Jacir Venturi*
Diante das fortes exigências da vida moderna, podemos experimentar duas formas de praticar uma boa catarse: nas páginas de um bom livro e nas caminhadas pelos parques, ruas, praias e campos sob os benfazejos raios solares. Está provado que tais atividades promovem a sensação de bem-estar provocada pela serotonina e equilibram os níveis sanguíneos de adrenalina e cortisol. Se os músculos se fortalecem com os exercícios físicos, igualmente o cérebro é estimulado pelas sinapses nos neurônios: leituras, memorizações e exercícios que exijam raciocínio. E afastam ou minimizam os declínios cognitivos que levam à demência, à depressão, à solidão e ao Alzheimer. Uma mente vazia ou preguiçosa é oficina de doenças degenerativas e vícios.
Há uma sensação de enlevo e êxtase quando imergimos em uma boa leitura, quer pelo aconchego de um livro impresso, quer pela praticidade de um tablet ou outro dispositivo digital. Afinal – ao contrário de algumas previsões belicosas –, os e-books e as versões em papel não são rivais, mas sim veiculam textos em suportes diferentes que retratam uma harmoniosa convivência entre gerações analógicas, imigrantes digitais e nativos digitais. Vivenciamos uma época singular da História com a superabundância de textos em livros, revistas e jornais a preços acessíveis – diferentemente de uma realidade não tão distante.
Um recorte interessante de um estudo mostra que a maioria das pessoas considera que a leitura ensina a viver melhor e que se converte em bons hábitos, citando inclusive uma pesquisa da Universidade de Roma segundo a qual leitores são mais felizes do que não leitores.
Ler o que se gosta é um dos grandes prazeres da vida, pois promove inclusive maior equilíbrio emocional. É bálsamo para as horas de tédio ou de ausência de companhia. O dia termina em conflitos? Ofensas? Socorra-se em Montesquieu: “Jamais sofri qualquer mágoa que uma hora de boa leitura não tenha curado”. A propósito, grandes pensadores se manifestaram sobre os benefícios das caminhadas, eles próprios andarilhos altamente produtivos.
Relembremos apenas três deles, dispostos em ordem cronológica. Jean-Jacques Rousseau assim se expressava: “Só consigo pensar enquanto caminho. Minha mente só funciona com minhas pernas”. Immanuel Kant, nascido na cidade prussiana de Königsberg, era disciplinado e somente quebrava sua rotina de escritor prolífico com suas caminhadas vespertinas, sempre pela mesma alameda, hoje conhecida como Passeio do Filósofo. E de tão metódico que era, ficou folclórico o mito de que os vizinhos bisbilhotavam o momento em que Kant saía de casa para andar a pé, pois acertavam as horas do relógio: “Pimba: 15h30!”. E Friedrich Nietzsche, que para organizar as ideias e aplacar as inquietudes e demônios, dedicava em média seis horas diárias às caminhadas: “Todos os pensamentos realmente grandiosos são concebidos enquanto se caminha.”
Exercícios físicos regulares e atividades que exigem esforço mental aumentam o fluxo sanguíneo de nutrientes e oxigênio para o corpo. Pesquisas indicam que, se esse fluxo perde impulsos, a vitalidade das células do cérebro é prejudicada. Até meados da década de 60 do século 20, havia um consenso na comunidade médica em que o cérebro adulto seria um órgão estático no qual novos neurônios não poderiam ser gerados, o que foi desmentido, a partir daí, por descobertas da Universidade de Berkeley (Califórnia), demonstrando a permanência de grande plasticidade. Atualmente, está comprovado que atividades físicas, aprendizagens que exigem esforço intelectual, laços afetivos e boa convivência com amigos e familiares favorecem a neurogênese – ou seja, a formação de novos neurônios.
O cérebro humano é o formado por cerca de 100 bilhões de neurônios que crescem em ritmo célere até os 8 anos de idade. Com o passar dos anos, a neurogênese reduz em maior ou menor intensidade, proporcionalmente aos estímulos recebidos. Estímulos físicos, intelectuais e psíquicos vão muito além de beneficiar o cérebro, pois melhoram a autoestima, o humor e o sistema imunológico, retardam o envelhecimento e nos fazem dormir melhor.
Evidentemente, exercitar-se com regularidade (além de caminhar) e manter um nível elevado de atividades intelectuais (além de ler) são ações importantes e benfazejas. Mas os hábitos de “ler e caminhar” (motivos deste artigo) são acessíveis, democráticos e não requerem habilidades especiais. São daqueles bons hábitos para os quais não há desculpas em não os praticar, à exceção dos privados por orientação médica.
*Jacir J. Venturi, autor de quatro livros e vice-presidente do Conselho Estadual de Educação do Paraná, foi professor da UFPR, PUCPR e Coordenador na Universidade Positivo.