Omissão de Socorro é crime?

Valdilson Aparecido Lopes (*)

Gerson Luiz Buczenko (*)

Quando presenciamos um acidente (sinistro) de trânsito o que normalmente encontramos são cenas de desespero, raiva, dor e sofrimento. Porém, a reação é diferenciada em cada ser humano. Enquanto muitos são solidários com o próximo, outros demonstram uma conduta reprovável abstendo-se da empatia e cometendo omissão de socorro.

Segundo o dicionário, o termo omissão significa “ato ou efeito de deixar de lado, desprezar ou esquecer, preterição, esquecimento”. Ou seja, a omissão é a conduta de uma pessoa (ou mais de uma) que teria plenas condições de fazer algo e não o faz. Já a palavra socorro, por sua vez, traz o conceito de ajuda ou assistência para alguém que está em situação de perigo, doença e desamparo, entre outras situações de vulnerabilidade conhecidas. E, consultando nosso Código Penal um Decreto Lei nº 2.848 de 7 de dezembro de 1940, o artigo 135 explica que “deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública, a pena pode ser de detenção, de um a seis meses, ou multa”.

Portanto, é crime sim e pode ser agravado com a pena aumentada se, dessa omissão, resultar lesão corporal de natureza grave, ou mesmo triplicada se resultar em morte. No Código de Trânsito Brasileiro há um capítulo sobre crimes de trânsito e o artigo 304 cita que “deixar o condutor do veículo, na ocasião do acidente, de prestar imediato socorro à vítima, ou, não podendo fazê-lo diretamente, por justa causa, deixar de solicitar auxílio da autoridade pública, a pena pode ser de detenção, de seis meses a um ano, ou multa, se o fato não constituir elemento de crime mais grave”. Assim, em ambos os Códigos, o objetivo é a punição daquele que deixa de prestar assistência quando tem plenas condições de fazê-lo, entendendo que o cidadão tem o dever – princípio ético – de prestar auxílio ao desamparado, vítima vulnerável ou necessitando de auxílio médico.

Para ilustrar essa triste realidade, segundo dados dos boletins de ocorrência que compõem as estatísticas do INFOSIGA SP (2020), “nas ocorrências com fuga do condutor, a relação passa para 18,9 acidentes para cada óbito”. Assim, a incidência de óbito é cerca de 3 vezes maior quando há evasão do local e não prestação do socorro imediato às vítimas. Essa condição é muito próxima do que ocorre nas rodovias, quando a relação passa de 12,3 para 3,6 acidentes por óbito quando há fuga do condutor. No mesmo relatório verifica-se que aproximadamente 85% dos acidentes que tiveram abandono do local pelos condutores se deram em vias urbanas, e também registram a maior parte das fatalidades (54%). Verifica-se ainda que 64% dos casos aconteceram no período noturno, sendo os tipos de acidente mais comuns os atropelamentos e colisões traseiras.

Por vezes, o simples ato de sinalizar o local para evitar novos acidentes (sinistros) e telefonar para o resgate, ou acionar os agentes de segurança pública já é considerada uma forma de prestação de socorro, bem como uma prova de humanidade e respeito ao próximo naquele momento trágico.

E por que tantos condutores se evadem do local do sinistro, alegando o risco de serem agredidos? Ou se negam a testemunhar sobre as causas do acidente? Falta de empatia? Medo? Desrespeito aos seres humanos envolvidos? Descrédito da justiça? Difícil dizer, não há uma só resposta. Mas é fato que a vítima que sofreu a omissão de socorro pode e deve pedir reparação por danos e, consequentemente, a punição dos responsáveis pelo crime. O registro de um boletim de ocorrência pode ser utilizado em uma ação futura por reparação de danos morais e materiais.

Assim, a melhor dica é prestar ou providenciar socorro à vítima. Não só pela falta ser crime, mas pelo exercício da empatia, afinal como seria se a sua vida, ou a de alguém da sua família, estivesse dependendo da prestação de socorro de outrem? E se quem causou o sinistro, ou passou pelo local e visualizou o ocorrido, se omitisse de ajudar você ou uma pessoa querida? Pense nisso! Respeito e responsabilidade: pratique no trânsito.

(*) Valdilson Aparecido Lopes e Gerson Luiz Buczenko são professores de Gestão do Trânsito e Mobilidade Urbana da Escola Superior de Gestão Pública, Política, Jurídica e Segurança do Centro Universitário Internacional Uninter

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