Francis Ricken*
A Reforma Eleitoral de 2021 estabeleceu uma nova regra para as próximas eleições: a criação e o funcionamento das federações partidárias, permitindo que diferentes partidos possam se unir em âmbito nacional para as eleições majoritárias (Presidente, Governador, Prefeito e Senador) e proporcionais (Deputado Federal, Deputado Estadual e Vereador), com estatuto próprio durante o mandato conquistado nas urnas, em regra quatro anos, mas isso não impedem a sua continuidade para um novo mandato conquistado. As federações seguirão as mesmas regras utilizadas por partidos políticos quanto à fidelidade partidária, atuação dos parlamentares e possíveis sanções de seus membros. Segundo as justificativas para a criação dessa nova regra, as federações servirão de teste numa possível fusão futura, e servem de alívio para os partidos nanicos sobreviverem à cláusula de barreira para uso do fundo partidário e horário gratuito de rádio e televisão.
A criação das federações partidárias foi uma saída encontrada pelos políticos para driblar uma regra que modernizou nosso sistema eleitoral a partir das eleições 2020, que foi o fim das coligações nas eleições proporcionais, em que vários partidos poderiam se unir e compartilhar votos elegendo Deputados Federais, Deputados Estaduais e Vereadores sem muito critério partidário. O resultado das eleições municipais de 2020 fortaleceu partidos políticos mais programáticos, candidaturas femininas e estabeleceu um parâmetro mais claro de posicionamento partidário, situação que não favorece o político que gosta de pular de partido para partido de acordo com os ventos da eleição.
O sistema político brasileiro tem um flerte com a não identificação partidária; passamos por períodos de bipartidarismo forçado, regras partidárias distantes da realidade política, coligações nas eleições proporcionais que escondiam o posicionamento de partidos num grupo amorfo, regras e realidades que sempre mascararam a necessidade dos partidos para a dinâmica política. Entretanto, quando olhamos para as disputas eleitorais, o dia a dia do Congresso Nacional e a organização das lideranças políticas nos Estados e Municípios, o que mais se observa é a necessidade de uma organização em questões partidárias. Um exemplo disso é o posicionamento político dos partidos dentro de qualquer votação no Congresso Nacional, onde as posições dos grupos partidários são necessárias para qualquer tipo de aprovação significativa.
No Brasil, os mecanismos de fidelidade partidária são ínfimos, tanto que podemos observar com grande frequência políticos que pertenceram a nove, oito ou sete agremiações partidárias absolutamente diferentes dentro de sua carreira política, e isso não soa estranho para a maioria das pessoas, mas seria estranho se esse mesmo indivíduo mudasse de time de futebol a cada edição do campeonato brasileiro.
Querendo ou não, as questões partidárias são absolutamente necessárias dentro do ambiente político; não se faz uma campanha eleitoral, uma aprovação de um projeto significativo, uma coalizão de governo ou se cria estabilidade política sem levar em conta as questões partidárias. Enquanto tivermos a crença que os partidos não servem para nada, ou enquanto criarmos regras permissivas em desrespeito aos partidos políticos, não vamos amadurecer politicamente, e a federação é mais uma saída legal para o não respeito da fidelidade partidária, permitindo que partidos nanicos e sem identificação política séria continuem a existir e surfar a onda dos demais. Se negarmos a política como ela realmente é, nunca vamos compreender o seu verdadeiro funcionamento.
*Francis Ricken é advogado, mestre em Ciência Política e professor da Escola de Direito e Ciências Sociais da Universidade Positivo (UP).