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Quilos Mortais: por que e como as pessoas chegam à obesidade mórbida?

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Quilos Mortais: por que e como as pessoas chegam à obesidade mórbida?
Quilo Mortais / Crédito: Divulgação
Quilo Mortais / Crédito: Divulgação

Pacientes devem buscar ajuda antes de chegar na situação dos personagens de reality show

O programa Quilos Mortais Brasil estreou no início de maio nos serviços de streaming. O que muitas pessoas que assistiram aos primeiros episódios, ou que já assistiram a versão americana do programa, devem estar se perguntando é: como uma pessoa chega a esse nível de obesidade? Por que se deixaram levar até este ponto? E o que surpreende é que muitos obesos só perceberam que havia algo errado com o peso quando começaram a sofrer consequências sociais e de saúde.

Segundo o presidente do Capítulo da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM) no Paraná, José Alfredo Sadowski, a obesidade é uma doença crônica e multifatorial. A sua progressão para a obesidade mórbida envolve uma combinação de influências genéticas, distúrbios psicológicos, distúrbios endócrinos, maus hábitos alimentares e falta de exercícios físicos.

“A obesidade mórbida é resultado de uma complexa interação de fatores, incluindo também influências familiares, distúrbios alimentares como compulsão, problemas de saúde mental, alterações hormonais e metabólicas, escolhas alimentares pouco saudáveis e a falta de exercícios físicos. Todos são elementos que contribuem para o desenvolvimento dessa condição. Buscar o tratamento o quanto antes é fundamental para o controle da doença”, explica o cirurgião bariátrico.

Dados

Segundo levantamento da SBCBM, cerca de 33,4% da população brasileira é considerada obesa, com base em relatório produzido pelo Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN) do Ministério da Saúde. Isso equivale a aproximadamente 72,6 milhões de pessoas. A obesidade é classificada em três níveis:

  • Grau I (leve) – acomete 20,76% dos brasileiros (45 milhões de pessoas)
  • Grau II (moderada) reúne 8,31% da nação (18 milhões de pessoas)
  • Grau III (mórbida, índice de massa corporal (IMC) acima de 40 kg/m²) – que é o público mostrado no Quilos Mortais – atinge 4,41% da população nacional (9,5 milhões de pessoas)

Todos os pacientes grau II e III que possuam alguma comorbidade, entre outros quesitos, são elegíveis para a cirurgia bariátrica. Porém o cirurgião bariátrico José Alfredo Sadowski alerta que, apesar de bastante segura, a cirurgia fica mais complexa quanto maior o nível de obesidade.

“É importante que os pacientes entendam que a obesidade é uma doença crônica progressiva e que busquem ajuda e tratamento o quanto antes, não deixando chegar em estágios mais severos como os mostrados no programa da TV. Um tratamento precoce e adequado diminui bastante os riscos de complicações permitindo uma cirurgia bariátrica mais segura”, explica Sadowski.

Obesidade e cirurgia bariátrica no Paraná

No âmbito estadual, o Paraná apresenta uma prevalência de 4,7% dos habitantes enfrentando o Grau III e 9,2% o Grau II da doença, segundo dados do SISVAN.

“Esses números demonstram a complexidade do problema e a necessidade de ações direcionadas à conscientização e ao tratamento. É fundamental termos investimento em políticas públicas, programas educacionais e estratégias integradas de saúde para reverter essa tendência”, diz Sadowski.

O número de procedimentos realizados no Paraná através do SUS ainda não retomou o volume pré-pandemia. Em 2023 foram realizadas 1.884 cirurgias no sistema público enquanto eram operadas 7.456 pessoas em 2019.

“Nós observamos o aumento nas cirurgias bariátricas realizadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), com um crescimento de 26,8% entre 2022 e 2023. Contudo, é importante notar que ainda não atingimos os níveis pré-pandêmicos, com uma queda significativa de 40,2% em comparação com 2019”, relata o presidente da SBCBM no Paraná.

Os riscos da superobesidade

A quantidade de gordura abdominal e o acúmulo de gordura no fígado são fatores que podem dificultar o acesso de instrumentos cirúrgicos até o estômago e intestino. O excesso de gordura também pode restringir a movimentação da respiração, gerando algum risco respiratório durante a cirurgia.

Por isso, para a maioria dos pacientes com níveis mais severos de obesidade, é indicado a perda de 5% a 10% do peso antes da operação. Em casos mais graves, algumas vezes são necessários outros tratamentos para se obter essa perda de peso antes da cirurgia, como o uso de medicamentos ou de balões gástricos.

“Perder um pouco de peso antes da cirurgia pode fazer uma diferença significativa na segurança e na eficácia do procedimento. Por isso, a SBCBM preconiza que o tratamento pré-operatório leve em consideração mudança de hábitos alimentares, prática de exercícios físicos, uso de medicamentos e até mesmo a utilização de outros recursos como os balões intragástricos, por exemplo”, comenta o cirurgião bariátrico.

Preconceito dificulta busca por ajuda

Entre os personagens do Quilos Mortais está Marcelo Marques Gomes, de 43 anos, que chegou aos 202 quilos. No episódio, ele contou que era muito comum as pessoas o chamarem de “sem vergonha”, “relaxado” e que ele “comia demais”. Na rua, todo mundo julga com o olhar. Isso, disse ele, fez com que ele pensasse que estava “relaxado mesmo” e achou que nunca ia conseguir perder peso para a cirurgia. Isso o desanimou.

Já a Andrea, personagem de outro episódio do Quilos Mortais, quase não percebeu que caminhava para a obesidade mórbida. Sem ânimo para muitas atividades, passou a ficar muito tempo na cama, sozinha, fazendo refeições. Passou a olhar-se pouco no espelho, até que começou a sentir as dificuldades da obesidade. Hoje precisa da ajuda do marido para atividades básicas, como lavar o cabelo e tomar banho. Quando solicita comida por um aplicativo, joga uma sacola para que o entregador coloque dentro e ela puxe com uma corda, por não conseguir mais descer as escadas do sobrado. Com um provável quadro depressivo associado, Andrea não percebeu para onde a obesidade estava chegando e sua única saída foi a cirurgia bariátrica.

Ainda há muito a se fazer em termos de conscientização da população de que a obesidade é uma doença incurável e progressiva, e que pode atingir níveis extremamente severos se não for tratada adequadamente. E o preconceito só vai diminuir a partir dessa conscientização.