Do fim ao recomeço: uma lição da Copa do Mundo ao futebol feminino do Brasil 

 

 

*Fernanda Letícia de Souza

Após 28 anos, a seleção brasileira feminina de futebol voltou a ser eliminada de uma copa do mundo, na fase de grupos. Único país a participar de todas as edições, o Brasil só tinha alcançado um resultado tão ruim em 1991 e 1995, quando também não avançou ao mata-mata da competição. A eliminação precoce foi um balde de água fria para uma promessa de renovação que marca o trabalho de Pia Sundhage, a frente desta geração de jogadoras.  

A seleção brasileira feminina chegou à Austrália, carregando uma grande expectativa da torcida que apostava em uma primeira fase tranquila, num grupo que contava com a favorita França, mas outras duas seleções de pouca expressividade no ranking da FIFA: Panamá e Jamaica. A estreia, com um elástico placar de 4 a 0 sobre o Panamá, parecia um presságio de que as novas estrelas do Brasil iriam brilhar muito nesta copa. No entanto, o empate em 0 a 0 entre França e Jamaica, logo na primeira rodada começou a mudar o rumo da história.  

 Mas o que de fato deu errado na seleção brasileira? A segunda rodada contra a França já mostrou jogadoras apáticas e com medo. Pia, a técnica da seleção brasileira, mudou a escalação apostando em Geize como atacante de força na área adversária e um esquema tático de lançamentos longos entre defesa e ataque, o que descaracterizou o jogo brasileiro, justamente, famoso pelo bom toque de bola e criatividade no meio de campo. A decisão claramente foi equivocada, mostrando um absoluto domínio da França no primeiro tempo.  No segundo tempo, apesar do ótimo início com o gol de empate, a seleção não sustentou o bom momento e, com substituições tardias, acabou derrotada. Derrota normal, disseram os críticos, considerando o favoritismo da França. 
Mas onde está a normalidade de um desempenho abaixo do que podem produzir as nossas jogadoras? 

O jogo com a Jamaica ganhou cara de mata-mata. Somente a vitória garantia a classificação. O desespero ficou claro já na escalação: Marta titular. Caímos na armadilha da Martadependência. É inegável que nossa rainha é a melhor do mundo e referência absoluta no futebol feminino, mas no auge de seus 37 anos e voltando de lesão, claramente não tinha condições de sustentar uma partida como uma titular. Debinha deixou de lado toda a sua criatividade para buscar incessantemente Marta em campo. Pia renunciou a seu trabalho de renovação e aposta nos jovens talentos. A falta de equilíbrio emocional das nossas jovens jogadoras ficou ainda mais evidente e o resultado todos viram: uma amarga e decepcionante eliminação. É importante ressaltar também os méritos da defesa da seleção da Jamaica, que não tomou nenhum gol na fase de grupos, nem mesmo da fortíssima França.  

Tivemos erros? Tivemos acertos? Muitos ao longo desta trajetória de preparação e na curta participação nesta copa. O que mais pesa neste saldo negativo que ficamos é a falta de investimento no futebol feminino do Brasil. Apesar do cenário mostrar evoluções nos últimos anos, ainda estamos muito longe do que é visto em países mais tradicionais da modalidade, como Estados Unidos e França, por exemplo. No entanto, a cobrança pelo resultado é a mesma por parte de fãs, torcedores e críticos, que esquecem que para conquistar títulos, é necessário construir uma base e criar uma cultura de suporte ao futebol feminino.  

Encerramos mais uma participação em copa do mundo de futebol feminino com as palavras daquela que é e sempre será a maior de todas: “Quero que o Brasil siga com o mesmo entusiasmo, apoiando. Resultado não acontece de um dia para o outro…não tem mais copa para a Marta e estou muito grata pela oportunidade de jogar mais uma copa. Para elas, é só o começo…”, declarou Marta emocionada. Que seja um lindo recomeço!  

*Fernanda Letícia de Souza é Especialista em Fisiologia do Exercício e Prescrição do Exercício Físico e professora da Área de Linguagens Cultural e Corporal do Centro Universitário Internacional UNINTER