Um dos impactos visíveis no panorama econômico causados pela Covid-19 atinge o comportamento dos consumidores à medida que mudam sua forma de consumir e, por consequência, influenciam a dinâmica do mercado de diversos setores. Dessa forma, ações de marketing precisaram ser transformadas para acompanhar esse “novo consumidor”.
Se antes da pandemia as lojas on-line já eram uma alternativa a mais para o empresário e comerciante, hoje vender pela internet é a principal atividade de muitos negócios. Em 2020, o atendimento ao cliente adquiriu ainda mais importância com o crescimento do tráfego no comércio on-line. Sem enxergar fisicamente seu público, tornou-se necessário entender o perfil do consumidor e oferecer atendimento personalizado, assim como, investir em modelos de negócio que correspondam às expectativas do cliente. A massificação do direct-to-consumer (D2C) é prova disso.
De acordo com a pesquisadora e professora de Comunicação, Marketing e Branding da Business School e Programa de Pós-Graduação da Universidade Positivo, Fabiana Mariutti, as relações de consumo e as estratégias de comunicação e marketing — seja no âmbito institucional, informacional, promocional ou puramente comercial — dependem de cada segmento de mercado ou setor econômico.
“Muitos negócios inovam para conseguir sobreviver e surpreender seus clientes atuais ou em prospecção ao aplicar técnicas de negociação e estratégias de valor agregado como poderosos alicerces comerciais para fidelização. Em tempos difíceis para todos, diante das mais diferenciadas emoções e vivências desta longa pandemia, atender humanamente o consumidor — de forma presencial ou virtual — é a palavra que deve estar no propósito da marca e na missão, visão e valores de qualquer estratégia de um negócio”, afirma a pesquisadora.
Ações e estratégias de marketing e vendas – que estão sendo adotadas visando à sobrevivência nos novos tempos – tornam-se ainda mais importantes nesse contexto. Especialistas apontam dez tendências que ganharam força durante a pandemia e seguem em alta para 2022.
Pesquisa por voz
Falar é mais natural e relativamente mais fácil do que digitar. É por isso que a pesquisa por voz faz todo o sentido. Na verdade, é uma inovação tecnológica brilhante que já altera a forma como o consumidor se comunica digitalmente. “A pesquisa por voz simplifica a procura de informações on-line, além de reduzir drasticamente o tempo de tela”, salienta Marcio Pacheco, CEO da PhoneTrack, startup paranaense especializada em Inteligência Artificial aplicada à voz. Segundo um levantamento da Strategy Analytics, as vendas de alto-falantes inteligentes em todo o mundo chegaram, no primeiro trimestre de 2020, a 28 milhões de unidades, um resultado 8% maior que no ano anterior. Projeções estimam que para 2021 o aumento seja de 21% e que até 2024 as vendas cheguem a um total de 640 milhões de unidades. “Para tirar proveito dessa tendência, as marcas devem fazer os ajustes certos sobre como enquadrar os dados para responder adequadamente a esse comportamento emergente do consumidor”, alerta Pacheco.
Inteligência Artificial
A inteligência artificial, o Big Data e o Analytics vêm ganhando cada vez mais espaço no mercado digital, uma vez que automatizam processos, e fazem a gestão de dados e análises. “Ao detectar padrões e facilitar a compreensão do comportamento dos consumidores, as ferramentas baseadas em inteligência artificial ajudam a operar de forma otimizada e com mais foco, proporcionando as melhores experiências aos clientes”, afirma Pacheco. Tecnologias como o call tracking e o speech analytics, por exemplo, trazem informações detalhadas sobre as necessidades do consumidor por meio da análise da voz em ligações telefônicas, ajudando a mensurar campanhas, recuperar contatos perdidos e transformar ligações em novos leads.
Estratégia Omnichannel
A pandemia fez com que muitos estabelecimentos comerciais fechassem as portas, passando a atender apenas com a loja on-line. Outros ampliaram os canais, abrindo estratégias de venda por WhatsApp, delivery e drive-thru. Para Pacheco, adotar novos canais não significa abandonar os tradicionais. Segundo ele, um canal considerado ultrapassado por uma faixa da população pode ser o mais utilizado por outra. O telefone é um exemplo disso. Um levantamento da PhoneTrack mostrou que as ligações telefônicas voltaram a fazer parte da jornada do consumidor. Em 2016, 41% dos consumidores usavam o telefone para entrar em contato com uma empresa após pesquisa on-line. Em 2020, esse número saltou para 60%. Com cada vez mais canais de comunicação e venda, é importante estar onde o consumidor estiver, seja on-line ou off-line. “Mas é bom lembrar que as estratégias não podem ser as mesmas para todos os canais, pois cada um tem a sua particularidade e, às vezes, um público bem específico”, ressalta.
Vendas em Redes Sociais
Cada vez mais, as mídias sociais, além de exercerem papel fundamental na execução de estratégias de marketing, também acabam ajudando na ampliação das vendas. Recentemente, o Instagram implantou o social commerce, que permite às lojas venderem seus produtos na rede social de forma parecida com os marketplaces da web. “A estratégia atrai o consumidor para a conversão dentro das próprias plataformas das redes sociais”, afirma José Paulo Trigueiro, da Agência MKT Real. Segundo ele, em 2022, a tendência é que essa tecnologia seja ainda mais adotada e receba melhorias que impactem positivamente para empresas e clientes.
Holistic Health
A pandemia também fez as pessoas valorizarem mais a saúde e o bem-estar. Nesse sentido, o conceito de holistic health é usado no marketing e nas vendas para entender a saúde do consumidor de forma ampla, sob diferentes aspectos que representam o bem-estar. “É se reconhecer como um todo: somos a resultante de saúde física, mental, emocional, social, intelectual, e espiritual. A pandemia escancarou essa necessidade da gente se ver num contexto maior, e como seres complexos. No marketing não será diferente”, afirma a gerente de marketing da Jasmine Alimentos, Thelma Bayoud.
Comunicação interna
“É importante entender as pessoas, sua individualidade, suas dores e personalizar a comunicação, principalmente com o público interno, que é o principal cliente de organizações de qualquer segmento”, ressalta Cristiano Caporici, CMO da Tecnobank, empresa de tecnologia para negócios. Ele diz que a pandemia, o isolamento social e o trabalho remoto revelaram a importância da comunicação interna para o bom andamento das atividades da empresa. “Mesmo que o trabalho volte a ser 100% presencial, a lição aprendida com a pandemia é que a comunicação interna reflete diretamente nos resultados da companhia”, garante Caporici.
Proteção e segurança de dados
A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e a crescente sensibilidade dos clientes tornam a proteção e a segurança de dados um desafio importante para as empresas que processam dados pessoais para fins de marketing e vendas. De acordo com Rogério de Lorenzo Leal, gerente de marketing da Central Sicredi PR/SP/RJ, a mudança desse paradigma, no qual os dados pessoais passam a ser cada vez mais entendidos como propriedade da pessoa e não das empresas, irá impactar muito todos os setores. “Tarefas que antes eram naturais para o mercado agora não poderão mais ser executadas sem o devido consentimento do consumidor. Como estamos vivendo um cenário no qual a venda on-line tem desempenhado vertiginoso crescimento, e nesse ambiente virtual a coleta de dados é fundamental, as empresas precisam estar conscientes dos reflexos que a nova legislação impõe antes de estruturar suas ações e estratégias comerciais”, alerta Leal. Numa sociedade em que dados estão se transformando no novo petróleo, todo o mercado será muito impactado e exigirá das empresas maiores investimentos e estudos nesse setor.
Marketing interativo
Um site bom, funcional e responsivo, projetado para oferecer a melhor experiência possível ao usuário, sempre foi essencial. No entanto, isso se tornou ainda mais fundamental com a pandemia. “Agora é necessário ir mais longe e pensar em novas iscas para atrair tráfego para o site da empresa”, alerta Cesar Cantarella, CEO da DealerSites, startup que atua no segmento de e-commerce no setor automotivo. Para ele, no caso da negociação de compra e venda de um carro, por exemplo, a aposta é adicionar elementos interativos ao site, abrindo espaço para o cliente ser ouvido e fazer a sua proposta. “Quando o cliente tem a chance de, no próprio site da concessionária, abrir uma ferramenta que o permita pesquisar o valor de mercado do seu carro usado e apresentar as suas condições de negociação, isso acaba sendo determinante para a conversão”, ressalta.
Transparência
“Anunciar um produto sem o valor é o mesmo que criar um perfil nas Redes Sociais sem foto”, compara Cantarella. Segundo ele, o marketing on-line deve ser transparente – sob o risco de perder o cliente para sempre. “No caso de automóveis, por exemplo, o site da concessionária é um canal para pesquisa de preços e modelos, além de relacionamento entre vendedor e consumidor. Se o preço não está lá, a confiança do cliente na empresa é abalada, pois ele busca informações claras e diretas, sem enrolação e sem ter que procurar muito”, ressalta. O tráfego nos sites de concessionárias aumentou 35% durante a pandemia, segundo estudo da DealerSites.
Responsabilidade Social
Uma coisa que a Covid-19 acelerou é a percepção da necessidade dos consumidores de que as marcas sejam mais socialmente responsáveis. “É cada vez mais comum consumidores utilizarem-se das redes sociais e da cultura de cancelamento para boicotar marcas corruptas, preconceituosas, que agridem o meio ambiente ou maltratam animais, por exemplo”, explica Eliziane Gorniak, diretora do Instituto Positivo. Porém, ela ressalta que é essencial que a empresa tenha autenticidade e coerência nas ações de responsabilidade social que se propuser a fazer, antes de anunciar ao mercado.