Pesquisa da Anvisa mostra que mais de mil hospitais ainda não implementaram medidas para o uso racional das medicações, cuja utilização inadequada diminui a resistência humana às infecções
Uma pesquisa da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) mostrou que 58% dos 2.072 hospitais que responderam à Avaliação Nacional dos Programas de Gerenciamento de Antimicrobianos ainda não implementaram o programa para gerenciar o uso desses medicamentos. Na Semana Mundial de Conscientização sobre o Uso de Antimicrobianos (de 18 a 24 de novembro), o Pequeno Príncipe, o maior e mais completo hospital exclusivamente pediátrico do Brasil, chama atenção para a crescente resistência das bactérias a esses medicamentos especialmente em crianças.
De acordo com números de 2021 divulgados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), pneumonia bacteriana e infecções da corrente sanguínea estão entre as principais causas de mortalidade em crianças abaixo de 5 anos. Os dados mostram que cerca de 30% dos recém-nascidos com infecção no sangue morrem devido à resistência a vários antibióticos de primeira linha.
Frente a esse cenário, o Pequeno Príncipe implantou há aproximadamente 15 anos o Programa de Stewardship de Antimicrobianos, com foco na gestão desses medicamentos. Os principais resultados foram a redução de dias de uso de antimicrobianos, a diminuição de custos e o controle do avanço da resistência a esses fármacos.
Em 2020, com o apoio da indústria farmacêutica, o Hospital iniciou a capacitação de quatro hospitais brasileiros nessa metodologia. Com os bons resultados alcançados, em 2022, a mentoria foi ampliada para mais 15 instituições. Atualmente, 13 hospitais de 10 estados brasileiros estão com seus programas, que visam o uso racional e mais efetivo desses medicamentos, implantados ou em fase de implantação. Dois deles não concluíram o processo.
O assessoramento permitiu que a instituição também produzisse um relatório com dados qualitativos e quantitativos sobre a situação dos hospitais em relação ao gerenciamento de antimicrobianos que espelham a realidade brasileira. Um exemplo são os 1.501 problemas relacionados ao uso desses medicamentos identificados nos hospitais que receberam a mentoria do Pequeno Príncipe no último ano. Do total, 42% deles eram de uso desnecessário ou uso inadequado.
Resistência
Em todo o mundo, a resistência a antibióticos mata cerca de seis milhões de pessoas anualmente, incluindo um milhão de crianças que morrem de infecção generalizada (sepse ou septicemia) e pneumonia evitáveis.
A resistência antimicrobiana – que se refere a micro-organismos que não respondem aos antibióticos é considerada uma “pandemia silenciosa”. Patógenos resistentes mataram 1,26 milhão de pessoas em 2019, segundo análise publicada na revista médica “The Lancet”.
O consumo excessivo de antibióticos, prescrições equivocadas, doses inadequadas e poucas ações de controle podem causar resistência a essa classe de medicamento. Isso ocorre quando bactérias, vírus ou fungos passam por mutações ao longo do tempo e não são mais eliminados pelos antimicrobianos. Essa condição, torna as infecções difíceis de serem tratadas e aumenta o risco de propagação e gravidade das doenças e também o risco de morte.
Stewardship
O Programa de Stewardship de Antimicrobianos do Pequeno Príncipe é fundamental para o uso criterioso e individualizado desses medicamentos. Ele incentiva as práticas mais seguras e efetivas e a interface entre os serviços e profissionais envolvidos no uso de antimicrobianos em pacientes internados nas UTIs Pediátricas e Neonatal.
A metodologia consiste em um programa dirigido pela farmácia clínica, onde o farmacêutico realiza uma avaliação técnica e habilidosa do uso de antimicrobianos, identificando oportunidades de otimização do tratamento para discutir com o infectologista. Ele também articula a discussão entre a equipe, o que permite uma avaliação mais precisa do tratamento prescrito para cada paciente, além de garantir o gerenciamento de protocolos clínicos.
“Realizamos acompanhamento no quadro da criança ou do adolescente internado no Hospital. Dessa forma, conseguimos ajustar o que precisa e garantir que o paciente tenha o melhor acompanhamento e antimicrobiano possível. Isso evita que sejam aplicados inúmeros medicamentos até que um faça o efeito desejado”, explica o vice-diretor-técnico de Qualidade e Pesquisa Clínica, Fábio de Araújo Motta, do Pequeno Príncipe.