o caminho é um só: governos, como tudo o que nos rodeia, acabam; e para evitar escolher governos estragados ou que se estraguem rapidamente, precisamos observar atentamente e agir rapidamente, sempre tendo em mente a experiência dos exemplos já ocorridos – rememorando-os – para que nos ajudem nesse refundar constante que é o da nossa existência nesse mundo.

 

* Daniel Medeiros é Doutor em Educação Histórica e professor no Curso Positivo.

danielmedeiros.articulista@gmail.com
@profdanielmedeiros

 

**Artigos de opinião assinados não reproduzem, necessariamente, a opinião do Curso Positivo.

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