Dia Nacional do Futebol: o que temos para celebrar?

(*) Emerson Liomar Micaliski

Em 1976, a antiga Confederação Brasileira de Desportos (CBD) escolheu 19 de julho para homenagear a data de fundação do Sport Clube Rio Grande, o primeiro time a ser constituído no país e que ainda se mantêm em atividade. E assim nasceu o Dia Nacional do Futebol. O Brasil é conhecido como “o país do futebol” e esse esporte, indiscutivelmente, obteve certa hegemonia na preferência dos brasileiros. A torcida pelo time do coração ou pela seleção brasileira é manifestada com a mistura de sentimentos de alegria, tristeza, tensão e angústia durante os jogos.

Esportivamente, nossa seleção é a mais vencedora, a única que participou de todas as Copas do Mundo. Temos também outras conquistas como Copa América, Copa das Confederações, Jogos Olímpicos. E sempre contamos com o talento técnico de inúmeros jogadores, tanto que somos considerados um “celeiro de craques”. Em 2020 o Centro Internacional de Estudos Esportivos apontou que o Brasil é o país com maior número de jogadores atuando no exterior. O levantamento realizado em 97 países mostrou que são 1.280 jogadores brasileiros atuando em 23 campeonatos nacionais pelo mundo.

Diante desses dados vitoriosos, poderíamos celebrar o Dia Nacional do Futebol apresentando fatores positivos conquistados pela modalidade. Entretanto, devido ao momento do futebol brasileiro, nos instigam outros questionamentos: será que ainda somos o país do futebol? Mesmo com tantos atletas atuando em diferentes países, podemos narrar que o Brasil ainda é um “celeiro de craques”? Qual é o sentimento do torcedor brasileiro em relação à organização do futebol nesse momento? A explicação desses questionamentos pode ser uma tarefa bastante difícil, pois existem diversos elementos que não são tão óbvios.

Entretanto, após um mapeamento de matérias publicadas, juntamente com aferições dos termômetros das redes digitais, é possível identificar alguns pontos-chave do momento vivenciado pelo esporte e percebidos por muitos torcedores. Visivelmente a seleção brasileira está cada vez mais distante de sua torcida, e não é por causa das recomendações sanitárias impostas pela Covid-19. Foi perdida a sintonia que havia entre o time e sua torcida. Já não cabe mais aquela analogia do número de técnicos com o de habitantes, uma expressão usada por diversos treinadores e cronistas esportivos desde a década de 1970: “o Brasil tem 90, 180, 200 milhões de técnicos de futebol”.

É nítido que boa parte da população possui outros interesses e não opina mais sobre a convocação ou escalação dos jogadores. Também não seria exagero dizer que boa parte dos brasileiros não conhece a maioria dos jogadores que vestem a camisa amarelinha. Afinal, quais deles atuam em clubes nacionais? Por que a maioria dos amistosos não são realizados em solo brasileiro? Soma-se a esse distanciamento a tentativa de elitização do esporte. Cada vez mais percebe-se ampla investida para tornar o futebol um produto caro e de poucos. Qual seria a justificativa para o preço comercializado das camisas de clubes ou seleção? Ou o valor cobrado pelo ingresso do jogo, ou mesmo a tentativa de promover o acesso aos jogos, preferencialmente, para associados do clube? Tratando-se de um país com tantas desigualdades, quem teria acesso ao futebol?

Outro fator são os resultados técnicos obtidos nos últimos anos. A última grande conquista foi a Copa do Mundo em 2002. Mesmo contando com participações decisivas de craques como Ronaldo, Ronaldinho e Rivaldo, o torcedor não viu um futebol tão vistoso como as conquistas de 1958 e 1970, por exemplo. Além disso, os clubes brasileiros não tiveram sucesso nos últimos mundiais, a vitória mais recente foi do Corinthians em 2012. Infelizmente, nossas recentes lembranças trazem, de imediato, a derrota histórica de 7×1 para Alemanha, em 2014, e outras eliminações nas fases finais da Copa do Mundo. Atualmente, mesmo contando com o talento de Neymar, o último jogador brasileiro a vencer o título de melhor do mundo foi Kaká, em 2007, quando defendia a equipe do Milan.

Não podemos deixar de mencionar os poucos investimentos no futebol feminino. Esse sim, inversamente proporcional na comparação entre dinheiro investido, fama e espaço. Se, por um lado, não tivemos nenhum representante do masculino como melhor do mundo, por outro temos uma “rainha” camisa 10 da seleção brasileira que se tornou a maior vencedora do prêmio, consagrando-se seis vezes a melhor do mundo. Mesmo que a seleção feminina não tenha conquistado tantos resultados expressivos, a qualidade e habilidade técnica de Marta e o crescimento das jogadoras mesmo em ambiente ainda “hostil” são os reais motivos para, em 2021, celebrar o Dia Nacional do Futebol.

(*) Emerson Liomar Micaliski é professor de Educação Física e doutorando em Educação. Atua como coordenador de cursos de Pós-graduação do Centro Universitário Internacional Uninter