Por Helder Eduardo Vicentini*
Nos últimos anos diversos segmentos da sociedade passaram por significativas transformações em decorrência da implementação de novas tecnologias, que têm impactado profundamente o mundo dos negócios e do trabalho. Essas mudanças ocorrem de maneira veloz e muitas vezes rompem os padrões já estabelecidos no mercado, causando a chamada disrupção. Essa ação não está atrelada apenas à ideia de algo simplesmente inovador, mas também à característica de tornar produtos e serviços mais acessíveis, baratos, e disponíveis a um número muito maior de pessoas. Casos conhecidos como Uber, Airbnb, Facebook, Amazon e Waze são exemplos dessa nova tecnologia disruptiva.
No mundo do direito, as empresas de tecnologia, conhecidas como legaltechs, ou lawtechs, estão transformando o mercado jurídico. As principais alterações estão atreladas à utilização da inteligência artificial como instrumento. A tecnologia no direito vai desde a análise estatística (jurimetria) que apontará, por exemplo, a proporcionalidade de chances de êxito em uma determinada demanda judicial. Assim como, a própria análise de casos práticos, com o sugestionamento dos textos que serão utilizados pelos advogados em suas manifestações, e até mesmo pelo próprio juiz em suas decisões.
Essa inteligência artificial já está sendo utilizada pela primeira instância da Receita Federal do Brasil, na análise e julgamento de casos administrativos de menor complexidade e valor. Essa prática permite que os auditores fiscais possam focar seus trabalhos nos processos administrativos de maior complexidade, e que envolvam um valor maior de Tributação.
O Supremo Tribunal Federal implementou, também por inteligência artificial, sistema que rastreia as ações com repercussão geral, o que possibilita que os recursos extraordinários sejam julgados com rapidez e precisão. Isso porque quando um desses processos é julgado, os demais processos semelhantes e a ele vinculados, em razão da repercussão geral, possivelmente terão o mesmo destino. Reduzindo assim, significativamente, o tempo de julgamento, sobretudo pela ausência da interferência humana nessa análise processual.
Também ganha corpo a tecnologia de Online Dispute Resolution (ODR) ou Resolução On-line de Conflitos, através da qual as partes podem negociar “online” a solução de um conflito e assim evitar que o litígio seja resolvido por uma decisão judicial, que pode levar anos para acontecer. Atualmente existem diversas plataformas em funcionamento, que agilizam as negociações, muitas vezes também sem a interferência humana.
Certamente toda essa tecnologia não fará com que a profissão do advogado deixe de existir, pois ainda que o trabalho possa ocorrer de forma mais ágil e eficiente, e que reduza os postos de trabalho na área jurídica, ainda assim será necessária a intervenção humana. Afinal cabe às pessoas o pensamento crítico, a intuição, a astúcia, a criatividade e a própria instrução de comandar a máquina para trabalhar.
O papel da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) se torna essencial nesse momento de evolução. Não só porque essas tecnologias afetam diretamente o mercado de trabalho do advogado, mas também porque a OAB tem sido fundamental na capacitação de seus representados. A Ordem também pode se fazer necessária em algum momento em que a tecnologia esbarrar nos limites legais de ética, na captação irregular de clientes, ou mesmo no exercício ilegal da profissão.
Sem dúvida essas mudanças exigem do advogado sua imediata adaptação, o estudo aprofundado e a implementação dessas novas tecnologias como ferramenta de trabalho, sob pena de não sobreviver nesse novo e dinâmico ambiente tecnológico.
* Helder Eduardo Vicentini – Advogado, sócio do escritório Motta Santos e Vicentini Advogados Associados.